1ª Vara Criminal de Poços de Caldas
Autora: a Justiça Pública
Réus: Alessandra Angélica Queiroz Araújo, Cláudio Rogério Carneiro Fernandes, Jeferson André Saheki Skulski, João Alberto Góes Brandão, José Júlio Balducci e Paulo César Pereira Negrão.
(CASO 5)
Graves malae conscientiae lux est.
Vistos, etc.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, através do ilustre Promotor de Justiça MARCELO MATTAR DINIZ apresentou a denúncia constante às fls. 02d/10d contra os réus ALESSANDRA ANGÉLICA QUEIROZ ARAÚJO, brasileira, solteira, médica, CRMSP n.84011, CRMMG n. 35701 e CRMBA n. 15013, filha de Joel Francisco de Araújo e de Marlene Conceição Araújo, residente no Condomínio Parque Encontro das Águas, Quadra G, Lote 36, Portão, Lauro de Freitas/BA, CLÁUDIO ROGÉRIO CARNEIRO FERNANDES, brasileiro, casado, médico, CRM 21440, filho de Ismar Fernandes e Yelda Carneiro Fernandes, nascido em 13.1.1960, residente na Avenida Montevidéu, 114, Bairro Jardim Novo Mundo II, nesta, JEFERSON ANDRÉ SAHEKI SKULSKI, brasileiro, divorciado, médico, CRMSP 82279, filho de Julian Lew Skulski e Tissato Saheki, residente na Rua Teresópolis, 56, Bairro Jardim dos Estados, nesta, JOÃO ALBERTO GÓES BRANDÃO, brasileiro, divorciado, médico, CRMMG n.25137, filho de João Mauro Xavier Brandão e Nilza Maria Goes Brandão, residente na Av. Padre Cletus Francis Cox, 777, Casa 73, Jardim Country Club, em Poços de Caldas, JOSÉ JÚLIO BALDUCCI, brasileiro, médico, CRM n. 15073 S, filho de Benedicta da Fonseca Balducci, residente na Rua Jamaica, 157, Jardim Quississana, nesta e PAULO CÉSAR PEREIRA NEGRÃO, brasileiro, casado, médico, CRM n. 25989, filho de Paulo Gomes Negrão e Helenice Pereira Negrão, residente na Av. Presidente Juscelino Kubischeck, 658, Parque Vivaldi Leite Ribeiro, nesta Comarca de Poços de Caldas, pela prática do delito previsto no § 4o do art. 14 da Lei n. 9.434/97 c/c art. 29 do CP, já que “no dia 16.1.2001, os denunciados, Felix Herman Gamarra Alcântara e Saulo Zenun, médicos, em comunhão de vontades e unidades de desígnios, tendo conhecimento que a vítima Paulo Lourenço Alves ainda se encontrava com vida, removeram seus órgãos internos para posterior transplante, causando-lhe a morte” (f. 3d). A participação dos demais réus “na retirada de órgãos de pessoa viva causando-lhe a morte” segue conforme a narrativa dos fatos constante da denúncia, todos partícipes na Organização Criminosa em atividade no Hospital da Santa Casa, conforme menção do Órgão Acusador nesse e em outros processos conexos.
I- DO RELATÓRIO
A denúncia foi recebida em 7.2.14, como se vê à f. 517, oportunidade em que foi decretada a extinção da punibilidade de SAULO ZENUN, pela prescrição da pretensão punitiva. A extinção da punibilidade de FELIX HERNAN GAMARRA ALCANTARA já havia sido decretada à f. 513, ambos pela regra dos setenta anos de idade, prescrição contada pela metade.
Despacho ordinatório à f. 528 e CACs às fls. 542/547.
Os réus foram citados e após alguma procrastinação e reabertura de prazos por este juízo, as ilustres Defesas apresentaram as suas respostas às fls. 776/781 (João Alberto), fls. 783/786 (Cláudio Rogério), fls. 790/812 (José Júlio), fls.816/829 (Paulo César), fls. 862/864 (Jeferson Skulski) e fls.1154/1169 (Alessandra).
Juntada das sentenças do Caso Pavesi às fls. 564/641v, do Caso 1 às fls. 643/679, do Acórdão do Caso 1 às fls. 744/774v, da denúncia do Caso 2 às fls. 681/688, do Caso 7 às fls. 710/720.
Despacho ordinatório à f. 1133, reabrindo a possibilidade de re ou ratificação das defesas apresentadas.
Às fls. 1170/1173 nova preliminar de nulidade arguida pelos réus Cláudio Rogério e João Alberto, denotando a ampla defesa permitida e praticada pelo juízo.
Decisão às fls. 1185/1189 (vol.5), datada de 15.5.14, afastando as preliminares defensivas, bem como designando datas para a AIJ.
Novo requerimento do réu JEFERSON SKULSKI à f. 1207, indeferido à f. 1210.
Despacho ordinatório à f. 1226 e juntada de cópia da carta rogatória que ouviu o pai da criança Pavesi às fls. 1337/1348.
Ata de audiência de instrução e julgamento (AIJ) às fls. 1351/1366, constando-se as ocorrências mais ou menos relevantes: a Defesa de um dos réus mandou que seu cliente fosse embora antes da audiência, conforme relatou um jornalista; protesto da Defesa pela demora no início da audiência; novo requerimento de ilegitimidade do MP, agora por parte da Defesa de JOSÉ JÚLIO, novamente afastada, conforme decisão proferida no momento, inclusive por intempestiva; determinação de gravação de áudio da audiência para dirimir qualquer questão ocorrida no decorrer da mesma, conforme se procedeu em caso conexo; foi deferido pelo juízo perguntas complementares pelas Defesas, após as perguntas do magistrado; homologação de dispensa da ouvida da testemunha Saulo Zenun e do informante Felix Gamarra; constatada a entrada e saída de jornalistas e equipes de TV, que trabalharam livremente, conforme o Estado Constitucional de Direito. Foram ouvidas as seguintes testemunhas: Benedita, Weberson, Mariângela, Fátima (fls. 1357/1366).
Ata de audiência em continuação (AIJ) às fls. 1393/1394, oportunidade em que o juízo indeferiu o adiamento da audiência por conta de precatória pendente, bem como nova ouvida de testemunhas após a juntada de precatórias, fundamentando a decisão na legislação em vigor. O juízo deferiu reperguntas por parte das Defesas e homologou a dispensa da ouvida de outras a pedido. Na assentada foram ouvidas as testemunhas Simone, e Júlio César (fls. 1397/1402).
Ata de audiência em continuação (AIJ) às fls. 1404/1408, constando as ocorrências (mais ou menos) relevantes ou a pedido das partes. Foi requerido o adiamento dos interrogatórios após a juntada das precatórias pendentes, pedido indeferido, nos termos da legislação processual em vigor, que é expressa, nos termos do art. 222 do CPP, questão inclusive já decidida pelo E. TJMG relativamente ao Caso 1 (vítima JDC). Foi indeferido pelo juízo o pedido de suspensão da audiência para que os interrogatórios fossem feitos em outra data, com as considerações ali constantes.Foi deferida a ordem de interrogatório conforme sugerido pelas Defesas, ou seja, pela ordem cronológica dos fatos. Foi deferida nova pergunta de advogado de Defesa, mesmo após o encerramento do interrogatório, que foi retomado.Também foi indeferida, após parecer ministerial, a diligência pericial, por não ser imprescindível e meramente procrastinatória, além da prova ter sido requerida de forma genérica. Foi deferida a juntada de documentos por parte das Defesas. Foi indeferida juntada de mídias, pois a finalidade das gravações foi dirimir dúvidas, acaso existentes, durante a própria audiência. Finalmente, foi determinado que, escoados os prazos previstos nas precatórias, fosse aberta vista às partes para alegações finais e sentença, com prazo comum para as partes de 25 dias. Neste dia, procedeu-se aos interrogatórios dos réus (fls. 1409/1425). O interrogatório da ré ALESSANDRA foi realizado por precatória (fls. 1643/1645).
Documentos juntados às fls. 1426/1452 e cópia de denúncia ministerial junto à Justiça Federal (fls. 1456/1465) contra Regina Cioffi, Maria José da Ré, Luciana da Ré, Tania Maria da Ré Guerra, Maria Fátima da Silva, Jorge Antônio Moreira Lopes e Orlando Humberto Graciose, todos exaustivamente citados nas sentenças dos Casos 1 e Zero (Pavesi), acusados de estelionato qualificado.
Relatório de auditoria DENASUS n. 33/00 às fls., 1472/1495.
Despacho ordinatório à f. 1511 e certidão às fls. 1522/1523.
Despacho ordinatório à f. 1568 e informações prestadas em habeas corpus impetrado pelo réu JOSÉ JÚLIO às fls. 1569/1570.
Juntada de documentos às fls. 1576/1614, a pedido da Defesa de JOÃO ALBERTO e CLÁUDIO ROGÉRIO.
Ouvidas de testemunhas arroladas pela Defesa, por precatória, às fls. 1683/1686.
Foram apensados aos autos 07 volumes de notas taquigráficas da CPI DO TRÁFICO DE ÓRGÃOS, no denominado apenso 5.
Memoriais finais do MP, datado de 25.9.14, juntado às fls. 1688/1754 do vol.6, requerendo a condenação dos réus nos exatos termos da denúncia, com exceção da ré ALESSANDRA, no qual pediu a desclassificação do delito e reconhecimento consequente da prescrição punitiva.
Termo de ouvida da testemunha Sérgio Mendes, arrolada pela acusação, à f. 1792.
Manifestação do MP às fls. 1794/1802.
Ouvida de testemunha arrolada pela defesa da ré ALESSANDRA (fls. 1808/1809), com juntada de mídia.
Certidão da não intimação da testemunha arrolada pela acusação Rosane Elisabeth à f. 1820.
Despacho ordinatório à f. 1821, datado de 13.10.14.
Requerimento do réu JEFERSON SKULSKI à f. 1825.
Ouvida de testemunha arrolada pela Defesa às fls. 1834/1836.
Memoriais finais de ALESSANDRA ANGÉLICA às fls. 1842/1860 do vol. 7, datada de 30.10.14, alegando, em síntese, que: a ré era servidora da Prefeitura Municipal e não da Santa Casa; quando a ré se aproximou da vítima para retirar seus globos oculares, já se tratava de um CADÁVER, visto que seus órgãos já havia sido retirados; “(...) ALESSANDRA, quando encaminhada para retirar os 'globos oculares' da suposta vítima, a morte encefálica do mesmo (sic) já tinha sido decretada por outros médicos, quais sejam: FELIX GAMARA e PAULO CÉSAR NEGRÃO, de acordo com fls. 39, apenso I do IP” (f.1850);requerendo a desclassificação da conduta da ré, com o reconhecimento da prescrição e alternativamente o reconhecimento da participação de menor importância. Sua Defesa asseverou: “Sabe-se que o partícipe que pouco tomou parte na prática criminosa, colaborando minimamente, deve receber a pena diminuída de um sexto a um terço (...)”, (f. 1853). Disse, a ré, que “acreditava” que estivesse credenciada para remover tecidos humanos, pois “confiou” em Álvaro Ianhez; teria, pois, incidido em erro de proibição. Requereu a absolvição, por falta de provas ou a desclassificação do delito para o previsto no art. 14 da Lei de Transplantes, reconhecendo-se a prescrição. Juntou as cópias de documentos às fls. 1859/1869.
Despacho à f. 1883, mantendo os autos à disposição das Defesas para cópias, mediante carga.
Ouvida de testemunhas arroladas pela Defesa às fls. 1889 e mídia à f. 1891.
Requerimento do réu JOSÉ JÚLIO às fls. 1893/1896 e de JEFERSON às fls. 1898/1900.
Memoriais finais do réu JEFERSON SKULSKI às fls. 1958/1969, protocolizado em 5/11/14, aduzindo em preliminares: suspensão do processo, incompetência do juízo, cerceamento de defesa por falta de prova pericial, indeferimento de perguntas. No mérito, pleiteia a absolvição por estar provado que o réu não concorreu para a prática da infração penal.
Memoriais finais do réu PAULO CÉSAR às fls. 1902/1954, protocolizado em 10/11/14, com as preliminares: renovação do interrogatório, cerceamento por indeferimento de prova pericial, nulidade por inobservância de garantias constitucionais, inépcia da inicial, falta de conexão dos casos, ofensa ao princípio do promotor natural. No mérito pede a absolvição ante a inexistência de prova do crime e o fato não constituir infração penal. Requer, ainda, a desclassificação do delito e reconhecimento, em caso de condenação, como favoráveis todas as circunstâncias judiciais.
Certidão de carga dos autos pela Defesa de JOSÉ JÚLIO para extração de cópias à f. 1971.
Requerimento da Defesa de JEFERSON SKULSKI às fls. 1972/1973, da Defesa de JOSÉ JÚLIO à f. 1975 e dos réus JOÃO e CLÁUDIO às fls. 1985/1986.
Juntada de cópias de depoimento de Rosane Amaral em autos conexos às fls. 1979/1983.
Certidão de decurso do prazo para a apresentação dos memoriais por parte das Defesas dos réus JOÃO, CLÁUDIO e JOSÉ JÚLIO à f. 1987, datada de 18/11/14.
Decisão às fls. 1988/1990, datada de 20/11/14, deferindo requerimento da Defesa de JEFERSON SKULSKI e indeferindo requerimentos procrastinatórios das Defesas de JOÃO, CLÁUDIO e JOSÉ JÚLIO. Não houve recurso, tornando-se preclusa a oportunidade.
Ouvida de testemunha de defesa às fls. 2006/2007, por precatória.
Memoriais finais do réu CLÁUDIO ROGÉRIO às fls. 2020/2036, postada em 24/11/14, aduzindo em preliminares: incompetência absoluta da justiça estadual, impedimento de membro do MP, cerceamento de defesa por indeferimento de prova pericial, violação da ampla defesa e contraditório pela realização do interrogatório antes do retorno das precatórias. No mérito, requer a absolvição pura e simples, sem nenhum argumento.
Memoriais finais do réu JOÃO ALBERTO às fls. 2038/2060, postada em 24/11/14, preliminares idênticas ao do réu CLÁUDIO e, no mérito, também pede a absolvição pura e simples.
Requerimento do réu JOSÉ JÚLIO à f. 2062, com procuração à f. 2063 e decisão à f. 2063-v, datada de 1/12/14, com certidão de publicação à f. 2064, também irrecorrida, preclusa a oportunidade.
Requerimento do réu JOSÉ JÚLIO às fls. 2066/2067, com decisão às fls. 2068/2070, datada de 5/12/14, com cópias às fls. 2071/2072. Certidão de publicação à f. 2073 e a decisão mencionada também restou irrecorrida, preclusa a oportunidade.
Cópia de ofício à OAB (f. 2074).
Memoriais finais do réu JOSÉ JÚLIO às fls. 2075/2103, protocolizadas em 9/12/14 pelo ilustre Defensor Dativo, requerendo em preliminares: inépcia da inicial, renovação do interrogatório, cerceamento pelo indeferimento da prova pericial. No mérito, requer a absolvição pela inexistência do crime e negativa de autoria. Alternativamente, requer a desclassificação do delito, participação de menor importância, pena no mínimo e pelo direito de recorrer em liberdade.
Mais uma manifestação do réu JOSÉ JÚLIO às fls. 2105/2109, datada de 9/12/14, despacho à f. 2109-v e certidão à f. 2110, constando, inclusive, que os autos ficaram todo o tempo à disposição das partes. Juntada de print do SISCOM às fls. 2111/2117.
Os autos vieram-me conclusos para sentença em 9/12/14 e compõem-se atualmente em 7 volumes e 9 apensos.
O apenso 1 é composto de cópias de prontuários de vítimas. O apenso 2 de documentos juntados no Inquérito por Felix Gamarra. O apenso 3, muito importante, é composto pelo laudo reconstitutivo n. 622/2006. O apenso 4 contém o Relatório da CPI do Tráfico de Órgãos. O apenso 5, em sete volumes, contêm as notas taquigráficas da CPI e finalmente, o apenso 6, com três volumes, é composto, além de documentos diversos citados na sentença, de cópias de pareceres do MP, especialmente da Procuradoria de Justiça, relativos aos Casos 1, datado de 5/11/12, das contrarrazões na pronúncia do Caso Pavesi, datada de 13/4/12, e das contrarrazões do Caso Pavesi, aditamento, datados de 2/9/14, 7/8/14 e 13/3/14. Em tais manifestações ministeriais se vê da conexão entre os casos, o afastamento de todas as preliminares das Defesas, bem como se bate pela manutenção de todas as sentenças até aqui proferidas. O apenso 7 é composto do Relatório Bougeard (Convênio 2005, entre Prefeitura e DME). O apenso 8 do procedimento de tutela coletiva, em dois volumes, muito citado na sentença do Caso Pavesi. O apenso 9 é documento oriundo do processo de júri do Caso Pavesi.
Em 19/2/15, o feito foi baixado em diligência à f. 2117-v oportunizando as partes a ra/retificação das alegações já apresentadas, bem como para apresentação de novos memoriais no prazo de quinze dias, denotando, mais uma vez, a amplitude da defesa concedida.
CACs juntadas às fls. 2118/2137.
Certidão à f. 2160, de vista dos autos pelos advogados do réu JOSÉ JÚLIO, tanto o que havia sido “desconstituído”, Luiz Kuntz, quanto do atual procurador, Juliano Zapia.
Manifestação do MP às fls. 2163/2164.
Novos memoriais finais do réu JOSÉ JÚLIO às fls. 2169/2200, datada de 10/3/15, quatro meses e 23 dias depois de serem intimados (17/10/15, f. 1822), ou seja, com 143 (cento e quarenta e três dias) de prazo.
O feito veio novamente concluso para sentença em 10/3/15.
É o relatório, ainda que necessariamente extenso. DECIDO, após tudo bem visto, examinado e joeirado.
II-DOS PRESSUPOSTOS FÁTICOS/HISTÓRICOS
Como mencionei na sentença de pronúncia do CASO 2, datada de 25/8/14, a última prolatada da série da “Máfia dos Transplantes de Órgãos de Poços de Caldas”, necessária a leitura dos “pressupostos” contidos na decisão citada e também das anteriores, a do Caso Zero (Pavesi), autos n. 0518.13.001.937-6, datada de 6/2/14, fls. 564/641v,, a do CASO 1, autos n. 0518.10.018719-5, datada de 8/2/13, 643/679,, do r. Acórdão que a confirmou (fls. 744/774v), bem como da sentença de pronúncia do Júri do Caso Pavesi (0518.08.148802-6), datada de 17/10/11 e seu Acórdão. Tais documentos estão ou serão juntados aos presentes autos e a leitura evitará que tenha que repetir muitos fatos aqui, necessários, porém, para a compreensão da trama macabra que se desenhou na bucólica e até então insuspeita Poços de Caldas. Pelas datas citadas percebe-se que a “experiência” deste julgador com os crimes envolvendo transplantes já uchega cinco longos anos. Ainda a se mencionar a tramitação do processo referente ao Caso 7 (autos n. 0518.13.009203-5), homicídio doloso, em tramitação perante a 2a Vara Criminal, para onde o remeti ao jurar suspeição por motivo de foro íntimo, relativamente a uma ré, médica, como os demais. Também não pode ser olvidado que ainda tramita, de forma lenta, o IP que investiga a morte suspeita do administrador da Santa Casa, Carlos Henrique Marcondes , autos n. 02.20992-1), agora acrescido da morte, também em circunstâncias obscuras, da testemunha José Alexandrino Apolinário, cliente do réu JOÃO. Além desse, outro inquérito instaurado a requerimento do ilustre Promotor de Justiça Joaquim José Miranda Júnior (autos n. 0042048.81.2013) investiga a própria Organização Criminosa. Também em tramitação o IP referente ao Caso 3 (vítima A.M.C, autos n. 0518.11.014135-6). Os demais casos (sendo nove, no total) ou foram arquivados ou não se tem notícia, tendo baixa resolução por parte dos órgãos do Estado (menos de 50% dos casos). Da mesma forma, o IP referente ao Caso 6 (vítima M.B), autos n. 0141349-69.2011, com lenta tramitação a cargo da PC de Poços de Caldas. As causas na demora ou insucesso se devem à dificuldade de se investigar ou processar médico e/ou transplante no Brasil. Tais dificuldades foram explicitadas quando da ocorrência da CPI DO TRÁFICO DE DROGAS em Brasília (CPI n. 22/2003), vide apensos 4 e 5, onde foram investigados os casos de Poços de Caldas, de Recife e de Taubaté, dentre outros (esse último foi finalmente julgado pelo Tribunal do Júri em 17/10/11, após 23 anos de tramitação do processo, mas ainda pendente de recursos). O presente feito trata do que ficou conhecido como CASO 5, conforme numeração atribuída por ocasião de Auditoria do DENASUS à época dos fatos, mencionados em detalhes por ocasião do julgamento do CASO 1.
Veja o quadro resumo dos casos:
1) Caso 1 (vitima JDC), julgado por mim em 2013, autos n. 0518.10.018719-5; sentença confirmada pela 3a CACRI do TJMG;
2) Caso 2 (vítima ALR), sentença de pronúncia por mim proferida em 2014, autos n. 0518.13.001278-5; em grau de recurso no TJMG. médico JOSÉ LUIZ GOMES DA SILVA ( o mesmo do júri do Caso Pavesi) vai a júri popular;
3) Caso 3 (vítima A.M.C), autos n. 0518.11.014135-6), em fase de Inquérito Policial (IP);
4) Caso 4 (Vítima A.P), autos 2006.38.10.000376-4, tramitou perante a justiça federal. Não descobri o andamento desse processo.
5) Caso 5 (vítima P.L.A), autos n. 0518.13.008236-6, esta sentença : retirar órgão de pessoa viva, levando-a à morte; réus: seis médicos: Alessandra, Cláudio Rogério (já condenado 2 vezes), Jeferson Skulki, João Alberto (já condenado anteriormente), José Balducci (ex-secretário de saúde de Poços por 2x) e Paulo César (pres. assoc. médica de poços)
6) Caso 6 (Vítima M.B), autos n. 0141349-69.2011, em fase de IP;
7) Caso 7 (vítima M.L.O), autos n. 0518.13.009203-5, acusação homicídio, em tramitação perante a 2a Vara Criminal de Poços;
8) Caso 8 (vítima J.B.M), autos n. 11.005690-1, arquivado a pedido do MP;
Esses oito casos foram descobertos pela Auditoria n. 33/00 do DENASUS, por ocasião da eclosão do Caso Pavesi (2000), (vide também apensos 4 e 5), como está adiante:
0) Caso Zero (Pavesi), homícídio, júri, autos n. 0518.08.148802-6, pronúncia por mim proferida em 2012, confirmada pela 1a CACRI do TJMG. Desaforado para BH, julgamento seria dia 11/3/15, liminar em pedido da defesa de Alvaro Ianhez impediu o julgamento. Sem data.
00) Caso Pavesi, aditamento, autos n. 0518.13.001.93706, retirada de órgãos de pessoa viva, causando-lhe a morte, julgado em 2014 por mim, em grau de recurso no TJMG;
01) IP que apura a morte de Carlão (autos n. 02.20992-1), em tramitação perante a Corregedoria de Polícia Civil;
02) IP que investiga a Organização Criminosa em atuação em Poços, (autos n. 0042048.81.2013).
Com alguma relação com tais casos, por envolver personagens muito ligados à Irmandade da Santa Casa ou ao crime organizado, houve o sequestro e homicídio de Andreia (autos n. 0043994-54.2014.8.13.0518), sendo mandante, de acordo com a Acusação, a pessoa conhecida por “João do Papelão” que teria contratado pistoleiros da Bahia. Segundo investigou o DEOSP de Belo Horizonte, houve suspeita de participação do vereador conhecido por “Lical” e do “Serjão da Santa Casa”, ex-PM. O primeiro, tentou dar um álibi para João e o segundo, seu amigo de infância, suspeito na morte do ex-administrador da Santa Casa , pode ter auxiliado de alguma forma na empreitada, em parceria com o outro citado. Certamente que “João do Papelão” não conseguiu a sua fortuna avaliada em mais de 70 milhões de reais apenas reciclando papel velho e nem teria coragem de fazer tudo o que supostamente fez sozinho . Especula-se que a morte da ex-amante pode ter sido por “queima de arquivo” pois, por conta de separação de bens, teria ameaçado contar o que sabia do envolvimento do companheiro e de outros em crimes e ilícitos. O MPE propôs delação premiada aos criminosos, mas a iniciativa não prosperou, ante o medo que impera em tais círculos e a rápida ação dos advogados .
Em tramitação diversos inquéritos apurando mortes recentes no Hospital da Santa Casa , possivelmente por negligência, imperícia, infecções hospitalares, como o IP n.1.170/10 (autos n. 0021517-42.2011), vítima khatia Soares Villela, falecida em 28/8/10, IP n.277/11 (autos n. 0056950.10.2011), vit. Luiz Carlos Flausino, IP n. 265 (autos n. 0048175.98.2014), vit. Leila Mara de Castro, caso ocorrido em 9/3/13 . Tais casos não tiveram qualquer repercussão na imprensa. Já no dia 25/4/14 um jornal noticiou a instauração de outro IP pelo Delegado Samir Blagitz, devido a morte de outro bebê prematuro. Segundo o BO no dia 21/4 uma mulher de 19 anos entrou em trabalho de parto e foi levada para a Santa Casa. Ficou internada até o dia 22, quando teve alta, sem notícia do filho. Ao retornar à noite “...a família teria sido informada que o corpo da criança teria sido enviado para São Paulo para pesquisa.” Já no mês de novembro de 2014, por conta de notícia veiculada pela TV, a região sul-mineira tomou conhecimento da morte de três parturientes ocorridas no Hospital da Santa Casa (mais uma vez) e também no Hospital Pedro Sanches (este também tristemente famoso por conta do Caso Pavesi). As explicações dadas pela Diretora Clínica da Santa Casa (médica Francisca Barreiro, ré no Caso 7, acusada de homicídio) não foram claras ou convincentes. Por alguma razão, tais notícias foram veiculadas após insistentes cobranças da Irmandade da Santa Casa para receber supostas verbas que estariam atrasadas por parte do estado e do município, inclusive com demissões de alguns poucos funcionários e possivelmente com os menores vencimentos. Ainda por conta de tais repercussões, saíram notas na imprensa escrita local , por parte do atual vice-provedor da Santa Casa, Marcos Carvalho Dias (membro de uma das famílias dominantes na Irmandade), dizendo que a Santa Casa não deve os mais de 14 milhões que recebeu do DME em 2005, quando da administração capitaneada pelo então Deputado Carlos Mosconi . A cautela pode ser explicada pela ainda tímida ação do MPE , que pede explicações ao município (único acionista do conglomerado DME) pelo fato de não ter executado a hipoteca do prédio da Santa Casa, mesmo com o descumprimento por parte desta dos termos do Convênio de 2005, ver apenso 7, relatório Bougeard. Denotando que cede a pressões, o município rapidamente quitou (em dezembro) parte dos alegados débitos com os repasses, transferindo a quantia de R$ 500 mil reais, referentes ao mês de setembro do serviço de urgência e emergência. Só no convênio de urgências o município repassa 3,5 milhões de reais por ano à Santa Casa, segundo informou a imprensa. Até novembro de 2014, já havia sido repassados quase 37 milhões de reais. Que a Santa Casa continua como receptora de vultosas somas por parte dos órgãos públicos não resta a menor dúvida: em 2011 foram repassados quase 36 milhões de reais por “serviços prestados”; em 2012, 35 milhões, em 2013 foram repassados quase 42 milhões de reais. Talvez ficasse mais barato ao contribuinte se tais serviços fossem prestados por instituição pública, com tais quantias investidas em hospitais públicos e não em particulares, pretensamente filantrópicos. Estes, verdadeiros “baús sem fundos”, constantemente com a “goela” aberta para “engolir” a maior quantidade de verbas possível . Ainda a se investigar o uso do dinheiro liberado pelo estado para o UNACON da Santa Casa, que não saiu do papel . Não custa lembrar, que no início dos anos 2000, quando estourou o escândalo do Caso Pavesi, com a suspensão dos transplantes de órgãos, que significavam vultosos recursos para a Irmandade da Santa Casa (da ordem de R$ 400 mil reais por mês, dinheiro da época), com a morte do administrador em 2002, falava-se que o “déficit” da Santa Casa era de 3,5 milhões de reais, que depois saltou “espantosamente” para mais de 14 milhões em 2005. Não se sabe onde a Santa Casa investiu ou gastou os milhões de reais tomados de todos os bancos existentes no país e depois quitados “gentilmente” pelo município (prefeito Sebastião Navarro, membro da Irmandade e presidente da Câmara de Vereadores da época Marcos Togni), através do DME (tal autarquia, todos os anos, passa parte de seus lucros para cobrir os rombos nas contas do município e a conta de luz é paga por todos nós que moramos em Poços de Caldas). Ficou-se sabendo, através de várias auditorias à época, (ver apenso 8) que o restante do dinheiro foi pago para empresas de materiais e medicamentos (não se sabendo se entregaram ou não tais materiais), inclusive para uma de propriedade da família de Carlos Mosconi, a empresa Mantiqueira . Uma parte foi paga diretamente pela Santa Casa para as empresas e depois foi reembolsada. Algumas dívidas foram saldadas sem as respectivas notas como consta do Relatório Final (Bougeard), vide apenso 7, da Comissão Especial nomeada pelo Prefeito em 4/7/05 para autorizar os pagamentos aos credores da dívida apurada até 31/12/04, conforme o Convênio 01/2005. Tal comissão era composta pelo próprio prefeito, Sebastião Navarro Vieira Filho (presidente), Paulo Molinari, diretor à época do DME, Carlos Eduardo Venturelli Mosconi (presidente do conselho curador da Irmandade do Hospital da Santa Casa de Poços de Caldas que sucedeu a Marcos Carvalho Dias, que “renunciou”), Flávio de Lima e Silva (secretário da fazenda) e Salma Maria Neder Camacho (secretária de governo). O Relatório , que ora se anexa, Bougeard, é datado de 5/10/06, e explicita diversas irregularidades no gasto do dinheiro público, que indicam a necessidade do desarquivamento, (arquivado por ordem da PGJ), do IP instaurado para apurar tal fato, não só imoral, mas também ilegal, viciado ab initio. Ali, dentre vários crimes em tese praticados, se vê que: o conselho não explicou o destino de um saldo resultante no abatimento e perdão de algumas das dívidas; indica que eram emitidos cheques sem fundo; imóveis (inclusive no estado de São Paulo) foram vendidos sem nenhuma prestação de contas e sem a devida autorização dos prefeitos municipais, como exige a lei; mostra que joias e imóveis (em milhões de reais) foram destinadas por doação à Santa Casa (Clotildes Gonçalves Malovani) e simplesmente desapareceram tais recursos (f. 94); falta de notas fiscais; indica que a própria hipoteca, até a confecção do Relatório, ainda não tinha sido efetivada no cartório competente, sendo feita posteriormente; aponta que o balanço de 2004 apresentado ao MPE mostrava um déficit de 11,5 milhões de reais, que depois, por razões desconhecidas (f. 27) subiu para o valor acima de 14 milhões de reais; o valor final ficou em 14 milhões e 40 mil reais e a Santa Casa queria 14,4 milhões (f.28); consta expressamente na cláusula 4a do Convênio que passada a carência de 90 dias a Santa Casa não mais poderia apresentar prejuízo operacional (f. 31), o que nunca foi cumprido, gerando a obrigação do município em executar a hipoteca.
Veja pequeno trecho, in verbis:
Esclarece ainda o Convênio que no caso de descumprimento de quaisquer das condições determinadas pela Lei 8133/05 e das cláusulas do convênio, a Irmandade da Santa Casa deveria oferecer em garantia, após a liquidação da dívida e mediante hipoteca ao DME, o imóvel de sua propriedade localizado na Praça Francisco Escobar s/n e novas benfeitorias porventura realizadas. (f.31, apenso 7).
O DME deixou expresso em seu site:
11) Caso a Irmandade do Hospital da Santa Casa de Poços de Caldas, através dos balancetes enviados mensalmente para análise, apresente prejuízo operacional, estarão suspensos todos os pagamentos aos credores, conforme prevê o Convênio n. 01/2005. (f.33, apenso 7).
Mas nada disso foi observado e a “Comissão” fez ouvidos de mercador e o Relatório citado foi simplesmente ignorado até a presente data. Em uma das representações aviadas contra este magistrado (a maioria já arquivada pela E. CGJ), Carlos Mosconi confessa e ao mesmo tempo acusa o então Presidente da Câmara Municipal, Paulo Thadeu, de ser o responsável pela dívida de 15 milhões de reais. Veja:
A bem da verdade, é necessário esclarecer que na época da administração do prefeito Paulo Thadeu, do PT, houve a chamada “co-gestão” na administração da Santa Casa, envolvendo a instituição e o próprio Município. No final dessa administração, o hospital apresentava um déficit de 15 (quinze) milhões de reais. O novo prefeito, Sebastião Navarro, adversário da administração petista, indicou Carlos Mosconi para compor o Conselho Curador da Santa Casa (que não tem funções administrativas), então sem mandato. No mesmo diapasão, envia projeto de lei para a Câmara Municipal, propondo que a dívida da Santa Casa (que então ameaçava levar o hospital ao colapso) fosse saldada pelo Departamento Municipal de Energia (DME), concessionária de energia municipal. Em troca o imóvel que abriga o hospital passaria a pertencer àquele Departamento. Assim foi feito e a dívida foi paga com expressivo deságio e com total transparência. A dívida, ao contrário do que diz o juiz, feita na administração Paulo Thadeu, não foi paga pelos munícipes, mas pela transferência do domínio do enorme imóvel da Santa Casa ao DME. (fls. 17/18, os destaques estão no original).
Necessárias algumas observações sobre tais afirmativas do então Deputado Carlos Mosconi, sempre vagas e com meias verdades. O suposto “déficit” não era de 15 milhões e sim de 14 milhões e 40 mil reais (ou 14 milhões e quatrocentos mil reais, já um absurdo, dinheiro da época; antes se falava em 3,5 milhões de reais, logo após a morte do administrador), até dezembro de 2004. Cabe ao nobre ex-prefeito e atual vereador, Dr. Paulo Tadeu, vir a público e dizer se contribuiu, se é responsável ou não por esta suposta dívida, como afirmou Mosconi. Agora sim a bem da verdade, cabe o registro que Paulo Tadeu desde o ano de 2013, pelo que tenho notícia, vem marcando posição com relação aos desmandos da Santa Casa . Veja:
A Santa Casa tem responsabilidade e precisa dar conta dela e se não faz acho que temos obrigação de tomar providências. Eu comento sempre que quando a Santa Casa recebeu R$ 14 milhões do DME, numa relação confusa e até hoje não esclarecida, numa situação que até hoje ninguém sabe como ficou aquele imóvel, aquela propriedade, a primeira coisa que ela fez para premiar a população que lhe dava R$ 14 milhões foi fechar o ambulatório.
Em 2014, o ilustre Vereador, então Presidente da Câmara de Poços, foi mais além, conforme a manchete de capa de um jornal: “Paulo Tadeu fala sobre leitos hospitalares e defende a desapropriação da Santa Casa” :
(…) Eu não me conformo com uma instituição daquele porte, que tanto recurso público já recebeu, ter a porta fechada do ambulatório. Paulo Tadeu avaliou que Poços não precisa construir um hospital municipal, mas que é preciso ter coragem e desapropriar a Santa Casa e transformá-la em um hospital municipal. “Acho que ai a gente consegue integrar este hospital no Sistema Único de Saúde e não está longe disso, me parece que o prédio pertence à municipalidade”, finalizou.
O próprio Carlos Mosconi, parece concordar com Paulo Tadeu e afirma que o imóvel da Santa Casa foi passado ao DME em troca do pagamento (“em troca, o imóvel que abriga o hospital passaria a pertencer àquele Departamento”; “não foi paga pelos munícipes, mas pela transferência do domínio do enorme prédio da Santa Casa ao DME”). Se o big boss da Irmandade é quem está afirmando que o prédio onde hoje está instalado o hospital é do DME, quem irá contradizê-lo? Pela primeira vez estou concordando com o famigerado ex-deputado. Portanto, para que os munícipes não fiquem ainda mais no prejuízo, pois desde 2005 a Santa Casa deveria pagar aluguéis ao DME pelo uso de prédio que não lhe pertence, deverá o Município executar imediatamente a hipoteca, caso não o faça, caberá ao MPE tomar as medidas cabíveis, pena de prevaricação de todos os atores envolvidos no imbróglio . A menos que a Administração Municipal (por coincidência novamente nas mãos do PT) tenha “algum rabo preso” na situação ou esteja com medo das famiglias que dominam a Santa Casa há décadas, ainda assim cabendo a iniciativa do MPE. Agora fica mais clara a ação “preventiva” do atual vice-provedor da Irmandade, Marcos Carvalho Dias, ao tentar afirmar, via imprensa local, que a dívida da Santa Casa com o DME estaria “paga” com as supostas “extrapolações” do atendimento com as urgências e emergências.
Por conta de medida adotada por ocasião da sentença do CASO PAVESI, a Comissão de Justiça da Câmara de Vereadores pediu informações ao Executivo municipal sobre as contas da Santa Casa . Oficiei ao Legislativo solicitando providências, vide apenso 6, “existem inúmeras suspeitas de irregularidades em seu âmbito, bem como pagamentos de salários acima da média da região, nepotismo e falta de seleção dos profissionais, ocasionando assim, prejuízos aos munícipes”. Infelizmente, até a presente data, não tenho notícia de nenhuma providência por parte do Executivo ou a informação que foi passada ao Legislativo municipal ou alguma ação por parte da Câmara.
Um pouco preocupante a atitude do Sr. Prefeito Eloísio Dentista de ir no dia 12/2/15 até a Capital, acompanhado da Superintendente da Santa Casa, para reunião com o Sr. Secretário Estadual de Saúde, como noticiado . Bem mais preocupante foi o “Fórum” realizado pela Irmandade da Santa Casa na Câmara de Vereadores da cidade em 25/2/15. Não se pode esquecer que a atual Presidenta da Câmara é Regina Cioffi, funcionária da Santa Casa e que estava no centro da “crise” anterior, que culminou na morte do ex-administrador da Santa Casa, “Carlão”. Se o objetivo “oficial” foi demonstrar “para a população, autoridades e políticos a real situação do hospital”, revelando “uma grave crise financeira”, segundo o jornal do ex-deputado (27/2/15), a real intenção pode ser outra, oculta. Lógico que o problema do Hospital sempre foi de gestão, vide apensos 7 e 8. Por causa de gestões fraudadoras, criminosas e mal-intencionadas o contribuinte sempre vem pagando o “pato”, digo, a conta. Ou será que não é má gestão deixar de recolher FGTS de funcionários, o que gerou uma condenação da Justiça trabalhista. Essa prática é antiga, como se vê nos dois volumes do Procedimento de Tutela Coletiva n. 1.22.000.001778/2005-36,(apenso 8) mencionado na sentença do Caso Pavesi. Também é possível que deixe acumular mais uma dívida bilionária, para colocar, mais uma vez, uma espada de Dâmocles na cabeça do Prefeito (mais uma vez, não é coincidência acontecer isso durante uma Administração petista). Funciona assim: a crise é “criada” na Administração do PT e a “conta” é paga pelo próximo prefeito, “amigo”. Foi assim em 2005! Aconteceu uma Audiência Pública na Câmara em 1o/4/05 que acabou resultando na liberação de mais de 14 milhões de reais para a Santa Casa. E veja a contradição: o atual Prefeito fazia parte do Conselho Municipal de Saúde e acabou dando suporte, de alguma forma, a todo esse descalabro. Segundo um periódico local, “a Prefeitura quer saber o que foi feito com os valores repassados por esta e outras administrações.” . O mau caratismo é tamanho que a Superintendente (que está na Santa Casa desde a morte de “Carlão”), teve a audácia de ameaçar os presentes, especialmente o Prefeito, com o encerramento do atendimento de urgências e emergências no hospital. A verdade é que todos fingem não saber que as verbas podem estar sendo embolsadas pelas pessoas que sempre estiveram à frente da entidade “beneficente” ou “filantrópica”. Tanto agora (2015), quanto no passado (2005), quem pontificou no “Fórum” foi Marcos Carvalho Dias . Em São Paulo está dando cadeia e o provedor foi afastado. Lógico que “gestão compartilhada” não resolverá o problema, pois não se divide nada com gente desonesta. Ademais, como visto, o próprio prédio da Santa Casa JÁ PERTENCE ao município. O ex-prefeito e Vereador Paulo Tadeu não esquece as lições do passado, inclusive aponta que as verbas públicas do Hospital tiveram acréscimo de 33% de 2013 para 2014. Resta saber se o Sr. Prefeito vai se dobrar às ameaças dos fanfarrões. O “Fórum” retornou no dia 11/3/15 (mesmo dia em que haveria Júri do Caso Pavesi em BH) para continuar com a pantomima (tudo por dinheiro). O júri acabou adiado, como se sabe, a pedido das Defesas dos médicos Alvaro Ianhez e José Luiz Gomes da Silva. Mas já rendeu frutos (mais dinheiro): segundo o único jornal que deu a notícia, o Sr. Prefeito acabou concordando em dar reajuste de 40% nos valores repassados à Santa Casa , sabe-se lá por qual motivo. A saber se vai executar ou não a hipoteca, ao que parece, não. O ex-prefeito Sebastião Navarro, da mesma forma que Mosconi, acusa Paulo Tadeu : “Ele colocou o pessoal dele para administrar o hospital na sua gestão(...) a dívida da Santa Casa subiu de 2,5 para 14 milhões de reais?”. Esse periódico diz que é hora de uma auditoria na Santa Casa “dos últimos dez anos do hospital para saber o que está acontecendo lá”. Está em gestação novo golpe no dinheiro público ou alguém duvida quem, mais uma vez, vai pagar a conta? E onde o dinheiro foi gasto ou na conta de quem se encontram os milhões de reais?
Agora, o mais espantoso: a Santa Casa em suposto documento encaminhado à Câmara de Vereadores denuncia o Convênio firmado com o DME em 2005, alegando “ilegalidade e inconstitucionalidade de se exigir que o hospital mantenha o atendimento de urgência e emergência” . Afirma ainda a Santa Casa que “é vedada a interferência estatal em funcionamento de uma instituição privada” . Ora, então na hora de pegar o dinheiro pode, depois não pode mais? E porque esperaram mais de 10 anos para chegar a tal conclusão? Já o ex-prefeito e ex-presidente da Câmara, Paulo Tadeu diz que os prefeitos se “apropriaram” do dinheiro do DME, ao supostamente não repassar o valor mensal devido pelo atendimento de urgência e emergência . Afinal, quem são os ladrões do dinheiro público? Será que o MP vai reabrir o inquérito instaurado para apurar tal negociata? Requisitei o documento encaminhado pela Santa Casa à Câmara Municipal para as devidas providências, como se vê no final desta sentença.
Quem sabe agora, com a nova “ciranda da morte” instalada ou redescoberta na “santa” Casa, com os novos ventos que sopraram na direção das Gerais, isso possa mudar e de uma vez para sempre. Quantos ainda precisarão morrer para que a quadrilha instalada nas imediações da Praça Francisco Escobar seja dali desalojada ? Um assaltante de arma em punho provoca muito desassossego no povo. Mas assaltantes do dinheiro e da boa-fé pública, com ou sem jaleco ou colarinho branco causam muito mais danos, inclusive à imagem do país e na credibilidade das instituições.
Para finalizar a questão das vultosas verbas públicas aplicadas na Santa Casa, sem o devido retorno, como se viu, um pequeno resumo do que foi noticiado apenas no curto período de 2013 a novembro de 2014:
- 03/05/13- investimento federal de R$ 700 mil reais na reforma da pediatria; mais R$ 1 milhão para ampliar leitos e R$ 200 mil para compra de equipamentos; assim, quase R$ 2 milhões de reais, com verbas conseguidas pelo então Dep. Geraldo Thadeu;
- 17/05/13-aumento de mais de 130% da verba do PRO-HOSP, ou seja, R$ 1,6 milhão de reais. A se registrar que o programa de fortalecimento e melhoria da qualidade dos hospitais do SUS-MG deveria servir a hospitais públicos, o Hospital da Santa Casa é particular. Como se viu, na Santa Casa o dinheiro deve ter sido utilizado para outra coisa, pois a qualidade é péssima; quem se jactou com a verba foi o indefectível ex-deputado Mosconi;
- 21/06/12, a notória PRO-RIM recebeu em doação e passou à Santa Casa uma balança de plataforma;
- 10/03/13, recebimento de verbas federais no montante de R$ 200 mil reais para compra de equipamentos. Como visto pelas auditorias, compra de equipamentos sempre foi um “fraco” na Santa Casa;
- 16/06/13, o governo estadual liberou mais R$ 1,2 milhão de reais para a Santa Casa ampliar a UTI neonatal. Pelo visto o investimento não surtiu os resultados esperados;
- 25/11/14, por conta das pressões feitas pela Santa Casa, o estado de Minas Gerais liberou duas parcelas de R$ 200 mil reais referentes à Rede Hospital de Urgência e Emergência.
Um caso bizarro, relativo a outra santa casa, a Santa Casa de Andradas : o Promotor de Justiça Wagner Iemine deu ordem de prisão por cárcere privado e sequestro à Superintendente da Santa Casa, Selma Manzoli, ao médico Sérgio Olimpio de Carvalho e para o diretor Iverson Pereira. Motivo: a irmã de Selma estava presa no hospital contra a sua vontade, com violência, por suposta crise psiquiátrica.
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) multou em 15/10/14 o CFM (Conselho Federal de Medicina), a Associação Médica Brasileira e a Federação Nacional dos Médicos em quase R$ 650 mil reais, pela prática ilegal de tabelamento de preços de consultas e coação aos médicos contrários a participar de greve contra operadoras de planos de saúde . Onde será que ficou a ética de tais entidades, especialmente do CFM, que foi quem recebeu a maior multa, de quase R$430 mil reais? A cada dia tal entidade, juntamente ao CRM, mostra seu anacronismo, além do conhecido corporativismo, prejudicial à população que os sustenta com dinheiro público.
Apenas para contextualizar e alertar aqueles que ainda não acreditam no caráter de certos membros da elite poços-caldense, vou juntar aos autos cópia da denúncia do MPF, apenso 6, contra alguns dos membros da chamada “Máfia do Café” , que deu prejuízos de milhões e milhões de reais. Foram denunciados (autos n. 2004.38.00.034744-3) Jaime Junqueira Payne (que outro dia mesmo estava em viagem a London-UK, na companhia de Mosconi), Júlio César Junqueira Tassi, Manoel Barbosa Junqueira Fábio Fernando Garcia Marques, Moacyr Gomes Nabo Filho (médico dermatologista, que está quase todo o dia nas colunas sociais, como se nada tivesse acontecido, “podre” de rico, irmão de um outro criminoso condenado por roubo de cargas, fazendeiro e ex-dono de farmácias na região), Rogério Marcassa, Fábio César Bengtsson e Ademir Feltrin. Se alguém tiver a curiosidade de ler o documento, é difícil, irá ver que tais pessoas poderiam muito bem ter ensinado o Marcos Valério a operar no mercado de capitais e na lavagem de dinheiro.
Atualizadas as informações sobre as últimas ações da Organização, há que se retornar aos fatos relativos aos processos envolvendo diretamente os transplantes, pois importantes ao deslinde do presente caso. Depois de julgado o CASO1, sentença confirmada quase na integralidade pelo E. TJMG, inclusive reconhecendo o tráfico de órgãos em Poços de Caldas, a existência da Organização Criminosa, bem como a lisura da conduta deste magistrado em todos os processos (já afirmada antes e depois reconhecida em todas as exceções de suspeição -injustamente arguidas-, julgadas improcedentes), ficou um pouco mais fácil de entender as engrenagens do esquema criminoso, o seu modus operandi. Criminosos contumazes, membros de organizações voltadas para o crime, deixam marcar indeléveis, sempre agem do mesmo modo diversas vezes e acreditam piamente que sairão impunes. Isso permite aos investigadores, aos promotores e aos juízes entenderem tais engrenagens e evitar que escapem das punições devidas, ainda que tardiamente. Como explicitei por ocasião da última sentença que prolatei, CASO 2, vide apenso 5, notas taquigráficas, sobre a forma de atuação dos médicos transplantadores de Taubaté (já condenados pelo Tribunal do Júri):
Então, o procedimento, na verdade, funcionava da seguinte forma: um paciente com uma lesão cerebral grave dava entrada no hospital; imediatamente, um desses dois médicos era acionado, “era constatada”- entre aspas “era constatada”- essa morte encefálica, eram acionados os outros dois médicos, o uro e o nefro, esses rins eram retirados, a pessoa falecia, e o mesmo neurocirurgião era o médico legista. Então, era ele que ia fazer o laudo necroscópico. Nesse caminho, se a gente analisar, não havia ninguém para questionar nada. Não tinha outro médico legista, não tinha outro neurocirurgião, não tinha outra pessoa para fazer a necropsia, ou seja, era tudo realizado por eles. Por isso que foi possível, até que isso fosse apurado, foi possível que isso fosse feito por eles num processo em relação a quatro casos, sem que ninguém visse nada. Então era esse o procedimento envolvendo os quatro. Isso ficou muito claro. (fls, 115/116)
Em contrarrazões ao recurso em sentido estrito (CASO 2), datado de 25/11/15, ora anexada, vide apenso 6, o ilustre Promotor de Justiça, Marcelo Mattar, discorre em suas “considerações iniciais” , sobre o modus operandi da organização criminosa envolvida nos transplantes, também denominada “Máfia dos Transplantes de Órgãos” (fls. 2/3 do documento citado).
Aqui, em Poços de Caldas, (da mesma forma que ocorrera em Taubaté) era tudo feito às escondidas, não havia como ninguém descobrir nada, na corporação médica, tal qual numa organização secreta, viceja a omertá , a lei do silêncio. Disse o promotor dos casos paulistas por ocasião da CPI DO TRÁFICO DE ÓRGÃOS , vide apensos 4 e 5, “não tinha outro médico legista, não tinha outro neurocirurgião, não tinha outra pessoa para fazer a necropsia, ou seja, era tudo realizado por eles. Por isso que foi possível, até que isso fosse apurado, foi possível que isso fosse feito por eles num processo em relação a quatro casos, sem que ninguém visse nada.” Em Taubaté os assassinatos para fins de transplantes só foram descobertos por causa de um médico que desconfiou das cirurgias feitas na calada da noite . Em Poços de Caldas os horrores vieram à tona por causa do superfaturamento da conta do Hospital Pedro Sanches. O pai da vítima Pavesi desconfiou com a cobrança indevida dos procedimentos dos transplantes- que deveriam ser pagos pelo SUS- e passou a desconfiar e a investigar, não sem antes ter conferido placas de prata aos médicos suspeitos e aos assassinos de seu filho . Posteriormente, com as auditorias determinadas pelo DENASUS e outras, inclusive do MPE, descobriu-se o festival de ilegalidades, as cobranças indevidas, AIHs falsificadas , Central clandestina (MG-SUL TRANSPLANTES), fraude à lista única, não eram feitas as necrópsias (para se extrair os órgãos que quisessem, maximizando os lucros que já eram fabulosos), o protocolo previsto na Res. CFM n. 1480/97 não era obedecido, dentre outros crimes (incluindo a extração de órgão de pessoa viva causando-lhe a morte, analisada no CASO ZERO- Pavesi - e também nos presentes autos). Tanto nos casos de Taubaté, quanto nos de Poços de Caldas o CREMESP, o CRMMG, respectivamente, e o CFM apoiaram os médicos denunciados e posteriormente condenados, dizendo e alardeando por meio de notas por toda a mídia, incluindo a televisada, que não infringiram nenhuma norma ética . Ora, se cometeram crimes (utilizando práticas médicas, o que os torna ainda mais graves), logicamente infringiram as normas éticas que são ditadas pelo próprio CFM, além de diversas outras resoluções. Não podiam e não podem estar exercendo a medicina, muitos menos atendendo pacientes do SUS. Já deveriam estar presos e há muito tempo. Contam com a morosidade processual e fartos recursos financeiros para tentarem sair impunes. O Caso Pavesi é o mais expressivo e bem documentado de todos (somado a este Caso 5), com fortíssimas provas, inclusive documentais, especialmente as periciais. Os demais casos também estão recheados de provas, bastando a leitura dos processos, cotejando as provas de uns com as dos outros (deveriam ter sido julgados em conjunto, como recomendado no Relatório da CPI, vide apenso 4, mas, na prática, restou impossível). Tanto é vero, que já rendeu várias condenações.
Necessária a transcrição de mais um trecho das contrarrazões ao RSE (Caso 2) do MPE (CAO CRIM, Belo Horizonte, apenso 6), para se entender a conexão entre os casos e processos, a qual as ilustres Defesas tentam negar a todo custo, vejamos:
O pleito defensivo mostra-se totalmente improcedente. Os presentes autos, assim como os demais a este relacionados que tramitam perante a 1a Vara Criminal de Poços de Caldas, decorreram de investigações realizadas a partir do denominado Caso Zero ou Caso Pavesi (autos n. 0518.08.148.802-6) e da Auditoria operada pelos órgãos de DENASUS, VISA e ANVISA. Nessas investigações, foram constatados casos suspeitos envolvendo os transplantes de órgãos realizados na Santa Casa de Misericórdia de Poços de Caldas.
Tratam-se de crimes praticados nos mesmos moldes de com o mesmo objetivo final: a obtenção espúria de órgãos para transplantes. Todos os processos envolvem o tráfico de órgãos nesta comarca. Há inclusive processos com réus coincidentes, lembrando que José Luiz Gomes da Silva já foi pronunciado pelo crime de homicídio no caso que envolveu a morte da criança Paulo Veronesi Pavesi (Caso Zero- autos n. 0518.08.148.802-6), o qual constataram-se inúmeras irregularidades no prontuário da vítima, como desaparecimento de exames imprescindíveis à constatação da situação do paciente e autorização irregular de retirada de órgãos.
A decisão no chamado “Caso 1”, na qual houve a condenação confirmada em segundo grau(Apelação Criminal n. 1.0518.10.018719-5/001, 3a Câmara Criminal do TJMG) veio a demonstrar que a “máfia” agia sempre no mesmo modus operandi. Em todos os casos investigados a intenção dos envolvidos era a mesma, qual seja, obtenção de vantagem pessoal com a futura realização de transplantes, através do ganho financeiro com a venda (tráfico) dos órgãos das vítimas, não havendo, assim, respeito à vida dos doadores e ao sofrimento de seus entes queridos.
Não se trata de conjecturas, como quer fazer crer a Defesa, mas de certeza. Com base nas provas documentais e testemunhais juntadas aos autos, restou comprovado que modus operandi adotado pelo recorrente, é o mesmo utilizado por toda a organização criminosa para a captação, remoção e transplante dos órgãos, realizados nas dependências do Hospital da Santa Casa.
Nesse sentido, por meio da análise conjunta de todos os casos, comprovou-se que o recorrente era integrante de uma organização criminosa que se denominou posteriormente de “Máfia dos Transplantes de Órgãos”. Conforme bem fundamentou o nobre Magistrado na sentença do Caso 1 (fls. 516/552, vol.03), a atuação da organização criminosa funcionava da seguinte forma (modus operandi da organização):
Funcionava mais ou menos assim (modus operandi da organização), conforme visto nos outros casos citados e mesmo neste: o paciente entrava na Santa Casa – hospital referência na sub-região - (era internado), ficava na enfermaria geral, por quanto tempo o organismo (praticamente à míngua), mesmo que seu estado fosse grave, geralmente sob os cuidados de um neurologista ou outro médico qualquer (pouco importava, desde que mantidos os órgãos funcionando, pacientes traumatizados, geralmente com TCE ou AVC); quando ficava “bom para UTI” (ou seja, quase morto ou já em morte encefálica), era internado no CTI - para melhor monitorar o funcionamento dos órgãos de interesse do grupo – especialmente rins e córneas – mas também coração e fígado (que eram “doados” para colegas do Estado vizinho de SP ou remetidos para Belo Horizonte); no CTI, os intensivistas, urologistas e neurologistas “declaravam a morte encefálica” do paciente, que de paciente vivo, tornava-se “doador cadáver”, momento que se transformava em objeto (se é que já não era antes, desde que entrava no “esquema criminoso”) e tinha seu corpo repartido, de acordo com os interesses dos médicos, ou melhor, dos criminosos que se diziam “médicos”. A quadrilha fazia tudo para dar “aspectos de legalidade” aos seus atos criminosos, mas os rastros começaram a aparecer, pois depois de um tempo ficaram mais descuidados, como soy acontecer. Esqueciam de preencher corretamente o protocolo de morte encefálica (“critério recomendado...”), usavam modelos defasados, não aguardavam os intervalos determinados, esqueciam de fazer constar nos prontuários a retirada de medicamentos depressores, etc. Tinham o cuidado de manter os prontuários “descuidados”, pois assim dificultariam futuras investigações. Não assinavam ou colocavam o carimbo ou o CRM, faziam rasuras, deixavam de anotar condutas. Ainda assim, tudo faziam para convencer os pobres familiares a efetivar a doação dos órgãos, aproveitando da fragilidade que estavam pela perda recente de um ente querido. O plano parecia perfeito e os lucros eram cada vez maiores e com um plus: o reconhecimento social (...)” (fls. 533- v/534, vol.03). (fls. 5/7, B) Da conexão com outros casos de retirada e transplante na cidade de Poços de Caldas in Contrarrazões ao recurso em sentido estrito).
Não foi tão somente o Juiz de Direito (várias vezes excepcionado e em todos confirmado como magistrado íntegro e imparcial) quem escreveu as fortes palavras acima. Foi um Órgão Ministerial do calibre do Coordenador do CAO CRIM em Belo Horizonte, não só órgão acusador, mas fiscal da lei, sem nenhuma ligação com o caso, com os réus ou vítimas ou com Poços de Caldas . O que vão dizer agora? Vão requerer o afastamento do Promotor também? E do anterior a ele? E dos que se manifestaram ou participaram das audiências? Certamente que prefeririam o Promotor que pediu a impronúncia dos réus do Caso Pavesi, depois foi testemunha de defesa e depois de aposentou . Primeiro a Defesa pleiteou como competente a Justiça Estadual, quando os processos eram conduzidos na esfera Federal. Agora vão pedir a volta da Justiça Federal. Certamente prefeririam o Procurador da República Adailton (MPF), que depois também se tornou testemunha de defesa dos médicos e teria tentado dar crédito à farsa da inventada e inverossímil 2a arteriografia da vítima Pavesi, com participação direta e imprescindível do atual réu JEFERSON SKULSKI, então também testemunha de defesa . Outros que foram testemunhas de defesa e depois viraram réus pela ação do MPE: Paulo César Negrão (também presidente da Associação dos Médicos de Poços de Caldas, que vem soltando notas inverídicas sobre os casos), Francisca Barreira, Regina Cioffi (atual presidente da Câmara Municipal e ré em processo perante a Justiça Federal, adiante mencionado).
É preciso lembrar que novamente nesses autos vieram à tona os mesmos nomes de médicos criminosos, FÉLIX GAMARRA (o famoso “bom para UTI”), CLÁUDIO ROGÉRIO, JOÃO ALBERTO, (condenados nos CASOS 1, ZERO e réu no 5, o primeiro teve decretada a prescrição) JOSÉ LUIZ GOMES (CASOS ZERO e 2), CELSO ROBERTO (CASOS 1 e ZERO), etc. ALVARO IANHEZ somente responde pelo CASO PAVESI e já respondeu a alguns inquéritos perante a Justiça Federal. SÉRGIO POLI GASPAR no CASO ZERO e os demais somente em cada um dos casos. JEFERSON SKULSKI foi peça-chave no esquema da Organização Criminosa, como visto na sentença do CASO Pavesi. O réu e médico JOÃO ainda é suspeito nas mortes de “Carlão”, sendo que junto com FELIX atendeu o ex-administrador, e também na recente morte de José Alexandrino. Faltou ser processado o suposto chefe da Organização Criminosa, que, espertamente, teria conseguido ficar todo o tempo de fora e ainda, de quebra, poderia vir a livrar alguns amigos mais próximos com influência política que detinha ou detêm. Não valeu a pena pois, como vários dos envolvidos, já completou 70 anos, a marca da prescrição (impunidade). Leis arcaicas.
Em 21/8/14 o MPE de Poços de Caldas, em especial pelo ilustre Promotor de Justiça Sidnei Boccia, vide apenso 6, ingressou com ação cautelar n. 0146425-69.2014 (por dependência aos autos do Júri do Caso Pavesi- autos n. 1488026.72.2008.8.13.0518, hoje processo n. 0024.14.315.300-5, desaforado para o 1o Tribunal do Júri de B. Horizonte, o qual mencionarei a seguir). A ação foi contra os corréus Alvaro Ianhez, José Luiz Bonfitto, José Luiz Gomes da Silva, Marcos Alexandre Pacheco da Fonseca (médicos e réus no processo do Júri Pavesi). A outra ação é o CASO ZERO/Pavesi, derivada do aditamento em relação aos réus CELSO SCAFFI, CLÁUDIO ROGÉRIO e SÉRGIO POLI GASPAR, que havia sido omitidos pelo MPF), já julgada. Além desses, figuram no polo passivo da cautelar a ASSOCIAÇÃO MÉDICA DE POÇOS DE CALDAS e a ASSOCIAÇÃO MÉDICA DE MINAS GERAIS. Anexei cópias da inicial, bem como da sentença onde foi deferida liminar para impedir que os réus citados pudessem praticar os atos de tentativa de influenciar os jurados, o que aconteceu nas semanas que antecederam ao julgamento que seria no dia 31/7/14. Foi adiado, dentre outras, por tais razões. Nas “propagandas” veiculadas por todos os meios o CRMMG dizia não ter detectado qualquer infração ética em relação aos atendimentos dos médicos e a Associação dizia que certa decisão da Justiça Federal havia reconhecido a inexistência de tráfico de órgãos em Poços de Caldas. As propagandas ficaram por dias e nos horários ditos nobres da televisão, denotando a influência política e econômica da classe médica, dos réus e de suas associações classistas. Pretendiam influenciar o ânimo dos jurados, pessoas comuns e no mais das vezes, simples. Afirmou, literalmente, o Órgão Ministerial: “Ademais, é de conhecimento geral, que mesmo uma mentira, várias vezes repetida, acaba sendo tomada como verdade.” Deferi a tutela antecipada, que posteriormente foi mantida na sentença proferida em 3/11/14. Os únicos réus que haviam contestado e recorreram foram Ianhez e as Associações, que também impetraram Mandado de Segurança. O processo foi apensado ao principal e remetido para B. Horizonte. O mais interessante foi que um dos réus mais indignados com a medida proposta pelo MPE foi a ASSOCIAÇÃO MÉDICA DE POÇOS (cujo presidente é o atual réu PAULO CÉSAR NEGRÃO). O advogado de tal Associação é o mesmo Adrian Cagnani que, nos idos de 14/5/2002 propôs ação de MEDIDA CAUTELAR INOMINADA, vide apenso 6, em nome da mesma associação contra PAULO AIRTON PAVESI (pai da criança Pavesi) e tal ação caiu exatamente na 2a Vara Cível, cujo titular era o hoje aposentado juiz Antônio Pereira Gatto. Agora, a Associação Médica afirma que a decisão “violou seu direito líquido e certo de liberdade de expressão, manifestação de pensamento e o acesso à informação”. Mas em 2002 dizia exatamente o contrário ao se referir ao pai da criança Pavesi:
Ocorre que, desprezando completamente o ordenamento jurídico e os direitos constitucionais da requerente, o requerido abriu um “site” na internet, no endereço eletrônico www.geocities.com/transplante2001, distorcendo dolosamente a realidade dos fatos, e publicando conclusões que não existem, uma vez que a matéria está “sub-judice” e ainda não comportou julgamento”. (Proc. n. 02.19792-8 ou 0518.02.019792) .
O pedido foi devidamente acatado, na íntegra, pelo Juiz Gatto , em decisão proferida no dia seguinte, 15/5/2002, sendo censurada a manifestação do pai da vítima, mandado retirar o sítio da rede e proibida a menção ao nome da ASSOCIAÇÃO DOS MÉDICOS DE POÇOS DE CALDAS pelo então réu. E ainda dizem que a Justiça é morosa! Ora, e a manifestação do pensamento, a liberdade de expressão e o livre acesso à informação? Só vale para uns e não para outros? Onde aprendi (EJEF, lição do Des. Gudesteu Biber) o “pau que dá em chico também dá em francisco”. Já para a Associação, “pimenta nos olhos dos outros é refresco”, etc. Não consta que o sítio aberto pelos médicos para propagar suas teses tenha sido da mesma forma censurado ou retirado por alguma ordem judicial no tempo presente.
Cabe, ainda, a abertura de um parêntesis para o relato de um outro caso absurdo que chegou ao meu conhecimento através da pessoa de Joaquim Vidal Junqueira Cobra, vide apenso 6: segundo o denunciante, o Juiz Gatto, então na 2a Vara Cível de Poços, praticou irregularidades (e até, em tese, crime ) na condução dos processos 0518.0208336-7, 0518.02011528-4 (execução de título extrajudicial e 0518.02011439-4, sendo processado perante a CGJ e CNJ (tais processos devem ter sido arquivados, pela aposentadoria, mas pode remanescer a responsabilidade penal, também a se ver pela possibilidade da prescrição pela metade, mais de 70 anos, como alguns dos envolvidos no presente processo). O fato é que a família do denunciante foi deixada na pobreza. Com a palavra o novo titular da 2a Vara Cível, para, assim entendendo, consertar o mal já feito pelo antecessor. Em somente um dos casos, foi penhorada e levada à hasta pública a Fazenda Santo Aleixo (no valor de 20 milhões de reais) para pagar uma suposta dívida que não passava de 300 mil reais, em claríssimo caso de excesso de execução, sendo que a lei processual diz que a execução deve correr do modo MENOS GRAVOSO para o devedor. Mas existem acusações mais graves ainda, incluindo falsa avaliação, contratação de falsas testemunhas com orientação do próprio juiz, etc. Caso bem típico de Poços de Caldas e com grande chance de ficar impune, mais uma vez. Com certeza a douta Corregedoria-Geral de Justiça agiu com a presteza e rapidez que o grave caso demandava, que levou toda uma família para a miséria, até mesmo pela proximidade da aposentadoria do juiz, já conhecida de antemão.
Já no pedido de desaforamento do julgamento do Caso Pavesi, vide apenso 6, ajuizado perante o TJMG em 1/8/14 , pelo CAO CRIM, ao final acatado, disse que: os réus “todos extremamente conhecidos nesta comarca” e influentes no “meio social”, “Tanto que promotores de justiça oficiantes na comarca se declararam suspeitos e se afastaram do caso no nascedouro, dado ao íntimo conhecimento que mantinham com os réus” . Disse mais, o MPE, cópia ora anexada a esta sentença:
No âmbito administrativo e classista, junto ao Conselho Regional de Medicina (CRM), em decisão corporativa, os réus foram absolvidos, já que aquele órgão, ao analisar pleito da justiça de cassação do registro dos imputados “não verificou nenhuma infração ética em relação aos atendimentos realizados”. Tal decisão foi confirmada, em sua integralidade, pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). (…)
Por sinal, vários são os feitos em andamento com relação à famigerada “Máfia dos Transplantes”. Paulo Veronesi Pavesi é apenas o “Caso Zero”, o marco inicial, senão o mais revoltante, por vitimar uma criança de tenros 10 anos de idade. Outros tantos existem, alguns já com sentença condenatória, como no caso da vítima João Domingos de Carvalho (autos n. 0518.10.018719-5). (…)
Cabe ressaltar que houve nesses últimos dias a intensificação de uma campanha de desinformação que já existe há longo tempo, sempre no sentido de convencer a opinião pública (e o corpo de jurados local, obviamente) da suposta inocência dos pronunciados. (O grifo está no original) .
A Santa Casa era hospital de referência, assim como a MG Sul Transplantes, empresa criada para dar suporte às operações do grupo.
O pai da vítima Pavesi foi pela primeira vez ouvido em um processo judicial em 3/6/14, ainda que por carta rogatória, posteriormente juntada aos autos 0518.13.001937-6 . Pavesi, pai, fala da série de crimes descobertos, semelhantes ao de seu filho (inclusive do caso dos autos), das pessoas que eram “empurradas para a morte” a fim de fornecer órgãos para transplantes, que em muitos dos casos “os pacientes ainda estavam vivos quando os órgãos eram removidos”. In verbis, pequenos trechos:
ÁLVARO IANHEZ criou uma rede de central de captação e distribuição de órgãos completamente clandestina, com o auxílio e proteção política de CARLOS MOSCONI. Também criaram uma organização de pacientes com problemas renais crônicos, que tinham acesso a cirurgia mediante contribuição financeira, disfarçada de “doação” monetária. (…)
As instituições MG SUL Transplantes e PRO RIM eram partes fundamentais nesta organização criminosa. O MG SUL Transplantes funcionava em um prédio próximo ao Hospital da Santa Casa, no mesmo andar em que funcionava o consultório médico de ALVARO IANHEZ e a PRO RIM (organização de renais crônicos de Poços de Caldas). CARLOS MOSCONI possui o controle político da cidade. Ele comanda a polícia, o ministério público, os órgãos de fiscalização municipal e até estadual. (…)
Em nenhum lugar do mundo, o crime organizado existe sem a conivência de autoridades (…). No caso de Poços de Caldas, o que consegui apurar é que CARLOS MOSCONI, médico e deputado estadual, ex-assessor de AECIO NEVES (governador de Minas Gerais quando Paulinho foi assassinado), possuía e ainda possui este poder. MOSCONI também comanda a imprensa em Poços de Caldas. No decorrer das investigações pude comprovar a participação direta do delegado federal CELIO JACINTO DOS SANTOS, do procurador federal ADAILTON RAMOS DO NASCIMENTO e do procurador federal JOSÉ JAIRO GOMES. Essas 3 pessoas ajudaram a criar documentos falsos, introduzi-los nos processos investigatórios e ainda utilizarem seus poderes para calar a minha boca. Estas 3 autoridades passaram a ignorar minhas denúncias e bloquear meu acesso ao Ministério Público em diversos estados do país. Não satisfeitos passaram a enviar ofícios para o local onde eu trabalhava, pedindo a quebra do meu sigilo eletrônico, desnecessariamente, pois todos os e-mails que enviava sobre o caso, eles estavam relacionados como destinatários. Com isso provocaram a minha demissão enfraquecendo a minha capacidade autônoma de continuar investigando. Não satisfeitos, me processaram criminalmente por calúnia, injúria, difamação e coerção no decorrer do processo. Tais acusações eram completamente absurdas e fui absolvido pela justiça federal que reconheceu que eu estava certo. Nota-se tremendo empenho em tentar impedir que eu investigasse, enquanto os autores dos crimes eram beneficiados com toda sorte de facilidades para escapar das acusações.(...) Toda esta rede está detalhadamente descrita no livro em anexo, do qual assumo toda a responsabilidade.(...).
Em 2007 as ameaças se intensificaram. Fui obrigado a deixar o país e solicitar asilo político na Itália. As principais ameaças vieram do Ministério Público Federal, que estava planejando submeter-me a um exame de sanidade mental, com o intuito de desqualificar as minhas denúncias.(...)
Tal fato comprova que a máfia continua a forjar provas e documentos para obstruir a justiça.(...) . Desta forma, ACUSO formalmente o Conselho de Medicina de Minas Gerais e seus 42 conselheiros de fazerem parte direta ou indiretamente desta organização criminosa. (…). O que eu posso afirmar com certeza é que quando comecei esta luta não fazia ideia da dimensão desta máfia. Hoje eu a conheço muito bem.
As palavras e acusações de Paulo Airton Pavesi estão ai, ecoando, clamando por Justiça, vide apenso 9, “Paulinho por justiça”. Acusa frontalmente o então deputado CARLOS MOSCONI como chefe da Organização Criminosa, ainda atuante em Poços de Caldas e região. Indica, com farta prova em documentação hoje constante nos autos, a importância da ONG MG SUL TRANSPLANTES e da entidade PRO RIM (que ainda existe e ainda é presidida por LOURIVAL DA SILVA BATISTA, 1o transplantado de Poços, operado por MOSCONI e condenado em sentença transitada por estupro de vulnerável). ALVARO IANHEZ era DIRETOR DA PRO RIM, conforme atestam atas de reunião da entidade. Demonstra com lógica e provas a participação de autoridades federais, estaduais e municipais na Organização Criminosa, inclusive acusa o CRMMG de, no mínimo, conivência com os crimes, que vão de estelionato, falsificação, lavagem de dinheiro a homicídios para fins de tráfico de órgãos e “queima de arquivo”. Dificilmente será ouvido em Belo Horizonte, ainda que tenha sido requerido pelo MPE. O motivo: desconhecido.
Presenciei, pessoalmente, a forma de atuação da Organização (modus operandi): fazem uma suposta “denúncia”, aparece uma “testemunha”, depois fazem tudo para desacreditar tais fatos e tal “testemunha”. Entretanto, tudo que a pessoa falou é mesmo verdade. Fizeram isso com o “José Popô”, o falecido JOSÉ ALEXANDRINO APOLINÁRIO , que vivia com recursos acima de suas possibilidades. Logo depois do assassinato de CARLOS HENRIQUE MARCONDES passou a trabalhar em ambulância da prefeitura e acabou como renal crônico e ele próprio morto (“em boca fechada não entra mosquito”, falava). Apareceu uma “denunciadinha” de uma suposta enfermeira no local conhecido por “Instituto Danilo Menezes”, em ótimas instalações. O ponto de referência do local é o SAMU, cuja diretora é NAIR SMITH CHUVA, que participava das cirurgias de transplantes sem ser autorizada, mulher do réu e condenado CLÁUDIO ROGÉRIO, órgão que supostamente atendeu a José Alexandrino Apolinário. O Baruk do Presídio e o condenado PAULISTA (um dos envolvidos com a morte de Andreia, que depois ficava posando de bom moço para a direção, fazedor de móveis de bambu, mas, na verdade, um bandido de quatro costados, que já cumpriu pena em diversos presídios do país) tentaram emplacar uma história para confundir os julgamentos a mando possivelmente do Vereador LICAL. Um corretor de imóveis (“Luizão”) ficou fingindo tentar vender um lote de minha propriedade, mas querendo que eu passasse o imóvel no cartório por valor menor, possivelmente para ser acusado pelo Grupo como sonegador, igual ao filho do MOSCONI. A creche Fênix , com a ajuda do vereador Lical, seu vizinho, recebe prêmio, depois estranhamente cancelado e “tias” sem nada, aparecem em seguida com veículos e outros “prêmios” somente para maltratar e torturar psicologicamente uma criança, cujo único delito é ser filha do juiz. Não sem antes colocar um “quase retardado” para fazer gestos obscenos para a mesma criança na porta do local.Recentemente, ameaças veladas foram veiculadas em um tabloide mensal, dizendo sobre afogamento de NARCISO , obviamente se referindo apenas à lenda, cuja editora fica aparecendo “do nada” para a mulher do juiz em um restaurante da cidade, na esperança de a cooptar para alguma reportagem, como dever ser o procedimento das pessoas daqui. Vamos, novamente, aos fatos que realmente interessam, no momento .
Como mencionei na sentença do CASO 2, o próprio e então coordenador do MG Transplantes (MG TX) , João Carlos O. Araújo explicou, perante a CPI DO TRÁFICO DE ÓRGAÕS , vide apenso 5, a razão dos réus serem tão confiantes na impunidade:
(…) o pessoal {da Santa Casa} parece que não levava a sério a coisa da Vigilância [sanitária}. Passava a impressão de que havia algum poder político, alguma coisa assim que eles se achavam...
Estou juntando a estes autos o ofício que encaminhei ao Presidente da AMAGIS em 8/3/13, acompanhado de cópias de documentos, vide apenso 6, em que relatei a situação que passei a conviver, de ameaças veladas, representações com a finalidade de desestabilizar o magistrado, sobre a existência da Organização Criminosa (segundo o MPE), sobre o afastamento da delegada regional de Polícia Civil, após investigar a Santa Casa, influência política de CARLOS MOSCONI sobre a polícia (conforme um delegado especial informou), a morte do administrador envolvendo possivelmente ex-policiais e as providências que entendia cabíveis. Não fui atendido. Reproduzi manifestações do nobre Promotor de Justiça, Joaquim José de Miranda Júnior, então coordenador do CAO CRIM e dois dos processos, CASO 1 e CASO 8:
Pugna, ainda, que cópias destes autos sejam enviadas `a Depol para que continuem as investigações pois, ao que parece existia uma quadrilha de captação e transplantes irregulares de órgãos humanos – em especial rins e córneas- atuando dentro da Santa Casa de Poços de Caldas (…)
Posto isto, o Ministério Público requer o prosseguimento das investigações para melhor apuração de todos os envolvimentos nesta rede criminosa. De Belo Horizonte para Poços de Caldas, 28 de maio de 2012 (CASO 1, autos 0187195-46.2010).
Pode-se afirmar que a existência de uma organização criminosa formada por médicos que traficavam órgãos humanos nesta cidade já restou amplamente demonstrada em outros autos- disto não temos dúvidas (...) Belo Horizonte, 5 de dezembro de 2012.(CASO 8, autos 0518.11.005690-1).
Infelizmente, passados mais de dois anos, nada foi investigado sobre a Organização Criminosa, que como visto, ainda pode estar atuando em Poços de Caldas. Remeti o citado ofício, a pedido, ao Corregedor Geral de Polícia, que nada fez, simplesmente representou este magistrado (já arquivada).
Também providencio a juntada de cópias de todos os ofícios e e-mails que enviei, e as respostas recebidas, vide apenso 6, sobre as providências mencionadas ao final da sentença do CASO ZERO/PAVESI. Ainda infelizmente, nenhum resultado prático adveio, não se instauraram novas investigações, o então deputado MOSCONI seguiu incólume, como sempre, e as auditorias pedidas não foram instauradas. As agressões físicas à viúva do administrador possivelmente assassinado, relatadas até para o MPE, não resultaram em nenhuma providência ou nova investigação.
Ao que parece, o que atingiu mesmo o então deputado MOSCONI foi a reportagem publicada na Revista Carta Capital em 21/7/14, “Cerco à Máfia dos Transplantes atinge deputado do PSDB” , tanto que o nobre parlamentar procurou adquirir todos os exemplares da revista na cidade e na região, inclusive no vizinho estado de São Paulo. Não deve ter tido total êxito.
Em 25/7/14, a mesma revista publica em seu sítio, uma entrevista com este magistrado: “Juiz cita intimidações durante o julgamento”, como forma de desmentir a nota emitida pelo então deputado, sem nenhuma veracidade. Agora o rei estava mesmo nu e nada poderia ser feito em contrário. Mas não fiquei imune a divulgação das verdades dos casos de transplantes. A minha escolta foi retirada, sem dó ou piedade. Meu filho de pouco mais de três meses de vida, quase ficou sem o leite da mãe. Minha filha mais velha (5 anos recém-completados) passou a sofrer constantes ataques de pessoas desequilibradas e sem nada a perder, a soldo de covardes sem nome.
Mas já havia entornado o caldo, “Máfia” não leva mesmo desaforo para casa e o julgamento previsto para o final do mês de julho, mesmo com toda a preparação realmente não teve condições de ser realizado em Poços de Caldas, a bucólica estância de velhinhos e aposentados . A filha e a mulher do juiz precisavam pagar o preço. Nenhum juiz isento do mundo conseguiria fazer um júri minimamente imparcial nesta cidade. As cartas pareciam marcadas e houve “choro e ranger de dentes” quando a notícia do desaforamento correu. Certamente, ficaram sabendo que haviam exagerado a dose, mais uma vez. Era tudo o que a “Máfia” não queria: o julgamento PAVESI iria para a Capital . O velhinho IANHEZ, coitado, ainda vai chorar muito pela internet, através de seus filmetes cuidadosamente produzidos, seu gorro tipo italiano, mas tudo foi adiado. Porque os habeas corpus somente foram impetrados agora no julgamento de BH e não quando o júri ocorreria em Poços de Caldas? A resposta é simples: porque em Poços os jurados já estavam “industriados” para absolver todos. Em BH, não houve “propaganda” prévia, não se saberia o resultado do julgamento, poderiam ser condenados, ante a imensidade da prova constante nos autos. Por isso, o julgamento foi mais uma vez adiado. Oxalá não haja a prescrição, como já ocorreu com dois dos acusados, seria a coroação da impunidade.
Eu, por tudo que passei, junto com a minha família, já cumpri com a minha obrigação.O nome que herdei, a minha integridade, honra e caráter estão hígidos, como sempre estiveram. Posso deitar no travesseiro e ter o sono dos justos. A minha consciência me tranquiliza, me acalma, afinal, lutei o bom combate, com gente mais forte que eu. Quantas pessoas, nos dias de hoje, podem dizer o mesmo?
Feitos tais registros, por necessário, passo ao item seguinte, que será o único a separar o início da análise das questões meritórias, o que já não é sem tempo.
III- DAS PRELIMINARES
Em primeiro lugar, a existência de exceções de suspeição ainda pendentes de julgamento pelo E. TJMG não impede o julgamento da presente ação, não havendo efeito suspensivo. Ademais, a jurisprudência da Corte já se firmou pelo afastamento das exceções, nos casos já julgados, ante a correta atuação do juízo.De idêntico modo, a manifestação do Tribunal por ocasião do julgamento da apelação do Caso 1. Qualquer mudança em relação a isso nesta quadra, seria de se estranhar e seria relacionado a contraofensiva dos transplantadores/réus em todos os níveis, o que já vem me atingindo.
De todo o modo, veja o que asseverou o ilustre Procurador de Justiça Luiz Alberto Guimarães, em processo conexo:
Ademais, registre-se en passant que a alegação de imparcialidade do Magistrado constitui, não raras vezes, estratégia de que se serve a Defesa, sobretudo em processos de elevada repercussão social, como in casu inegavelmente se tem, na vã tentativa de impor intranquilidade de toda sorte de pressão psicológica àquele a quem incumbe zelar pelo regular andamento do feito e decidir a causa que lhe é submetida, segundo seu livre e motivado convencimento. (pgs. 15 e 16, parecer autos n. 1.0518.13.001937-6/001, vide apenso 6).
O feito tramitou regularmente na fase judicial e não comporta nenhuma nulidade a ser escoimada. Os fatos e as condutas dos agentes são típicas, antijurídicas e culpáveis, não militando nenhuma excludente de ilicitude ou de culpabilidade a favor dos réus, sendo as condenações de rigor, conforme se demonstrará. “Não há mesmo clima” para a absolvição, na forma como pretendem as dignas Defesas, como diria o erudito Desembargador Walter Luiz de Melo, meu colega de Mesa Amarela .
Vou analisar e reanalisar todas as preliminares aventadas pelas nobres Defesas, pois várias delas são requentadas e já foram objeto de considerações específicas por parte deste magistrado, além de terem sido também esquadrinhadas em sua grande maioria pelo Órgão Ministerial em suas bem-lançadas alegações finais. Adianto que afastarei uma a uma, mesmo que algumas delas se confundam com o mérito e ali será definitivamente espancada.
A ilustre Defesa da ré ALESSANDRA em seus memoriais (fls. 1842/1860 do vol. 7) desistiu das preliminares que havia arguido na defesa preliminar (todas devidamente afastados na decisão interlocutória de fls. 1185/1189, bem como durante a AIJ às fls. 1351 e seguintes): inépcia formal e material da denúncia (além da prescrição, no caso de desclassificação do delito).
A 1a preliminar do réu JOSÉ JÚLIO à f. 2171, de nulidade por negativa de acesso à prova produzida durante a fase instrutória, não se sustenta.Não se trata de matéria incontroversa, pois não existe controvérsia. Conforme se viu no relatório, a gravação da audiência somente se deu para “dirimir qualquer questão ocorrida no decorrer da mesma” (f. 3). Continuando: “foi indeferida juntada de mídias, pois a finalidade das gravações foi dirimir dúvidas, caso existentes, durante a própria audiência” (f.4, grifo no original). Logo, se não houve nenhuma dúvida, durante a audiência, não há que se falar em juntada ou acessoa a nenhuma mídia. A questão foi ultrapassada na própria AIJ, os advogados não fizeram nenhum protesto e assinaram as atas. Não houve a demostração de prejuízo, não houve nenhuma interpretação equivocada, cada parte interpreta como quer. O TJMG ainda não autorizou a gravação audiovisual das audiências. Veja o que afirmou o MP:
“Todavia, o caso ora em exame, o meio audiovisual não foi o escolhido para registro do ato processual. (…). A gravação da audiência, feita às pressas, com a utilização de aparelho amador, e sem a finalidade de registrar a realização do ato processual de coleta de provas orais, teve o propósito único de evitar discussões e questionamentos quanto a perguntas que estavam a ser realizadas pelos atores do processo. Inaugurada alguma dúvida a respeito de perguntas feitas ou respostas dadas, as partes poderiam, então, pedir a reprodução do que fora dito. (…) Justamente por isso, todos os depoimentos prestados foram tomados a termo, e assinados pelas partes sem questionamento. (...)” (fls. 2163/2164).
Fica tal preliminar de nulidade afastada, despiciendas maiores considerações, mesmo porque os autos e tudo que neles contêm ficaram todo o tempo à disposição das partes (inclusive o réu JOSÉ JÚLIO somente apresentou seus memoriais 143 dias após a abertura do prazo).
Da 1ª preliminar da ilustre Defesa do réu JEFERSON SKULSKI à f. 1959, vol.7, de necessidade de suspensão do processo, prevenção equivocada, incompetência do juízo, pendência de exceção de suspeição, dos réus CLÁUDIO ROGÉRIO e JOÃO ALBERTO, fls. 2021 e 2042, de incompetência absoluta da justiça estadual, bem como do réu PAULO CÉSAR à f. 1917, de inexistência de conexão. Não prosperam tais argumentos. Já tratei da questão da conexão dos processos da Máfia por ocasião dos “pressupostos” (f. 16, desta), citando manifestação ministerial no CASO 2, que reafirmou o mesmo modus operandi da quadrilha em todos os casos . É para lá que se remete. Disse o MP, em pequeno trecho agora extraído: “Nesse sentido, por meio de análise conjunta de todos os casos, comprovou-se que o recorrente era integrante de uma organização criminosa que se denominou posteriormente de 'Máfia dos Transplantes de Órgãos'” (contrarrazões ao RSE, CASO 2). Não existe a possibilidade do processo ser suspenso. A exceção de suspeição, quando negada pelo juiz, (caso dos autos), não suspende o processo. A alegação de que o juiz se afastou de um dos processos da chamada Máfia dos Transplantes nada reflete, pois derivada de foro íntimo e tão somente em relação a uma das corrés, Francisca Raimunda (CASO 7). A questão da correta prevenção do juízo foi bem explanada pelo órgão ministerial em seus memoriais à f. 1698, para onde se remete, pedindo vênia para fazer daquelas minhas considerações, in verbis pequeno trecho:
Ora, os presentes autos, assim como os demais a ele relacionados, que tramitam perante a 1a Vara Criminal de Poços de Caldas, decorreram de investigações realizadas a partir do denominado Caso Zero ou Caso Pavesi (autos n. 08148802-6) e da Auditoria operada pelos órgãos da DENASUS, VISA e ANVISA. Nessas investigações, foram constatadas casos suspeitos envolvendo os transplantes de órgãos realizados na Santa Casa de Misericórdia de Poços de Caldas.
Portanto, se trata, data vênia, de mero sofisma a afirmação sobre o juiz natural, pois esse é mesmo o juízo da 1a Vara Criminal de Poços de Caldas. A conexão entre os casos é evidente e houve formal recomendação da CPI do Tráfico de Órgãos para o julgamento conjunto, que não foi possível na prática. A alegação de ausência de justa causa para a ação penal também não sobrevive a uma análise por mais perfunctória que seja. No caso em análise, todos os réus, originários e os atuais, agiram em evidente conluio, com a adesão da vontade de uns com as de outros. Portanto, não há se falar em falta de lógica. Como visto na seção antecedente, havia (há) a ação de uma organização criminosa na SANTA CASA, diversos réus trabalhavam (trabalham) em ambos os hospitais, vários casos suspeitos envolvendo transplantes foram investigados (há inclusive condenação, envolvendo dois dos réus desse processo). É fato que uma das vítimas dos casos conexos, a criança P.V.P, chegou viva à SANTA CASA, não foi feita nenhuma arteriografia ali, nem de “mil vasos”, tal fato não está provado nesses autos (bem ao contrário) e a vítima veio a óbito depois que órgãos vitais lhe foram vilmente extirpados. (concurso de agentes).Tanto há justa causa, que o processo prosseguiu e não houve nem ao menos tentativa de se “trancar a ação”, caso fosse procedente o argumento. É certo que a reunião dos feitos perante o mesmo julgador facilitou sobremaneira seu andamento e, principalmente, seu julgamento, ainda que tardio. Como bem asseverou o parquet: “Nota-se que existe relação de tempo, lugar e modo de execução entre os casos envolvendo o tráfico de órgãos naquela Comarca. Inclusive há ´processos em que coincidem os réus (...)”. De acordo com o art. 82 do CPP, todos os processos devem ser julgados pelo mesmo juiz e “como não ocorreu o trânsito em julgado em nenhum dos processos envolvendo a 'Máfia dos Transplantes' todos deverão ser encaminhados ao Juízo da 1a Vara Criminal (...)”. O instituto da facilitação da prova é a razão da existência da conexão, conforme o MP bem explanou. A questão já foi abordada por ocasião da decisão às fls. 1185/1189, (o próprio juízo da 2a Vara remeteu autos para o juízo competente) e ali a questão já havia sido afastada, não se lhe opondo nenhum recurso, portanto, preclusa a questão. O juízo é competente para o julgamento, como vem decidindo brilhantemente o E. TJMG e nenhuma das exceções de suspeição foi acolhida, firme a jurisprudência de todas as Câmaras que analisaram os pedidos das combativas Defesas. É interessante como a Defesa do réu PAULO CÉSAR cita o R. Acórdão do CASO 1, somente na parte que acha que lhe aproveita. Naquela oportunidade, as Defesas dos réus queriam que todos os casos fossem julgados em conjunto, sobrestando o julgamento do CASO 1. Disse o ilustre Relator, rebatendo os argumentos:
Não bastasse, a unidade processual acarretaria, na presente hipótese, ofensa ao princípio da celeridade processual (art. 5o, inc. LXXVIII, CF) bem como daria ensejo à ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal em relação aos outros delitos, à semelhança do reconhecimento em relação aos réus Félix e Gérsio. A propósito, prevê o art. 80 do Código de Processo Penal que “será facultativa a separação dos processos quando as infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e para não lhes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente a separação”.
Portanto, a reunião ou não dos processos para julgamento fica ao prudente arbítrio do juiz, ou, em outras palavras, pela conveniência e oportunidade do bom andamento processual (celeridade). Aqui, havia a recomendação da CPI para o julgamento simultâneo, (vide apenso 4) mas, na prática, ficou inviável, como bem observou o TJMG, pelo grande número de réus. Mas tal circunstância não indica não haver a conexão entre os fatos, todos oriundos de investigação derivada do CASO ZERO. Mesmo que não houvesse a conexão, o próprio juízo da 2a Vara Criminal remeteu os inquéritos ali distribuídos (dois) ligados à Máfia dos Transplantes para a 1a Vara, inclusive o inquérito policial que investiga a morte de Carlos Henrique Marcondes denotando que não houve a ofensa ao juiz natural. E caso não haja a conexão com o CASO 1 (autos n. 0187195-46.2010.8.13.0518), citado pela Defesa, não impediria a distribuição por dependência, a pedido do juízo da 2a Vara Criminal ou por ofício à Justiça Federal, pois o STJ declinou a competência para a Justiça Comum Estadual.Veja a conclusão do Procurador de Justiça Luiz Alberto, já citada:
Insta consignar que, ao contrário do que diz a Defesa (…), não há indevida interferência da decisão do denominado “Caso 1” no julgamento deste processo, pois é evidente que os casos estão interligados, sendo certo que a organização atuou diversas vezes com o mesmo modus operandi. O fato de S. não ser réu naquele processo é irrelevante, pois a conclusão de que existia uma organização criminosa é inafastável (...)” (pgs. 38/39, autos n. 1.0518.13.001937-6/001, vide apenso 6, negritei.)
Portanto, não procede a preliminar. Também incabível a alegação de que seria a Justiça Federal a competente para julgar o presente processo, como alegado pela Defesa dos réus CLÁUDIO ROGÉRIO e JOÃO ALBERTO, questão já decidida por Tribunal Superior. Fica afastada a 1a preliminar por tais argumentos, sendo desnecessários outros.
Da 2a preliminar da Defesa de JEFERSON SKULSKI à f. 1961 e de PAULO CÉSAR à f. 1906, do réu CLÁUDIO ROGÉRIO e do réu JOÃO, fls. 2026 e 2049, réu JOSÉ JÚLIO à f. 2082 de “cerceamento de defesa” pela não realização de nova prova pericial e suposto indeferimento de perguntas às testemunhas de defesa. Da mesma forma, improcede tal preliminar. A questão da prova pericial foi bem analisada pelo MP em seus memoriais finais às fls. 1696/1698, e concordo com o que foi ali explanado, pedindo vênia para que conste expressamente desta decisão. A questão também já foi afastada previamente pela decisão às fls. 1185/1189,datada de 15.5.14, bem como por ocasião da AIJ, fls. 1407/1408 em 10.7.14. O laudo constante nos autos, fls. 3/54, apenso 3, não foi feito pela Acusação e sim em regular procedimento investigatório. Assim, não há que se falar em quebra de paridade. Este e os demais laudos periciais já acostados aos autos estão sim aptos a embasar as graves acusações constantes dos autos. Não há necessidade de uma perícia especial para o réu JEFERSON SKULSKI, já havendo os laudos n. 622/2006, 1581/2007 e 1935/2010, este último analisou especificamente o suposto exame de angiografia bilateral que teria sido feita pelo réu JEFERSON SKULSKI na vítima. Se depender da culta e douta Defesa ficaríamos fazendo exames periciais até os dias de hoje e o processo nunca seria julgado! Veja que já foram feitos exames nos anos de 2006, 2007 e 2010 e o fato é de 2001, especificamente de 16/1/2001, ou seja, de mais de quatorze anos atrás. Então não se trata de cerceamento e sim de “excesso” de defesa ou abuso de direito. Ninguém está dizendo que a angiografia ou arteriografia comprova por si só a morte encefálica ou que não é um exame COMPLEMENTAR. A questão avança no mérito e ali será melhor apreciada, inclusive para responder ao questionamento da Defesa “se o conteúdo do exame realizado pelo acusado era suficiente ou não para subsidiar um diagnóstico de morte cerebral, junto com os outros elementos constantes do protocolo”. Exame realizado, digo, supostamente realizado e morte cerebral, trocaria por morte encefálica, por rigor científico e pelo que consta dos autos. O juízo não está adstrito a nenhum laudo e, como bem disse a Defesa, é o destinatário das provas. Não se aceita a afirmação de “perigosa intersubjetividade sugerida pelo Magistrado” para “justificar” a conexão, que evidenciaria “seu prévio juízo de valor”. Como visto, uma coisa não tem nada a ver com a outra. A conexão é demonstrada por outros fatos, fatos estes objetivos e de acordo com a lei processual penal em vigor e não pela vontade do juiz. A menos que se refira à vontade do ilustre juiz da 2a Vara Criminal à época que remeteu, sponte sua, os autos à 1a Vara Criminal. As supostas questões que teriam sido indeferidas pelo juízo deprecado de Campinas, dirigidas a professores da UNICAMP, só denotam o caráter procrastinatório de tais requerimentos, não imprescindíveis ao deslinde do feito e que tal entendimento não é esposado apenas por este juízo, mas também por outros. A confirmar a ampla defesa à disposição dos réus de deferiu nova ouvida dos peritos a um dos réus e mesmo depois da não apresentação de novos quesitos, foi deferida nova oportunidade. Também a evidenciar a ampla defesa, sob contraditório, foi deferida a todo tempo a juntada de material doutrinário, documentos e literatura específica médica. Ficou clara a confusão, por parte de algumas das Defesas, dos conceitos de prova pericial e prova documental. Pretendia-se demonstrar o que era o exame de angiografia, não havendo nenhuma dúvida quanto a este ponto, nem que era ou não um “padrão ouro”, conforme se discutiu em caso conexo. A questão da prova pericial ficou afastada também pelo julgamento pelo E. TJMG do CASO 1. As diferenças nos documentos “critério recomendado” do MG-SUL TRANSPLANTES do “Termo de declaração de morte encefálica” previsto na Res. 1480/1997 prescinde de perícia. Nenhum exame provaria que a vítima “morrera de causas naturais”, a menos que não fosse idôneo. O que a douta Defesa gostaria é de uma “declaração médica” absolvendo os réus, todos médicos. Mas esta é a tarefa da Justiça. A produção de provas é tarefa das partes. Sobre a prova pericial, indeferida por ocasião do julgamento do CASO PAVESI, assim me manifestei naquela oportunidade:
A 2ª preliminar à f. 4396, do suposto cerceamento de defesa ante o indeferimento da prova pericial também foi alegada pela Defesa dos réus CELSO e CLÁUDIO no item 1.3 à f. 4471, sendo, portanto, analisadas em conjunto, inclusive o requerimento foi formulado em CONJUNTO pelas Defesas, como se vê da Ata da Audiência à f. 4105 do vol.16. A justificativa apresentada pelos ilustres advogados foi de que como foram utilizados termos técnicos, incluindo a menção sobre “arteriografia de quatro vasos” , seria supostamente necessária tal perícia por parte de assistente técnico, acrescendo a Defesa dos dois réus, que tal prova havia sido requerida por ocasião da resposta preliminar. Afasto a 2ª preliminar, pois manifestamente improcedente, deixando de repetir o que já foi expendido na decisão às fls. 4106/4107 por ocasião da AIJ no dia 1.8.13, nos termos do previsto nos art. 403 e 404 do CPP, que fica fazendo parte da presente fundamentação. Tal prova não se me afigura imprescindível, pois não há nenhuma dúvida do que seja “arteriografia de quatro vasos”, já tão bem explicada por REGINA CIOFFI apenso1-I já citado na seção anterior. De todo modo, a Defesa poderia, como fez, juntar excertos sobre o tema, como procedeu relativamente ao sistema de avaliação ASA e outros temas. Como bem asseverou o parquet “quer me parecer que as defesas dos réus confundem o conceito de prova pericial com prova documental”. Para haver a nomeação de assistentes técnicos pelo juiz, deve haver a prova pericial produzida por perito do juízo, o que inexiste no caso. O caso não seria este e sim, se foi ou não feita tal arteriografia no interior da SANTA CASA, matéria de mérito e que no momento oportuno será analisada em detalhes. Há fundadas dúvidas de que tenha sido feito mesmo tal exame, pois, como visto, não estava presente quando da realização da auditoria n. 33/00, da mesma forma que seu laudo. Este, o laudo, como comprovado, foi feito 8 meses após e “plantado” nos autos. Além disso, em se tratando de exame complementar, não poderia ter sido realizado, pois o exame clínico que o antecedeu não poderia ter sido feito, se fosse respeitada a Resolução n. 1480/97 do CFM, bem como a legislação atinente à espécie, que diz que deveria ter sido INTERROMPIDO o protocolo de morte encefálica havendo resposta sim para hipotermia ou uso de depressores do SNC, fora as demais irregularidades constatadas pelos médicos auditores, ouvidos em juízo. A vítima chegou VIVA à SANTA CASA, pois a arteriografia feita anteriormente acusou contraste e o exame clínico foi mascarado pelos medicamentos, estando a mesma massivamente sedada e ainda recebeu anestesia. Então foi feita uma tentativa de se legalizar ou formalizar o exame de arteriografia na SANTA CASA para justificar a remoção dos órgãos, tanto que o réu CELSO escreveu “SEM ME” e o réu SÉRGIO aplicou anestesia geral e a classificou como ASA V, “paciente moribundo com perspectiva de óbito em 24h”. Não poderia, então, a suposta arteriografia de quatro vasos, “padrão ouro” tão a gosto da Defesa, provar que a vítima estava morta ou em “morte encefálica”, se as demais contundentes provas estão a provar o contrário. Ademais, o juiz não fica adstrito a nenhum laudo no momento de julgar, aplicando-se no direito brasileiro os princípios do livre convencimento motivado, onde o juiz julga com o que está nos autos e sua consciência e da verdade real. Este magistrado NUNCA VIU as chapas de tal arteriografia de quatro vasos nos autos que estão no TJMG/STJ e nem nesses autos. O “Mister M” que as fez aparecer (vários anos depois) deve tê-la feito desaparecer depois (e convenientemente pois não resistiria a uma comparação às radiografias do crânio da vítima feitas por ocasião da exumação, que certamente seriam por mim determinadas e por um perito de confiança do juízo). Assim, a pretensão defensiva não foi indeferida “incrivelmente”, mas com forte e contundente motivação e fundamentação nos autos, até mesmo porque tal arteriografia de quatro vasos nunca foi realmente realizada, existindo tão somente nas mentes dos criminosos.
Também improcedente a 2ª preliminar, ainda mais requentada e bem explicada, ainda que avance de certa forma em matéria de fundo, despiciendas maiores considerações nesta fase.
Cabe ao MP provar o dolo dos réus e não às Defesas as suas inocências. Como se verá no exame do mérito, desse ônus bem se desincumbiu o MP. De mais a mais, a Defesa teve oportunidade até de fazer juntar “perícia particular” aos autos, o que enterra, de vez, a pretensão de querer paralisar o julgamento com a tão surrada quanto clássica alegação de “cerceamento de defesa”. Afasto, pois, a 2a preliminar.
A 1a preliminar do réu PAULO CÉSAR à f. 1904, do réu JOSÉ JÚLIO de renovação de interrogatório, não procede, bem como a dos réus CLÁUDIO ROGÉRIO e JOÃO, às fls. 2028 e 2050, da realização dos interrogatórios antes do retorno das precatórias. Não foram produzidas “novas provas” após o encerramento da instrução processual. O suposto contato entre familiares do acusado JOSÉ JULIO e da vítima foi examinado pelo MPE sob o contexto de suposta ameaça e nada foi apurado que pudesse modificar o status libertatis do réu naquele momento. Seria muito estranho que a ex-mulher do acusado fosse fazer perguntas. Porque a ex e não a atual. Pura armação para prejudicar o acusado JOSÉ JÚLIO. Nada mais, como a própria Defesa reconhece: documentos “singelos”. A questão do art. 222 do CPP já foi devidamente analisada por ocasião da AIJ, bem como no julgamento da apelação do CASO 1, sendo idênticas as questões. Também se recomenda a leitura do parecer de lavra do eminente Procurador de Justiça Luiz Alberto de Almeida Magalhães, já citado, e constante no apenso 6, pois ali se debateu e afastou todas as preliminares aqui novamente agitadas, todas repetidas nos casos conexos.
Transcrevo, por cabível, o que manifestei por ocasião do julgamento do Caso Pavesi:
O art. 196 do CPP concede ao magistrado a faculdade de realizar novo interrogatório, mas tal não é obrigatório, tanto que foi utilizado pelo legislador o verbo “PODERÁ” e não, “DEVERÁ”, se tratando, data vênia, de “mera faculdade processual”. A propósito, segue decisão recente da mais alta Corte do país, o Excelso STF, de lavra do culto Ministro decano, Celso de Melo, inclusive citando precedente do E. TJMG:
DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão que, emanada do E. Superior Tribunal de Justiça, acha-se assim ementada:
“RECURSO ESPECIAL. PENAL. RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. INTERROGATÓRIO DO RÉU REALIZADO ANTES DE JUNTADA DA CARTA PRECATÓRIA PARA A OITIVA DE TESTEMUNHA. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE SUSPENSÃO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. NULIDADE NÃO COMPROVADA.
1. O art. 222 do Código de Processo Penal assenta que a expedição de carta precatória não suspende a instrução criminal, podendo realizar-se o julgamento após o transcurso do prazo marcado para seu cumprimento, juntando-se a precatória aos autos quando devolvi da. Dessarte, se o próprio julgamento de mérito não depende do retorno das cartas precatórias, não se pode entender que o interrogatório do réu depende.
2. O moderno sistema processual penal exige, para o reconhecimento de nulidade, a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício, vigorando a máxima ‘pas de nullité sans grief’, a teor do que dispõe o art. 563 do Código de Processo Penal, o que não se verificou na espécie.
3. Recurso especial a que se nega seguimento.”
(REsp 1.383.791/MG, Rel. Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE – grifei)
Busca-se, desse modo, a concessão de medida cautelar, “(...) consistente na expedição do alvará de soltura, até o julgamento final do presente ‘writ’ (...)”.
A parte ora impetrante alega, em síntese, para justificar sua pretensão, o que se segue:
“Conforme se infere do texto do artigo, às fls. 236, a defesa do mesmo pugnou perante o Juiz da 2ª Vara criminal da Comarca de Alfenas – MG, requerendo a tempo e hora que, ‘com a devolução da citada Carta Precatória relativa à oitiva da última testemunha do processo, requer seja realizado o seu interrogatório’.
Porém, tal fato foi indeferido, em razão da alegação do MM. Juiz, de que já houvera realiza do o interrogatório do réu, fls. 218, do processo anexo.
…..................................................................................................
Ora, o ‘devido processo legal’ não foi observado na medida em que não se respeitou o artigo 400, do Código de Processo Penal, o que estabelece que o interrogatório do acusado deve ser o último ato da instrução criminal.”
Sendo esse o contexto, passo a apreciar o pedido de medida liminar. E, ao fazê-lo, em tendo que o exame dos fundamentos em que se apoia a presente impetração parece descaracterizar – ao menos em juízo de estrita delibação – a plausibilidade jurídica da pretensão cautelar deduzida nesta sede processual.
Tenho salientado, nesta Corte (HC 85.796/PR), que, não obstante a norma inscrita nos §§ 1º e 2º do art. 222 do CPP, de um lado, e a jurisprudência dos Tribunais em geral (RT 582/390 – RT 600/366), inclusive a desta Suprema Corte (RT 552/445), de outro, cumpre resguardar, em sua plenitude, a integridade da garantia constitucional inerente ao “due process”, em cujo alcance concreto compreende-se o direito do réu de ver assegurada a possibilidade de produzir, dentre outros elementos de convicção, prova testemunhal em favor de sua defesa penal.
Ao fazer tal observação, tenho presente lapidar advertência constante do v. acórdão emanado do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em passagem que vale transcrever, ante o seu indiscutível acerto:
“(...) CONFLITO ENTRE NORMA PROCESSUAL PENAL E NORMA CONSTITUCIONAL.
É evidente o cerceamento de defesa do apelante, pois nem norma processual penal expressa, como a dos §§ 1º e 2º do art. 222 do CPP, pode sobrepor-se ao princípio cons titucional da amplitude da defesa, ainda que em nome da celeridade da instrução do processo de réu preso. Provimento de recurso. Decretação de nulidade do processo. Unânime.” (RJTJERGS 151/155, Rel. Des. NILO WOLFF – grifei)
O direito à prova – tal como assinala o magistério da doutrina (ANTONIO MAGALHÃES GOMES FILHO, “Direito à prova no processo penal”, 1997, RT; ROGÉRIO LAURIA TUCCI, “Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 196/209, itens 7.4 e 7.5, 2ª ed., 2004, RT; ROGÉRIO SCHIETTI MACHADO CRUZ, “Garantias Processuais nos Recurso Criminais”, p. 128/129, item 2, 2002, Atlas) – traduz momento de expressiva concreção da garantia constitucional da plenitude de defesa e do contraditório.
O exame dos autos, no entanto, parece evidenciar, ao menos para efeito de juízo delibatório, que não se revelaria presente a existência do alegado prejuízo ao direito de defesa do ora paciente, eis que as cartas precatórias foram devolvidas, em tempo oportuno, ao juízo sentenciante, antes, portanto, da realização de diligências suplementares, de “alegações finais (memoriais)” e da própria sentença.
É preciso ter presente, neste ponto, que a disciplina normativa das nulidades, no sistema jurídico brasileiro, rege-se pelo princípio segundo o qual “Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa” (CPP, art. 563 – grifei).
Vale transcrever, no ponto, por oportuno, trecho do voto proferido pelo eminente Desembargador EDUARDO BRUM, do E. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, no julgamento do Recurso de Apelação nº 1.0016.05.044028-4/001, interposto pelo ora paciente:
“Outrossim, constata-se que a defesa técnica do réu se fez presente na referida audiência para oitiva de testemunha deprecada (fls. 229/230), bem como que o conteúdo da prova em questão foi trazido aos autos antes mesmo das alegações finais defensivas, que somente foram apresentadas às fls. 246/263, o que demonstra ausência de prejuízo, pois o com bativo defensor teve amplo espaço para debater referido aspecto de convencimento (depoi mento da testemunha de defesa Mauro Pedro Braga).
Por fim, por mais que, de acordo com o art. 196 do CPP, o magistrado possa realizar novo interrogatório do réu a qualquer tempo com base no princípio da verdade material, tal providência é facultativa, ficando a critério do juiz. E, ‘in casu’, o MM. Juiz ‘a quo’ entendeu não haver necessidade de tal ato, até porque, quando do indeferimento do pedido de adiamento do interrogatório do réu, já havia se manifestado fundamentadamen te: (…).” (grifei)
Tem razão esse eminente magistrado quando acentua que a realização de novo interrogatório do réu, sobre constituir medida excepcional, traduz mera faculdade processual outorgada pelo ordenamento positivo ao juiz responsável pela direção do processo penal de conhecimento.
Esse entendimento, além de encontrar suporte no magistério da doutrina (EUGÊNIO PACELLI DE OLIVEIRA e DOUGLAS FISCHER, “Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência”, p. 409/410, item n. 196.2, 5ª ed., 2013, Editora Atlas, v.g.), tem o beneplácito da jurisprudência dos Tribunais em geral (RT 811/562 – RT 796/593), notada mente a deste Supremo Tribunal Federal (HC 35.270/RJ – HC 90.830/BA – HC 91.292/PR).
Impende destacar, ainda, que o interrogatório judicial do ora paciente foi realizado como último ato da instrução probatória, não obstante ocorrido em momento que precedeu a devolução, devidamente cumprida, de apenas uma das cartas precatórias que haviam sido expedidas.
De qualquer maneira, no entanto, as cartas precatórias foram devolvidas, todas elas, antes da fase pré-final do processo penal de conhecimento a que se referem os arts. 403 e 404 do CPP, na redação dada pela Lei nº 11.719/2008.
Em suma: a análise destes autos, desse modo, parece não evidenciar, no processo penal de conhecimento em questão, a ocorrência de qualquer prejuízo para o ora paciente, que, tal como já enfatizado, exerceu, em plenitude, as prerrogativas inerentes ao direito de defesa. Impõe-se ter presente, por necessário, que esse postulado básico – “pas de nullité sans grief” – tem por finalidade rejeitar o excesso de formalismo, desde que eventual preterição de determinada providência legal (circunstância que parece não haver ocorrido na espécie) não tenha causado prejuízo para qualquer das partes (RT 567/398 – RT 570/388 – RT 603/311).
Cumpre assinalar, por relevante, que o deferimento da medida liminar, resultante do concreto exercício do poder cautelar geral outorgado aos juízes e Tribunais, somente se justifica em face de situações que se ajustem aos seus específicos pressupostos: a existência de plausibilidade jurídica (“fumus boni juris”), de um lado, e a possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação (“periculum in mora”), de outro.
Sem que concorram esses dois requisitos – que são necessários, essenciais e cumulativos , não se legitima a concessão da medida liminar.
Sendo assim, e sem prejuízo de ulterior reapreciação da matéria, quando do julgamento final do presente “writ” constitucional, indefiro o pedido de medida liminar.
2. Ouça-se a douta Procuradoria-Geral da República.
Publique-se.
Brasília, 08 de outubro de 2013.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
Fica, portanto, afastada a 1ª preliminar desta Defesa.
A 2a preliminar do réu PAULO CÉSAR à f. 1908, de nulidade por inobservância das garantias constitucionais do acusado, também não procede. A presença da Imprensa na Sala de Audiência derivou de um imperativo: o abuso, por parte de alguns defensores, inclusive de parte da Defesa do réu PAULO CÉSAR, que antes do início da audiência mandou que o réu se afastasse para causar o seu adiamento (f.1351). A gravação da audiência foi parte de um acordo, com a concordância de algumas das Defesas e foi necessária para se evitar futuras alegações de cerceamento e para se poder comprovar o que realmente ali aconteceu. Em caso conexo, houve explícita ameaça a testemunha por parte de réu, o que se procurou evitar, com as razões às fls. 1351/1352, após ouvir o fiscal da lei, o MP, não havendo que se falar em “escândalo, inconveniente grave ou perigo de perturbação da ordem”, sendo os fatos notórios e públicos. A mesma opinião foi manifestada pelo parquet à f. 1702, memoriais finais. Não se olvide que, pelo país, julgamentos até pelo Tribunal do Júri foram transmitidos “ao vivo”, sem falar no notório julgamento da AP n. 470 pelo Excelso STF. Os acusados foram devidamente preservados no decorrer do processo, inclusive por sugestão do próprio MP. Sem razão esta 2a preliminar.
A 3a preliminar do réu PAULO CÉSAR, f.1911 e do réu JOSÉ JULIO à f. 2078, de inépcia da peça acusatória: não prospera tal proemial, pois o MP formulou a denúncia atento aos requisitos do art. 41 do CPP, descrevendo a conduta da increpada, bem como dos demais réus e não “genericamente”, como mencionado. Os demais pormenores da atuação dos réus restaram esclarecidos por ocasião da instrução probatória. O nexo entre a conduta, a acusada e o resultado foram explicitados na inicial, denotando a justa causa para a denúncia, podendo ser sucinta. Tanto é vero, que todos puderam se defender adequadamente e de maneira bem eficaz. Acresça-se que conforme o julgado do STJ “é apta a deflagrar a ação penal a denúncia que narra pormenorizadamente fato penalmente típico, descrevendo o nexo causal entre a suposta conduta dos pacientes e o evento danoso que lhes foi atribuído” (STJ-HC 102.250/ES- Relator: Ministra Jane Silva- 6ª Turma- DJE de 6.10.08), citada na Apelação Criminal n. 1.0518.09.171306-6/001 julgado em 17.12.13, Relator o culto Desembargador Fortuna Grion. Disse, ainda, textualmente o R. Acórdão citado: “Por oportuno, registro que a alegação de inépcia da denúncia esgota-se com a prolação da sentença, tornando-se preclusa a matéria” e cita nova jurisprudência do E. STJ, agora da lavra da iminente Ministra Laurita Vaz da 5ª Turma. Importa mencionar que a preliminar foi afastada por ocasião da decisão às fls. 1185/1189 do vol. 5, da qual não se manejou nenhum recurso, portanto, preclusa, e também por ocasião da AIJ (fls. 1351 e ss). A denúncia aponta o dolo de cada réu, pormenorizadamente, além da relevância causal de cada conduta e o vínculo subjetivo entre os agentes. Vale a citação do R. Acórdão do CASO 1, que está às fls. 744/774/v, de elegância ímpar por parte do ilustre Relator, Des. Antônio Armando dos Anjos:
Examinando a peça pórtica em confronto com a pretensão preliminar apresentada, forçoso concluir que a mesma não padece do vício apontado, restando devidamente delineada as condutas atribuídas a todos os denunciados, não havendo qualquer ofensa aos princípios constitucionais do contraditório ou da ampla defesa. (…). Deste modo, rejeita-se a preliminar de inépcia da denúncia, até porque tal alegação esgota-se com a prolação da sentença, tornando preclusa a matéria.
Despiciendas, pois, maiores considerações, ficando desde já afastada tal preliminar dos réus. A 4a preliminar do réu PAULO CÉSAR à f. 1921, do réu CLÁUDIO, f. 2023 e do réu JOÃO ALBERTO, f. 2045, de ofensa ao princípio do promotor natural, deve ser afastada, de plano. Estou de acordo com as alegações do MP, sobre o tema, às fls. 1699/1700. Não havendo promotor da comarca que pudesse ou quisesse assumir os processos relacionados aos transplantes de órgãos, o ilustre Procurador-Geral de Justiça nomeou o Coordenador do CAO CRIM de Belo Horizonte. Mais uma vez se recomenda a leitura da peça processual de lavra do Procurador de Justiça Luiz Alberto, apenso 6. Veja o que fiz constar por ocasião da sentença do CASO PAVESI:
O MP é uno e indivisível. Não há atividade de execução, não há ofensa alguma ao promotor de justiça natural. O que não foi natural foi a tentativa da Defesa de alguns dos réus de afastar o juiz da causa, Isso foi feio, muito feio. Promotores do local se declararam suspeitos e o Procurador-Geral de Justiça, dentre as suas atribuições constitucionais indicou um substituto. Ponto. O TJMG provocado no caso conexo já se pronunciou a respeito. Despiciendas maiores considerações, ficando afastada tal preliminar, não havendo nenhuma nulidade a ser escoimada.
A questão foi afastada na AIJ, como se vê à f. 1355, despiciendas maiores considerações, não cabendo o alegado nesta 4a preliminar de Defesa.
Afastadas, pois, todas as proemiais arguidas pelas doutas Defesas, se propiciando, até mesmo pela simples leitura dos autos, especialmente pelas atas da AIJ, que foi garantida a mais ampla defesa, todas as questões suscitadas ali constaram e foram espancadas de dúvidas. NÃO HOUVE PROTESTO das ilustres Defesas por ocasião da lavratura da mesma, concordando com os atos praticados. O juízo permitiu reperguntas pelos réus até mesmo após o momento próprio. Não há que se falar em nenhuma das espécies de prescrição antecipada, virtual ou em perspectiva, por falta de supedâneo legal. Analisadas todas as questões prévias, todas impertinentes, data maxima venia, caso alguma dúvida ainda persista será definitivamente espancada na seção subsequente, na qual se pretende analisar finalmente o mérito da causa, eis que algumas avançaram ao fundo da lide proposta.
IV-DO MÉRITO
O pior de tudo que aqui já se viu e do que já apontei nas sentenças dos casos conexos das vítimas da chamada “Máfia dos Transplantes de Órgãos de Poços de Caldas”, é que a maioria dos réus e o chefe do esquema- segundo apontou o pai da criança Pavesi- continuaram nas práticas criminosas. Reiteraram, inclusive, em outros lugares (Manaus, Unaí, até no exterior, possivelmente). Pior do que isso, insistiram e fizeram questão de reiterar os crimes e ainda, para escárnio da população leiga, se apropriaram de mais de 14 milhões de reais da coletividade, nas “barbas” de todos, “na mão grande”, como diz o populo. Da mesma forma que um traficante de drogas, acha que não faz nada errado. O traficante se vê como um “empresário”, afinal compra droga quem quer. O traficante de órgão, médico ou não, se vê como um “benfeitor”, ganha seu lucro, mas está “ajudando” alguém, de modo geral pessoa com melhor poder aquisitivo, a conseguir seu bem (no caso, um órgão). Se o “doador” (geralmente pessoa pobre e sem instrução), precisa ter a vida abreviada (o “receptor” não pode esperar, há urgência para o órgão não se perder), problema dele. Aliás, morreria mesmo, não há mesmo leitos hospitalares para todos, como clamam as Defesas . Necessária, mais uma vez, a transcrição do que asseverei por ocasião da sentença do CASO PAVESI:
Depois da sentença do CASO 1, vítima JDC, da notícia dos demais oito casos suspeitos descobertos pelas auditorias na SANTA CASA, que só vieram à tona depois das denúncias do caso dos autos (CASO ZERO, vítima criança P.V.P), com a conclusão da CPI DO TRÁFICO DE ÓRGÃOS, com a continuação das investigações sobre a morte do administrador do hospital, com o surgimento de novas testemunhas, com a morte de outra testemunha, com o julgamento dos CASOS DE TAUBATÉ, com as notícias da UTI do Hospital Evangélico de Curitiba: ninguém mais já se surpreende com mais nada. O caso dos autos é muito antigo e aguarda solução há quase 14 anos. Não vamos ser hipócritas e achar que tudo correu bem, que esta demora é normal porque não é. Ninguém deve estar imaginando que o pronunciado ALVARO IANHEZ, por exemplo, receberá ou cumprirá alguma pena, pois em menos de três anos completará 70 anos de idade e ocorrerá a prescrição , como ocorreu com o médico acusado de vários assassinatos de pacientes, o peruano FELIX HERNAN GAMARRA , o famoso “bom para UTI”. E é preciso que se diga, é o mais vil, o mais abjeto, o mais desprezível crime que já julguei nos meus quase vinte anos de magistratura. Se bem que a Máfia de Poços de Caldas que agia (age) dentro dos hospitais, especialmente o da SANTA CASA, acredita (ainda) que está acima da lei. Foi muito difícil para os médicos transplantistas integrantes da Máfia deixar “passar” um potencial doador como a criança PVP, um menino sadio, cheio de vida, no auge de seus 10 anos de idade, com todos os órgãos perfeitos, em uma cidade (Poços de Caldas) onde não ocorrem tantos acidentes ou AVC ou HSA (hemorragia sub aracnóide) para gerar doações. Tudo corria bem, achavam que era mais um paciente pobre, de família com baixa instrução, ainda mais em um feriadão. Corria e correu bem, até que tentaram cobrar também pelo transplante, a ganância foi muita. A partir daí o que se descobriu foi um verdadeiro trailler de horror, como se viu.
Conforme sentença prolatada pela ilustre Juíza Federal Adriane Luísa Vieira Trindade, autos n. 2002.38.00.033566-4, vide apenso 6:
Há que se considerar que Paulo Pavesi pode estar enganado e que todas as provas que diz ter recolhido não passam de sinistras coincidências, todavia, diante de tantas irregularidades, constatadas inclusive pela CPI do Tráfico de Órgãos, é possível que não se esteja diante de mero caso de incompetência médica. (…).
Milita em favor da manutenção da dúvida o fato de que vários episódios intrigantes cercaram a morte do filho do acusado. Consta que um dos médicos teria aplicado anesteria geral no menino já morto. Outro, embora tenha prescrito no prontuário paciente sem morte encefálica, afirma que escreve com morte encefálica. Esses médicos foram indiciados pela CPI do Tráfico de Órgãos, porem não foram denunciados pelo MPF. Outro fato inexplicável diz respeito à morte de Carlos Henrique Marcondes, administrador da Santa Casa (…).
A sequência de irregularidades que cercaram a morte de seu filho e a gravidade dos fatos que se seguiram, sem, até hoje, qualquer resposta do Poder Judiciário, tem sido motivo suficiente para o denunciado acreditar que as autoridades responsáveis pelo caso estão no mínimo omissas, se não coniventes. (…);
Vê-se, portanto, que bem antes da sentença do Caso Pavesi, de tudo que ali ficou provado, outro magistrado já constatava as graves irregularidades praticadas pelos médicos, principalmente os transplantadores. O segundo processo do CASO PAVESI, de competência do Tribunal do Júri está sendo julgado em Belo Horizonte quase ao mesmo tempo que esse CASO 5 . O Caso 5 guarda muitas semelhanças com o Caso Pavesi, bem como os demais sete casos, como alertaram os membros da CPI DO TRÁFICO DE ÓRGÃOS nos idos de 2004, vide apensos 4 e 5. Aqui, como ali, acusadores viraram testemunhas, testemunhas viraram réus e até o juiz foi acusado. Nada importa. O que importa são os réus ficarem livres, leves e soltos e isso eles vem conseguindo. Afinal, são médicos, pessoas da sociedade, gente bem e acima de qualquer suspeita. A questão é, se somente por isso, são diferentes ou menos iguais que os demais cidadãos, regidos por uma Constituição que declara de modo diverso a esse e de forma expressa que todos são iguais perante a lei. Em casos como o antigo “mensalão” ou da atual Lava-jato, tudo pode ser divulgado, a publicidade é a regra . Aqui, se o juiz cumpre o disposto na lei processual penal, manda publicar uma sentença em um jornaleco da cidade, é penalizado, está desconforme com a ética. O médico que mata para retirar órgãos de pessoa ainda viva, não pratica nem mesmo uma infração ao seu código de ética , de acordo com os seus conselhos profissionais, da época da ditadura Vargas, vide apenso 6.O advogado não cumpre seus prazos e fica por isso mesmo, agiu com ética, segundo seu órgão de classe (pelo menos não se sabe de nenhum que tenha sido punido). Inversão de valores? Sinal dos tempos? O médico radicado em Poços de Caldas se acha acima da lei ou que só pode ser julgado por seus pares. Será? Vamos ver se há ou não há mesmo juízes em Berlim, BH ou em Brasília. Mas, como se diz, a luz é mesmo insuportável à má consciência, quem não deve, não teme, não ficará pedra sobre pedra. Até o reino mineral tomará conhecimento que, no depender deste pobre juiz do interior, a justiça será feita, ainda que tardiamente. O que acontecer depois daqui não é da minha alçada.
IV-1 DA MATERIALIDADE
A materialidade do delito está consubstanciada no IPL n. 156/2002, pelos documentos juntados aos autos, Relatório de Auditoria n.3/2002 às fls. 9/41, cópia do prontuário médico da vítima às fls. 1/68 do apenso 1, cópia da certidão de óbito da vítima à f. 70, laudo pericial fls. 2/54 do apenso 2 e fls. 337/350, pelo Relatório da CPI do Tráfico de Órgãos, de fls. 1/244, apenso 4, pelas notas taquigráficas da CPI no apenso 5, em sete volumes, demais documentos e depoimentos juntados aos autos que comprovam que a vítima teve seus órgãos retirados pelos réus para fins de transplante, mas sabiam os réus, CLÁUDIO, JEFERSON, JOÃO E PAULO CÉSAR, que a mesma estava viva, causando-lhe, assim, a morte.
IV-2 DA AUTORIA CRIMINOSA
As autorias, por parte dos réus supracitados, restaram ampla e cabalmente demonstrada, sendo a condenação de rigor, conforme requerido pelo RMP, que bem se desincumbiu de sua tarefa, malgrado todos os desesperados esforços das ilustres Defesas. Não milita a favor deles, como já explicitada, nenhuma excludente de ilicitude ou de culpabilidade que isentasse os réus das penas, sendo todos plenamente imputáveis e os fatos narrados são típicos, ilícitos e culpáveis. Senão, vejamos.
As provas dos autos estão muito além das provas indiciárias, que além de tudo são também importantes no acervo probatório para o convencimento do juiz (STF in HC n.70344-rj, 2ª Turma, Rel. Min. PAULO BROSSARD, DJU de 22.10.1993). Nunca é demais lembrar ser o juiz o escoadouro, o natural destinatário das provas produzidas em juízo.
Os réus, se defendendo de forma simétrica ou paralela, à exceção da ré Alessandra e do réu José Júlio, dizem-se inocentes. Entretanto, necessário o cotejo das provas desses autos com dos autos conexos, pois para se entender a parte é preciso a análise do todo e vice-versa. Houve uma grande especialização das defesas, que agiram de modo premeditado e orquestrado durante as audiências, nos requerimentos no mais das vezes protelatórios ou na vã (espera-se) tentativa de conseguir um motivo para futura nulidade. Como estratégia, também alguns dos réus deixaram até mesmo de manifestar sobre o mérito, para dificultar a sentença.
Necessário um pequeno resumo dos principais pontos das sentenças até aqui proferidas, pois o substrato comum é o mesmo, ou seja, a existência de uma organização criminosa, liderada por um ex-parlamentar (segundo o pai de uma das vítimas) que não foi sequer indiciado ou investigado . Tal organização agia (age) no Hospital da Santa Casa e arredores, mantinha uma falsa central de notificação, captação e distribuição de órgãos ilegal (MG-SUL TRANSPLANTES), manejava uma lista única de receptores própria, auxiliada por uma entidade de doentes renais crônicos (PRO RIM ), fraudando o SUS e tendo imensos lucros com o plus de um reconhecimento social. O esquema não prescindia dos pretensos “doadores”, que tinham a morte encefálica acelerada ou eram deixados à míngua em enfermarias até ficarem “bons para a UTI”, segundo o jargão de um dos médicos neurologistas envolvidos e que escapou da punição pela prescrição . A chamada “Máfia dos Transplantes” ou “Máfia dos Órgãos” já agia desde o princípio dos anos 90, tendo feito mais de 200 transplantes, mas só foi descoberta no ano 2000 com a eclosão do chamado CASO PAVESI. Veja:
A ONG “MG SUL Transplantes foi criada em 1991, conforme artigo veiculado no Jornal Brasileiro de Transplantes, vol. 1, n.4: “Autores A.Ianhez, C.R.C Fernandes, C.E.V.Mosconi, S.Zenun, M.M.R.Bertozzi, J.A.C.Brandão, S.V.Vargas, C.F.Scafi Irmandade da Santa Casa Objetivos: Mostrar o trabalho realizado no serviço, em conjunto com hospitais da região do sul de Minas, que facilitou a captação de órgãos e a realização de transplantes renais e de córneas, viabilizando a regionalização destes serviços e, em conseqüência, a formação do MG SUL TRANSPLANTES, que há 8 anos vem funcionando como uma ONG (organização não governamental).(...)” .
Depois Mosconi negou, respondendo a artigo de revista de circulação nacional, que a MG-SUL que criou fosse até mesmo uma ONG e em juízo (Caso 1) disse “ter ouvido falar” de tal entidade, conforme transcrição de seu depoimento que constou na sentença do Caso Pavesi.
A 1a sentença, foi proferida pelo juízo que me antecedeu, (também relativa ao CASO PAVESI) e condenou o médico oftalmologista ODILON TREFIGLIO NETO (autos n. 0518.08.155480-1), em 18/11/2010, a penas de dois anos de reclusão e 100 dias-multa pelo crime previsto no art. 14, caput, art. 2o da Lei n. 9434/97, vide apenso 6. Tais penas acabaram prescrevendo, como reconhecido no Acórdão n. 1.0518.08.155480-1/001, da 7a CACRI, em 29/3/2012, cópias em anexo. Esse mesmo juízo antecessor pronunciou em 2011 os réus do Caso Pavesi. Como se vê, não fui o único juiz a enxergar os crimes praticados pela “Máfia dos Transplantes”. Bem antes disso, a 4a Vara Criminal da Justiça Federal em Belo Horizonte já havia constatado vários indícios de crime ao julgar uma ação contra o pai da criança Pavesi, acusado de crimes contra a honra.
Já na 2a sentença que proferi (a 1a foi de pronúncia em 2012, confirmada pelo E. TJMG), em 8/2/2013, referente ao CASO 1, apresentei os demais casos, mencionei pela 1a vez a CPI do Tráfico de Órgãos e me referi ao Caso Pavesi de forma sumária, pois à época pendente de julgamento. Ali, ficou bem estabelecido que: o documento usado pelos médicos transplantadores (Critério recomendado para diagnóstico de morte encefálica) não estava de acordo com a Res. n. 1480/97 do CFM; que foi utilizado de forma abusiva medicação depressora do SNC; que foi feita uma arteriografia na criança Pavesi, que não detectou o stop, ainda no Hospital Pedro Sanches e mesmo assim, a equipe do MG-Sul foi chamada; esta fingiu ter feito outra arteriografia, agora na Santa Casa e através do médico radiologista JEFERSON SKULSKI , que supostamente detectou a morte encefálica. Constou da sentença do CASO 1:
1- Dos fatos em geral. Foi instaurado o anexo Inquérito Civil com o objetivo de se verificar o funcionamento do sistema de transplante de órgãos ou enxertos de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano (em vida ou post mortem) neste Estado. A instauração se deu a partir de denúncia encaminhada ao Ministério da Saúde relativa a eventual irregularidade que teria ocorrido no procedimento de doação de órgãos do menor PVP, na cidade de Poços de Caldas-MG.(...)”-segue a descrição minuciosa do caso-
11. Diversas irregularidades foram apuradas, podendo-se citar,dentre outras: a ausência de registros e claras anotações médicas no prontuário do menor quando esteve internado no Hospital Pedro Sanches, o desaparecimento do exame de tomografia computadorizada, a inexistência de registro claro acerca do detalhamento da neurocirurgia realizada, a contradição entre as anotações da enfermeiras e médicos no prontuário, a existência irregular da entidade “MG-Sul Transplantes”, a irregularidade das listas de receptores de órgãos (listas não oficiais e interestaduais), o comprovado envio de córneas do menor PVP para o Estado de São Paulo (revelando com isso, a transferência ilícita de órgãos e o desatendimento à lista oficial),as vultosas quantias doadas à entidade “MG-Sul transplantes” (v. fls. 1378/1382 e 1560/1561 do IC), as inadequadas condições sanitárias detectadas tanto no Hospital Pedro Sanchez quanto na Santa Casa, as inexplicáveis e desconcertantes omissões dos gestores do SUS e do Sistema de Transplantes-nos âmbitos estadual e municipal- na efetiva fiscalização e controle das respectivas atividades sob suas responsabilidades, omissões essas reveladas, sobretudo,na não adoção de medidas corretivas das distorções que deveriam saber ocorrentes.
13- Constatou-se que a entidade “MG-Sul Transplantes” era irregular. Apesar disso, o aluguel do local onde funcionava era custeado pela Santa Casa (f. 17 do IC) e realizava as mesmas funções atribuídas à CNCDO. Do relatório da auditoria realizada pelo DENASUS extrai-se o seguinte:’Não apresentou à equipe documentos comprobatórios da autorização da SES/MG para o funcionamento da Central, funcionando sem autorização formal e sem os devidos credenciamentos junto à Coordenação Estadual de Transplante e junto ao Sistema Nacional de Transplantes- Nível Central (SAS/MS), contrariando o estabelecido na PT/SAS/MS 294/99 quanto ao cadastramento’(f. 16 do IC). Ademais, no documento de fls. 1529, expedido pela Secretaria de Assistência à Saúde-SAS, órgão do Ministério da Saúde, lê-se o seguinte:’1-A dita CNCDO-MG Sul Transplantes está funcionando de forma ilegal na medida em que não existe nenhum ato formal da Secretaria Estadual da Saúde que a constitua, fato este inclusive relatado pelo Dr. Álvaro em sua citada correspondência(...)’ Essa entidade era controlada e dirigida pelo mencionado nefrologista Dr. Álvaro Ianhez, o qual era também o responsável técnico pela equipe médico-especializada de transplante na Santa Casa. Ora, essa acumulação de tarefas afigura-se-nos como pouco ética, pois, obviamente, quem controla a entidade de captação e distribuição de órgãos humanos para fins de transplantes não deveria presidir a equipe médica que realiza as cirurgias! Às fls. 2307 há o seguinte registro no relatório de auditoria produzido pelo DENASUS: ‘a)a equipe de auditores considerou a data de 21 de setembro de 1998 como início do período em que o Dr. Álvaro Ianhez ‘se fazia passar pelo representante da Central de Transplantes de MG.
21- Relativamente à Santa Casa de Misericórdia deve-se dizer, primeiramente, que mantinha relações com uma Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos Regional irregular, chegando mesmo a financiar o aluguel da área física em que tal entidade funcionava (v.fl.17). E com isso mantinha um negócio lucrativo, pois detinha autorização para realizar cirurgias de transplantes de rins, sendo, por esse serviço e pelos serviços conexos a esse, altamente remunerada pelo SUS. Os valores, é bem de se ver, são vultosos. Convém frisar que as CNCDOs (sejam elas regionais ou não) são órgãos públicos, da administração direta do Estado, vinculados diretamente à Secretaria Estadual de Saúde e integrantes do Sistema Nacional de Transplantes-SNT..
21-1 Outro ponto que merece consideração é o fato de a Santa Casa e a respectiva equipe médica terem realizado transplantes até o dia 16.11.2.001, nada obstante suas autorizações estivessem vencidas desde 23.7.01 (...)” . (Negritei) .
Os médicos foram condenados no Caso 1 (vítima JDC) pela prática de diversos crimes, dentre eles o previsto no §1o do art. 14 da Lei n. 9434/97 e o E. TJMG também confirmou a sentença quase na íntegra, mantendo as condenações, reconhecendo a organização criminosa e a prática do tráfico de órgãos em Poços de Caldas.
Na 3a sentença (CASO PAVESI), de 6/2/2014, julgou-se o aditamento à denúncia original. Ali ficou estabelecida a participação de Carlos Mosconi em diversas condutas, ainda que por detrás do palco ou puxando os fios. Tal processo (autos n. 0518.13.001.937-6) é o que possui o maior número de documentos. Afirmou sem pestanejar o nobre Procurador de Justiça Luiz Alberto (vide apenso 6):
Na Santa Casa não foi feita, como era de se esperar, uma segunda arteriografia que demonstrasse a morte encefálica, embora as Defesas afirmem que o exame foi realizado e que seu resultado foi extraviado. (…) No entanto, assim como corretamente concluído na r. sentença (f. 4569), tal exame foi simulado, uma vez que as chapas apreendidas (fl. 1456) são referentes à primeira arteriografia, feita no dia anterior no Hospital Pedro Sanches, conforme se comprovou pela perícia de fls. 1766/1774. (pg. 45 e 46, autos n. 1.0518.13.001937-6/001).
Dentre os documentos constantes foi analisado em minúcias o chamado “procedimento de tutela coletiva”, em dois volumes (veja apenso 8), que contêm três auditorias na Santa Casa, localizado no apenso 29 daqueles autos. Veja um trecho da sentença que desmascara o “teatro” da suposta 2a arteriografia, aquela que nunca apareceu, pois nunca foi feita:
Foi simulada a realização de outro exame (2º suposto exame) de ARTERIOGRAFIA ou ANGIOGRAFIA por JEFERSON SKULKI e como para a “Máfia” tudo é exagerado, disseram ainda que foi puncionada agora a veia femural, para o “padrão ouro” , que seria a arteriografia de quatro vasos. O documento denominado “critério recomendado para o diagnóstico de morte cerebral” - que não é o documento preconizado pelo CFM - protocolo, diz à f. 222-v, vol.1, que a arteriografia realizada no hospital Pedro Sanches teria sido realizada no dia 20/4/00 às 20h, sendo que os auditores não encontraram no prontuário médico nem as chapas nem o laudo de tal exame e segundo apontaram, a enfermagem anotou a hora do exame como 18he35min. e a ficha da anestesia consta como 18he30min, sendo um pouco mais confiáveis tais anotações. Aproveitaram mais tarde as chapas da arteriografia do Pedro Sanches para tentarem dizer que seriam as chapas “encontradas” do suposto exame (arteriografia de quatro vasos, supostamente feito na SANTA CASA), MAS QUE NUNCA FOI REALIZADO. Esse médico JEFERSON SKULKI , que afirma que fez tal exame, deveria ter sido também indiciado pela polícia e denunciado pelo MP (além de outros médicos, como a Dra. Mirtes Bertozzi, Regina Cioffi e outros), tanto que mentiu e vem mentindo ao longo dos anos, inclusive caiu em várias contradições quando ouvido pela CPI, motivo pelo qual vou determinar providências quanto ao mesmo ao final. As chapas radiográficas de tal exame (da SANTA CASA) nunca apareceram, bem como o laudo respectivo não estava nos prontuários médicos, conforme a Auditoria do MS. Quando as supostas chapas (em número de sete) apareceram um certo tempo depois, remetidas pela SANTA CASA para a 2a Vara Cível, ficou evidente que se tratava da arteriografia feita no Pedro Sanches, conforme laudo pericial que será apresentado à frente, quando da análise das provas, pois as fotografias mostram o contraste. O laudo foi feito por SKULKI quase um ano depois e este nem se envergonhou com tal fato, mas tal será analisado em detalhes à frente e posteriormente quando se analisar as teses defensivas amiúde. O laudo constante à f. 223, assinado apenas por SKULKI, não constava no prontuário, conforme consta na auditoria 33/00 do DENASUS e diz que o exame foi feito às 13he35min. do dia 21/4/2000, sendo que no documento à f. 222-v, já citado, se tem a anotação 21/4/00 16h. Jeferson SKULKI disse ao delegado que o exame encerrou-se em torno das 17h (teria sido realizado das 13h às 17h e o técnico de r-x Valdemar Ramos Ferreira disse que o exame se iniciou às 13h e durou de uma hora e meia a duas horas, nunca foi ouvido em juízo e certamente que mentiu também) e que passou o resultado verbalmente, ou seja, não havia laudo algum (que também não foi encontrado no prontuário pelos auditores). Quando SKULKI confeccionou seu “laudo”, unilateralmente e com a data pós datada, certamente que não estava com as chapas, pois o exame, como dito, nunca foi feito. Na CPI, segundo as notas taquigráficas, SKULKI (muito conceituado, segundo a Defesa) disse e a arteriografia se iniciou às 14h e acabou em torno das 16h e disse que teria feito o exame para justificar o exame clínico e que não seria tal exame a determinar se o paciente estava ou não em morte encefálica. Disse, ainda, conforme consta no Relatório da CPI, f. 95, em anexo (apenso 23), que não fez qualquer laudo do exame e que este lhe foi solicitado (por alguém que não soube dizer quem era) 8 meses depois (f.96), justificando que era uma SEXTA-FEIRA SANTA (f.98). Segundo o relator da CPI, Pastor Pedro Ribeiro, as 13h SKULKI nem estaria na SANTA CASA (f.100 do Relatório da CPI, apenso 23)). A ficha de atendimento da vítima indica que a mesma foi admitida na SANTA CASA às 18he13min. do dia 21/4/2000, a ficha de anestesia diz que esta se iniciou às 17he30min. e a cirurgia encerrou-se às 17he40min. A declaração de óbito (f.193) assinada por médico que à época não pertencia aos quadros da SANTA CASA (médico José Luiz Gomes da Silva, posteriormente aos fatos passou a trabalhar também na SANTA CASA), diz que o óbito ocorreu às 19h do dia 21/4/2000.
Na 4a sentença (pronúncia do CASO 2), de 25/8/2014, comecei a analisar as notas taquigráficas da CPI do Tráfico de Órgãos e ver as semelhanças dos casos de Taubaté com os de Poços de Caldas. Veja um pequeno trecho da sentença, indicando o modus operandi das “Máfias” de Taubaté e de Poços, ambas já condenadas e bem parecidas:
O Caso de Taubaté também guarda outras semelhanças com os casos de Poços de Caldas, ainda que naquele não se investigou o tráfico de órgãos, como aqui se comprovou, apenas os crimes de homicídio. Mas tanto lá como aqui, os inquéritos e processos tiveram e têm lenta tramitação. Lá e aqui houve (e há) pressões de todas as formas, veja o que disse o citado promotor:
Aparentemente isso parece um tempo excessivamente longo, mas se um próprio médico, uma pessoa extremamente esclarecida, dedicada, como o Dr. Kalume sofreu uma série de represálias, apenas por querer o auxílio do CRM, os senhores imaginam o que o delegado sofreu de pressões internas e externas durante a apuração desse inquérito . (f. 112).
Veja também o que disse o Promotor de Justiça Marcelo Negrinin, sobre o modus operandi dos casos de Taubaté:
Então, o procedimento, na verdade, funcionava da seguinte forma: um paciente com uma lesão cerebral grave dava entrada no hospital; imediatamente, um desses dois médicos era acionado, “era constatada”- entre aspas “era constatada”- essa morte encefálica, eram acionados os outros dois médicos, o uro e o nefro, esses rins eram retirados, a pessoa falecia, e o mesmo neurocirurgião era o médico legista. Então, era ele que ia fazer o laudo necroscópico. Nesse caminho, se a gente analisar, não havia ninguém para questionar nada. Não tinha outro médico legista, não tinha outro neurocirurgião, não tinha outra pessoa para fazer a necropsia, ou seja, era tudo realizado por eles. Por isso que foi possível, até que isso fosse apurado, foi possível que isso fosse feito por eles num processo em relação a quatro casos, sem que ninguém visse nada. Então era esse o procedimento envolvendo os quatro. Isso ficou muito claro. (fls, 115/116)
A presente sentença (5a sentença, Caso 5), março de 2015, pretende voltar às notas taquigráficas, ao relatório da CPI e entrou no Relatório Final da Comissão Especial nomeada para analisar o repasse de mais de 14 milhões de reais do DME para a Irmandade da Santa Casa, como se vê dos apensos. É como se fechasse o ciclo dos casos da Máfia dos Transplantes de Órgãos, ficando pendente, ainda, os casos do suposto assassinato do ex-administrador “Carlão” , da testemunha José Alexandrino, da própria organização criminosa e outras investigações relacionadas aos casos. A execução da hipoteca da Santa Casa e as investigações de novas mortes no Hospital da Santa Casa deverá ter uma especial atenção de todas as autoridades envolvidas. Agora com o modus operandi da organização já conhecido, espera-se que haja maior facilidade em se entender os horrorosos crimes que se praticaram em Poços de Caldas, então conhecida apenas como local de repouso de velhinhos aposentados e que já foi o destino de lua de mel dos pombinhos recém-casados .
Feito o resumo, que nem tão pequeno assim ficou, analisarei as provas dos autos e em seguida examinarei e afastarei as teses das doutas Defesas, a maioria improcedentes, na seguinte ordem: JEFERSON SKULSKI, PAULO CÉSAR, CLÁUDIO, JOÃO, JOSÉ JÚLIO e ALESSANDRA.
A investigação principiou por meio da Portaria à f.2, datada de 3/12/02, instaurada para apurar o homicídio de P.L.A. A Santa Casa de Poços de Caldas foi excluída do Sistema Nacional de Transplantes (SNT) através da Portaria SAS/MS n. 23 de 18/1/02, como se vê da Auditoria n. 3/2002, à f. 16 dos autos. Os membros da equipe de transplantes aparece às fls. 16/17, composta de 9 membros, incluindo os réus CLÁUDIO e JOÃO, chefiada por A. IANHEZ. Não houve “a renovação da autorização da Santa Casa e sua equipe, para retirada de órgãos e transplante de rim”. Veja:
O Secretário de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde, enviou Ofício n. 056, em 11/01/2001, ao Secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, respaldado por recomendação do Ministério Público, determinando à Secretaria Estadual de Saúde, cessação imediata da dita Central MG Sul Transplantes de Poços de Caldas e imediata incorporação dos receptores inscritos na Lista Estadual. (auditoria, f. 17, p.9).
Observa-se que o ofício foi enviado em 11/1/2001 e a vítima P.L.A (Caso 5, caso dos autos) foi morta em 16/1/2001, a vítima J.D.C (Caso 1) foi torturada de 11/4/2001 a 17/4/2001, A.L.R (Caso 2), também no mês de abril/2001, M.L.O (Caso 7) em junho de 2001 e J.B.M (Caso 8) em maio de 2001 (fls. 21/32 dos autos, auditoria). Assim, caso houvesse rapidez na tramitação burocrática, ao menos cinco vítimas poderiam ter sido poupadas da morte certa nas mãos dos réus. E quantas outras já não tinham perecido, sob sofrimentos atrozes? Vislumbrou-se uma maior “pressa” entre os integrantes da Santa Casa para fazer o maior número de transplantes possível, até mesmo para forçar a renovação da autorização. Mesmo depois da proibição continuaram a operar...
Mesmo com toda a similitude entre todos os casos, como bem observou a CPI do Tráfico de Órgãos (vide apensos 4 e 5), o Caso 5 apresenta maior semelhança com o Caso Zero (Pavesi), que originou as auditorias, dentre elas a Auditoria n. 3/2002, ora examinada. Vamos ao caso.
Paciente P.L.A, 41 anos, registro n. 755184, encaminhado à Santa Casa em 15/01/01 às 16 h, segundo registros da enfermagem (f. 27). Quadro de acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico, pressão arterial (PA) de 24x11 (hipertenso), diminuição de consciência, tomografia apresentando “extensa área hemorrágica”. Ainda em 15/01, segundo registros de enfermagem, paciente apresentando parada respiratória, colocado em ventilação mecânica e “aguarda vaga para CTI”. No dia 16/1, “índice de Glasgow 3 e “faço as provas que estão faltando... PA 26x14 Notifico MG Tx. Reaval. Neuro. Contato com familiares”. Segundo registros de enfermagem, paciente hipertenso “aguardando arteriografia cerebral... Feito arteriografia. Aguarda vaga. Diagnosticada morte encefálica. Família vai doar órgãos.” Não consta no prontuário, o laudo da angiografia cerebral citada no relatório de enfermagem. O paciente foi “doador cadáver”. Consta das observações:
1) Os exames clínicos para comprovação da morte encefálica e o resultado da arteriografia cerebral (...stop do contraste em seio carotídeo bilateral) constam apenas no formulário “Critério recomendado para Diagnóstico de Morte Encefálica”, não havendo registros médicos no prontuário, relatando as condições clínicas do paciente, nem o laudo da arteriografia cerebral. (f. 27, auditoria).
Como se vê à f.228 do depoimento do médico que fez o 1o atendimento da vítima na Policlínica, houve ingestão etílica no dia anterior, fato relatado pela própria vítima. Tal fato consta da denúncia à f. 4D. Consta também da denúncia, que a vítima deu entrada na Santa Casa às 15h e 55 do mesmo dia 15/01, mas a medicação só lhe foi prescrita às 17h. A primeira avaliação só foi ocorrer às 18h e 25 pelo réu e indiciado JOÃO. Diz a denúncia: “Este, ao suspeitar que se tratava de Acidente Vascular Cerebral e que o paciente apresentava sintomas de coma, solicitou de imediato exames sanguíneos e sorológicos, visando à futura captação de órgãos”.
Ainda no dia 15/1, no período que a vítima ainda estava no Pronto Atendimento, foi atendida pelo indiciado FELIX GAMARRA “viu que o caso era grave e mesmo assim não a internou na UTI, bem como não efetuou apontamentos de seu estado clínico no prontuário médico, sob a justificativa de que os cuidados dispensados seriam executados pelo médico da UTI, no caso João Alberto” (denúncia, f. 4D). Nenhum dos dois médicos prestou a assistência devida, não tentaram “reverter o quadro e aumentar as chances de sobrevivência do paciente”. Não solicitaram nenhum exame, nenhum procedimento cirúrgico. Só foi solicitado um exame de imagem (angiografia) após os exames clínicos que supostamente teriam atestado a morte encefálica da vítima.
O MP constatou ao examinar os autos, tal como ocorria nos demais casos, que tais condutas dolosas dos médicos só ocorreram:
(…) certamente porque a vítima e sua família eram pessoas humildes, de pouca instrução, o caso era grave, e sua morte poderia significar a oferta de bons órgãos para transplante, uma vez que não tinha outras enfermidades. Diante da omissão dolosa de Félix Gamarra e do denunciado João Alberto, motivados por obtenção de vantagem pessoal com a futura realização dos transplantes, o quando clínico do paciente se agravou. (f. 5D, denúncia).
Para consignar seus fins, todos os meios foram usados (e que agora procuram, a todo custo, justificar) diagnosticaram “fraudulentamente” a morte encefálica de Paulo Lourenço, “pois havia pressa na realização da extração dos órgãos”. Para tanto contaram, como sempre haviam contado, com os valiosos préstimos do médico radiologista, ex-testemunha e agora réu JEFERSON SKULSKI, que nunca havia se negado a prestar tal serviço e com a garantia de, em sendo necessário, sempre atestar e afirmar até o fim que havia feito o exame de arteriografia e que havia constatado o stop, ainda que nunca houvesse um laudo comprobatório. Também ninguém nunca viu as chapas do exame, tal qual no Caso Pavesi. Os transplantadores da Santa Casa, conforme se verá das perícias oficiais, no primeiro sinal, já DECRETAVAM A MORTE da vítima, sem mais aquela. Conforme consta da AUDITORIA dos autos, cobravam pela angiografia, mas não a faziam. Quem FAZIA PROVA era o réu JOÃO ALBERTO, “faço provas que estão faltando”. Quem conversou com a família da vítima? O “Faz Tudo” do JOÃO. Então, nada de angiografia: para quê? O exame clínico já basta! Pra quê seguir protocolo do CFM? SKULSKI estava resguardado: “não faço parte da equipe de transplantes, mas confio nos meus amigos” , diria. Também seria demais exigir de SKULSKI que se comprometesse ainda mais e ainda por escrito! Se algo desse errado, o que era muito difícil, convenhamos: era tudo feito intramuros, às vezes na calada da noite, uns deporiam -caso necessário- a favor dos outros; quem ousaria afirmar que um médico estava errado, que não havia feito TUDO para salvar a vida do paciente? Não havia ninguém para reclamar, eram todos pobres e sem escolaridade. Ainda mais, que TUDO estava sendo feito para SALVAR outra vida. Realmente, parecia um “golpe de mestre”, sem riscos e com altos lucros. E cá pra nós, só deu errado, porque apareceu um “doido” chamado Paulo Airton Pavesi e outros “doidos” pelo caminho, como os deputados federais da CPI em Brasília, o relator, o presidente e outros, um neurologista do porte de Cícero Galli, Promotores de Justiça do “naipe” de Joaquim José de Miranda Júnior e Marcelo Mattar ou como a Juíza Federal Adriane Luísa Vieira Trindade da 4a Vara Federal em Belo Horizonte, Procuradores de Justiça, como o nobre Procurador Luiz Alberto, jornalistas de diferentes órgãos, cada um com um grau de “loucura” diferente, cada um com uma contribuição diferente para a consecução da Justiça. Mas ainda há muitas pedras e espinhos pelo caminho. Mas aqui ninguém nunca pensou que seria fácil ou rápido. Bem ao contrário, é tudo difícil e moroso, tal qual essa sentença, pedra depois de pedra. Sinto-me como um escravo do século XVII ou XVIII pavimentando as estradas Del'Rey ou Estrada Real das Minas.
O nobre Promotor de Justiça Marcelo Mattar conseguiu entender o modo de funcionamento da Organização Criminosa e isso não é pouca coisa não, só se depreende da análise de mais de um dos casos:
Da análise dos documentos anexados, pode-se perceber que havia várias rasuras no prontuário médico, letras ilegíveis, muitas assinaturas não identificadas e, ainda, outros documentos sem nenhuma assinatura. Ademais, os médicos não fizeram a devida anotação da evolução clínica do paciente, descumprindo orientação do Ministério da Saúde. Tudo isso para facilitar e acobertar as condutas criminosas levadas a efeito pelos médicos envolvidos com transplantes de órgãos na cidade de Poços de Caldas. (f. 5D denúncia).
Quando da análise das provas produzidas em audiência, isso fica ainda mais claro e como os médicos e seus ilustres advogados tentam tirar proveito de tais “omissões”, no mais das vezes “tinham o cuidado de deixar os prontuários descuidados”, como fiz constar na sentença do Caso 1, para dificultar futuras persecuções, ainda que remotas.
O ponto alto do esquema criminoso, o MP deixou para um item específico da denúncia (III) denominado “Do diagnóstico de morte encefálica e o registro de morte”, que contou com a inestimável participação dos outros réus, depois a fatídica cirurgia que retirou os órgãos da vítima, causando-lhe a morte com intenso sofrimento . A morte só foi possível após a fraude que foi o diagnóstico (mais um prognóstico) de morte encefálica, a marca registrada da quadrilha. Assevera o Promotor de Justiça e com base nas provas dos autos, conforme se verá à frente: “Constata-se que o diagnóstico de morte encefálica de Paulo Lourenço consistiu verdadeira fraude e que a vítima foi levada pelos médicos para cirurgia de retirada de órgãos ainda em vida”. Conforme asseverou o MPE (f. 6D): ainda que supostamente constatada a morte por exame clínico, a vítima apresentava coma menos grave, ou seja, Glasgow nível 6, no mesmo dia 16/01, conforme consta à f. 41 do apenso 3; a morte encefálica não estaria descrita no prontuário médico; não se lavrou o Termo de Declaração de Morte Encefálica, como preconizado na Res. n. 1480/97, que contêm uma série de perguntas a fim de se “evitar a precipitação e erro no diagnóstico” e tão somente o documento “Critério Recomendado” que diverge do Termo citado, que apresenta alterações prejudiciais ao um correto diagnóstico, como comprovado no laudo pericial de f. 400 do vol. 2 (laudo pericial n. 1935/2010). É expressamente VEDADA a supressão de quaisquer dos itens no Termo de Resolução e a prova testemunhal produzida vai neste mesmo sentido. Também o fato da vítima ter feito ingestão de bebida alcoólica no dia anterior (sendo esta uma depressora do SNC, uma das causas para não se prosseguir com o diagnóstico de morte encefálica) comprometeu os réus irremediavelmente. Mesmo tendo conhecimento de tais fatos, os réus preferiram continuar com o intento criminoso. Assim, mesmo tendo descumprido o disposto no art. 3o da Lei n. 9434/97, JOÃO, PAULO CÉSAR e JEFERSON SKULSKI encaminharam a vítima para a fatal cirurgia, onde acabou de ser morta pelo réu CLÁUDIO. ALESSANDRA retirou os glóbulos oculares da vítima, sem possuir autorização para tanto, depois que esta já estava realmente morta (morreu de choque hipovolêmico, pois após a retirada em bloco dos rins não é feita sutura). Veja como concluiu o parquet, antes de relatar a conduta específica e detalhada de cada réu:
Por fim, tem-se que a morte da vítima ocorreu às 0h30 do dia 17/01, conforme relatado no documento de fls. 47, anexo I, e na certidão de óbito juntada às fls. 70. Logo, considerando que a retirada dos órgãos iniciou às 22h do dia 16/01 e que à 1h da madrugada do dia 17/01 a cirurgia já havia se encerrado, conforme documentos de fls. 51 e 59, do anexo I, conclui-se claramente que a morte da vítima ocorreu em decorrência da retirada de seus órgãos. (f. 7D, denúncia, destaque meu).
Os problemas nos prontuários médicos da Santa Casa estão indicados na Auditoria às fls. 19/21 dos autos, como descreveu o MPE acima. Portanto, se trata de prova documental, que não pode ser elidida por nenhuma outra, muito menos testemunhal. A simples leitura do prontuário também serve para convencer qualquer um, até este juiz, do que ali se tramava há anos. Certamente que tais “descuidos” tinham uma finalidade, como já disse e também nos outros casos. Veja pequeno trecho da auditoria, à f. 20:
Em 100% dos prontuários:
*ausência do relatório de 'Autorização de Internação Hospitalar' ou “AIH simulada”;
*ausência do preenchimento do campo que identifica o médico responsável no Formulário AIH7 (CPF, carimbo e assinatura do médico responsável);
Observou-se ainda as seguintes distorções, em grande parte dos prontuários:
*ausência de anamnese e exame físico;
*evoluções médicas com dados insuficientes, letras ilegíveis e, em muitos casos, ausência de evolução médica;
(…)
As irregularidades acima relacionadas infringem as seguintes normas :
- Portaria SAS/MS N. 92/95/
- Portaria DM/MS N. 396/2000- Módulo do Hospital (itens (…);
- Decreto n. 2268/97.
E no ponto que diz respeito diretamente ao caso dos autos, afirmaram os auditores do DENASUS:
Ainda considerando os registros em prontuários, observou-se situações que comprometem a qualidade do atendimento:
a) impossibilidade de se avaliar as condições clínicas dos pacientes, principalmente no que se refere à evolução clínica e à gravidade do caso, como se verifica no prontuário n. 946351;
b) a enfermagem ministra medicação cuja prescrição foi feita pelo médico por meio de telefone (…)
c) não se identificou registros de realização de exames diagnósticos suficientes em várias internações;
d) atendimento médico realizado à distância (…); (f. 21, auditoria).
O MP colocou em dúvida a própria realização do exame de angiografia (já que o laudo somente foi juntado após o início das investigações) “Ademais, registra-se que o laudo de arteriografia somente foi juntado aos autos após o início das investigações, provavelmente porque não foi elaborado no momento da realização do exame, se é que esse foi realizado.” (f. 7D, denúncia). Há documento que prova ser prática comum no Hospital da Santa Casa cobrar do SUS por exame de angiografia NÃO REALIZADO. Veja:
4. Nos prontuários de AIH n. 238742957-2 e 239130139-6, não há comprovação da realização dos procedimentos 9700200-3 (Arteriografia Cerebral Bilateral), 9980014-4 (Eco Doppler Colorido Cerebral), porém na AIH simulada e no Relatório Demonstrativo de AIHs pagas – emitido pelo DATASUS, foram lançados os valores correspondentes a esses procedimentos e pagos à Santa Casa, conforme demonstrado no mapa de impugnação (Anexo II). (f.35, auditoria, negritei).
Confira-se, mais uma vez, o que asseverou com muita propriedade, o ilustre Procurador de Justiça Luiz Alberto Magalhães, no Caso Pavesi, conexo a este Caso 5:
Ora, se a primeira arteriografia (Hospital Pedro Sanches) não detectou a morte encefálica, se a suposta segunda arteriografia (Santa Casa) jamais foi realizada, se não foram feitos os exames clínicos e complementares com o intervalo temporal necessário e se não foi feita necropsia, com base em quê os réus poderiam ter procedido à retirada dos órgãos da vítima?n (p. 49, parecer, apenso 6) .
Uma das conclusões dos médicos e outros profissionais auditores (economistas, contadores, enfermeiros) vai em sentido contrário do que declararam publicamente representantes de CRM e CFM, inclusive sobre a questão ética por parte dos réus, neste e em outros processos conexos:
Diante dos fatos apurados e aqui relatados, a equipe conclui que:
Os registros médicos demonstram descumprimento das orientações do Conselho Federal de Medicina e do Ministério da Saúde, quanto ao correto preenchimento da documentação. (…)
As distorções encontradas demonstram:
* que a Santa Casa não está cumprindo as suas responsabilidades, como Entidade Assistencial.
* que o componente municipal do Sistema Nacional de Auditoria- SNA e a Unidade de Controle e Avaliação- UAC não estão desempenhando a contento as atividades de controle, avaliação e auditoria do Sistema Único de Saúde .
* que a Secretaria Estadual de Saúde, não está cumprindo com as suas responsabilidades, quanto à atuação da Central Estadual de Transplantes . (f. 38, auditoria, destaquei).
A seguir vieram as recomendações à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia, à Secretaria Municipal de Saúde de Poços de Caldas, à Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais e ao Gabinete do DENASUS. Quanto a este último, devido a gravidade dos fatos apurados, recomendou-se o envio do Relatório da Auditoria à Procuradoria da República, à Promotoria de Justiça em Poços de Caldas, ao Conselho Federal de Medicina e ao Conselho Federal de Enfermagem (f. 39, Relatório da Auditoria n. 3/2002). E houve outras auditorias, antes e depois desta, com resultados estarrecedores. Mas o Hospital da Santa Casa nunca fechou, ali, ninguém nunca respondeu por nada, os privilégios e abusos continuam até os dias de hoje.
A viúva da vítima, Sra. FÁTIMA DO ROSÁRIO ALVES, (ali constando incorretamente o nome Cláudia Maria Dias da Silva), foi ouvida na fase inquisitorial às fls. 68/69, dentre outras coisas disse que: a equipe médica (os réus) disseram que o seu marido estava em estado grave e “não tinha mais jeito”; quando retornou no dia seguinte, encontrou a vítima “do mesmo jeito” e um médico lhe disse que seu marido “estava em morte cerebral”, apresentou uma chapa, “não tinha mais jeito”. A depoente foi trabalhar e recebeu um telefonema, por volta das 9h, para comparecer ao hospital e lá chegando “disseram que Paulo estava com morte cerebral e foi encaminhada para outra equipe, onde havia uma psicóloga (…)”. Que seu marido bebia aos finais de semana.
A auxiliar de enfermagem BENEDITA CÉLIA DA SILVA foi ouvida à f. 73 e disse que atendeu a vítima no dia 15/01 e passou o plantão a PAULO com a situação da vítima “estabilizada”. Que não participou de procedimentos visando apurar o diagnóstico de morte encefálica.
O depoimento da médica chefe da Auditoria do DENASUS, Rosane Elizabete Miranda do Amaral está às fls. 88/91 e foi transcrito pelo MP às fls. 1719/1720 e 1749/1750. Esclareceu que somente depois de oportunizada a defesa aos dirigentes do Hospital da Santa Casa foi elaborado o relatório final, constante dos autos. Que o médico auditor do Ministério da Saúde, Almir de Sousa Meneses ratificou as conclusões ali constantes. Quanto ao caso dos autos disse que P.L.A foi internado na Santa Casa em 15.01.01, às 16h e ali ficou até o dia 16.01, aguardando vaga no CTI, assistido pelo Dr. FELIX Gamarra. Que não há relato médico de morte encefálica, consta apenas no protocolo, “já o óbito consta na ficha de fls. 68 e 47, como tendo ocorrido no dia 17.01.01 as 00:30 minutos, com uma assinatura sem identificação precisa do médico”; menciona que “não constava do prontuário, o resultado do exame histopatológico dos rins”; que não foi apresentada à auditoria, em março/2002 o laudo de angiografia cerebral bilateral, apresentado à PF à f. 55; não ficou bem definida a destinação dada as córneas extraídas; “que a evolução médica de fls. 27 e 28 foi assinada pelo médico que ostenta assinatura igual a Dr. JOÃO ALBERTO (fls. 40) e consta à fls. 53 que o mesmo médico participou da avaliação dos rins durante a cirurgia de retirada...”; Dentre outras conclusões desse importante testemunho, se extrai que os prontuários foram “maquiados” após a auditoria, pelo menos em duas oportunidades, com a confecção posterior do laudo histopatológico dos rins e do laudo da suposta angiografia.
Após as “justificativas” da Santa Casa, mencionadas pela testemunha ROSANE ELISABETE, supra, se vê do Relatório de Auditoria n. 109/agosto/2002, às fls. 92/97, depois de recomendações aos diversos envolvidos, aquela referente a SES :
Providenciar, para que no processo de captação de órgãos e tecidos, bem como em todos os outros procedimentos relacionados a transplante, SEJAM OBEDECIDAS AS DETERMINAÇÕES DO DECRETO N. 2.268/97, DE 30/6/97, A RESOLUÇÃO N. 1.480/97, DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA E A LEI N. 9.434, DE 4/2/97 (destaquei);
Portanto, nesse e em todos os outros processos fica evidente, fica claro que os réus, a equipe de transplantes, o Hospital da Irmandade da Santa Casa de Poços de Caldas, a Secretaria Municipal de Saúde comandada pelo réu JOSÉ BALDUCCI e a própria Secretaria Estadual de Saúde (junto a FHEMIG e a CNCDO estadual MG TRANSPLANTES, não a falsa central, MG-Sul, que nem existia formalmente e era ilegal, pois não autorizada pelo Ministério da Saúde) descumpriram todas as normas que regem a matéria de transplantes e retirada de órgãos. O Órgão máximo (o Ministério da Saúde) através da entidade encarregada de fiscalizar o sistema (AUDITORIA DO DENASUS) foi quem afirmou e comprovou que foram descumpridas tais normas, inclusive do próprio CFM. Fica muito estranho, vários anos depois, o CRM e o CFM vir a público e dizer que suas próprias normas (incluindo importantes resoluções, como a que rege o protocolo de morte encefálica e o código de ética) não foram descumpridas pelos réus. Então quem descumpriu? O Sr. José Popô? A vítima? A família da vítima? Se houve descumprimento de leis e normas médicas tem que haver punição. Toda lei prevê a punição correspondente ao seu descumprimento e cabe ao Poder Judiciário aplicar as leis do país, não ao CRM ou CFM, que, como visto, prefere esconder os malfeitos, a no mínimo, reconhecê-los para que não aconteçam novamente. Cabe ao MP tomar as medidas cabíveis também para punir os dirigentes de tais entidades fiscalizadoras que prevaricam claramente, ou seja, também praticam crimes ao tentar esconder e defender (não é a sua função) os médicos malfeitores.
O auxiliar de enfermagem WEBERSON AMOEDO foi ouvido às fls. 106/107 cuidou da vítima de 15/01 a 16/01, dizendo que esta estava internada no pronto socorro “aguardando vaga para a UTI”. Que: “o registro constante no item 04 e fls.28: bom para UTI não é comum sua utilização e o depoente nunca deparou com tal registro”; “o entubamento do paciente é executado pelo médico, bem como a ventilação mecânica, sendo que NÃO CONSTA NOS REGISTROS ELABORADOS PELOS MÉDICOS DE FLS. 28 A EVOLUÇÃO REFERENTE A TAIS PROVIDÊNCIAS”.
As declarações do réu PAULO CÉSAR estão, na fase inquisitorial, às fls. 108/109 e foram transcritas pelo MP à f. 1728, desnecessária nova cópia. Como à época em que foi ouvido pela PF não era investigado, mas por via das dúvidas, tentou lançar qualquer incriminação para seus colegas JOÃO ALBERTO e para FELIX GAMARRA (ambos indiciados pela Polícia). Tal tática também foi usada em outros processos, mesmo porque FELIX, o “Bom para UTI”, teve suas condutas criminosas prescritas, por ter mais de 70 anos de idade. Ainda assim, continua a trabalhar na Santa Casa sem misericórdia de Poços de Caldas.
As declarações do réu JOÃO ALBERTO na fase inquisitorial estão às fls. 110/111 e foram transcritas pelo MP às fls. 1703/1704 e a elas voltaremos oportunamente, comparando, inclusive, as declarações prestada na fase judicial, da mesma forma com os demais réus. Fica desde já o registro que confessou ter solicitado exames sorológicos “devido ao quadro grave do paciente, para subsidiar futura captação de órgão”. Tentou, ainda, explicar a expressão “faço prova que estão faltando”, significando, segundo ele, que havia feito o exame de gasometria, estando faltando o segundo exame clínico de ME e exame complementar de angiografia, e que o termo é utilizado entre transplantadores “para expressar que foram realizados os testes do diagnóstico de morte encefálica”. Então, comprovada mais uma ilegalidade, pois o médico que realizou atendimento da vítima é o mesmo que diagnostica a ME, o que é vedado pela Lei n. 9.434/97. Confirmou a intervenção de PAULO CÉSAR. Disse que JEFERSON teria feito a suposta arteriografia no dia 16/01 por volta de 11h e 30 e que o resultado foi passado a FELIX e a ele VERBALMENTE, “não sabendo porque o laudo respectivo não foi juntado ao prontuário do paciente logo em seguida”. Confirmou a extração das córneas por ALESSANDRA, que prestava serviços junto ao ROTARY (onde também presta serviços o oftalmologista condenado ODILON TREFIGLIO) e prefeitura de Poços. Confirmou a retirada dos rins por CLÁUDIO e SAULO.
As declarações do indiciado FELIX H. GAMARRA estão às fls. 117/118 e como os demais réus foi acompanhado pelo advogado da Santa Casa, o famigerado Sérgio Roberto Lopes, o “Serjão”. Disse que não fez anotações da evolução clínica da vítima por falta de tempo. Tentou explicar o que seria “bom para UTI”. Mesmo tendo sido ouvido em 2003 e tendo contato com o prontuário médico da vítima pouco “se lembrava” do caso, o que é muito estranho, para dizer o mínimo. Também não se lembrou “de detalhes” do diagnóstico de morte encefálica. Confessou de modo patético, não conhecer “a fundo” a Res. n. 1480/97, que trata do assunto. Confirmou a participação do réu JOÃO ALBERTO. Falou que as chapas do suposto exame de arteriografia “devem ter” ficado no ambulatório e não soube dizer por que o laudo de tal exame não estava no prontuário da vítima. Confessou não saber “se foi obedecido todos os requisitos da Resolução 1480 do CFM porque não a conhecia ao pé-da-letra”. “Não se recorda” se manteve contato com familiares da vítima. Um espanto. Se fosse condenado por todos os homicídios que participou ficaria o resto da vida e mais uns 30 anos na cadeia. Ao invés disso, ainda trabalha na Santa Casa, ganha uma fortuna por mês, paga com dinheiro do contribuinte brasileiro como visto.
O médico Sérgio Mendes esclareceu à f. 130 o destino das córneas retiradas ilegalmente da vítima. Segundo seu depoimento, as córneas foram enviadas para BH.
Conforme concluiu o delegado presidente do IP (fls. 156/164), do depoimento da auditora Rosane Elisabete, “não há registro que o neurologista FELIX GAMARRA (…) tenha visitado Paulo”. Isso explica a pouca memória do peruano. O réu JOÃO ALBERTO solicitou exames sorológicos “antes da conclusão do protocolo do diagnóstico de morte encefálica de Paulo”. Ambas as conclusões reforçam a tese de que o diagnóstico de morte encefálica foi um engodo total. JOÃO ALBERTO atendeu o paciente e participou do diagnóstico, dentre outras ações visando apenas lucrar com os órgãos da vítima, combinado aos demais réus que participaram de qualquer modo da empreitada criminosa. Como visto, a testemunha BENEDITA (f. 73) disse não ser comum a expressão “faço prova”. Importante constar trecho das conclusões do delegado federal, in verbis:
O momento médico-jurídico da morte se dá quando morre todo o encéfalo , ou seja, o momento em que a angiografia constatar a inexistência de perfusão cerebral, isso, em consonância com o art. 3o da Lei de Transplante de Órgãos, n.9.434/97 e com a Resolução n. 1.480/97 do CFM, mormente seu art.3o , entretanto, o indiciado Felix constou na declaração de óbito (fl.61v do apenso- vide certidão de óbito de fl.70 dos autos) e à fl.47 o óbito como sendo “17/01/2001 as 0.30 minutos” apresentando rasuras no mês, verificando-se que havia sido registrado inicialmente 06, mas a cirurgia de extração de órgãos iniciou-se às 22 horas do dia 16.01.01, conforme o boletim do centro cirúrgico de fl.11 e ficha de anestesia de fl. 12, todos do apenso I, portanto, depreende-se o desconhecimento do indiciado em tais questões, OU OS ÓRGÃOS FORAM RETIRADOS COM O PACIENTE AINDA EM VIDA. (…).(…) o indiciando JOÃO ALBERTO GOES BRANDÃO (…) AGIU VISANDO OBTER A MORTE DO PACIENTE, OU CRIMINOSAMENTE ABREVIÁ-LA, PARA FINS DE EXTRAÇÃO DE ÓRGÃOS (ART. 14 LEI N. 9.434/97), JÁ QUE HAVERIA AINDA UMA SOBREVIDA DO PACIENTE. (destaquei).
O primeiro médico a atender a vítima P.L.A, CARLOS ROBERTO AMBROGI BERNARDES, foi ouvido e seu depoimento encontra-se às fls. 228/229. Discorreu sobre o estado da mesma, confirmou suas anotações: “relatou ingestão etílica ontem”; “pupilas isocóricas” “INDICA QUE O CÉREBRO NÃO FOI AFETADO”; que há dúvidas se o PLASIL seja depressora do SNC.
O ofício do MG Transplantes à f. 235 comprova que a ré ALESSANDRA não tinha autorização para retirar córneas.
O interrogatório de ALESSANDRA às fls. 269/270 consta confissão de ter retirado as córneas da vítima e não sabe qual a destinação das mesmas. Disse, ainda, que “acredita que é credenciada”. Que “alguém” da Administração da Santa Casa a induzir a acreditar que a sua situação fosse regular. Se percebe que uma Organização ali agia para fazer com que os órgãos e tecidos fossem retirados a todo custo para que os lucros de seus membros e da própria Irmandade fosse cada vez mais crescentes, à custa de vidas e às custas do SUS.
O interrogatório do réu CLÁUDIO ROGÉRIO está à f. 279 e foi conduzido pelo então delegado da Polícia Civil de Poços, Juarez Vinhas, ex-PM e colega de “Serjão”, também ex-PM, ambos suspeitos na morte de Carlos Henrique Marcondes, o “Carlão”. Afirmou, dentre outras coisas, que: a extração dos rins da vítima foi precedida pelo exame do prontuário para verificar “as circunstâncias da morte”; “o protocolo de ME COM CERTEZA estava em ordem”; JOÃO ALBERTO examinou os rins na sala de cirurgia; que os rins encaminhados para exame NÃO RETORNARAM AO HOSPITAL; não se lembra do horário do início e término da extração, mas que foi À NOITE; NÃO SE RECORDA do horário da morte de Paulo Lourenço Alves. José Apolinário, a testemunha que morreu em condições suspeitas, paciente de JOÃO ALBERTO, dizia das suspeitas cirurgias feitas à meia-noite na Santa Casa.
O interrogatório de SAULO ZENUN está à f. 280 e as respostas estão idênticas as de CLÁUDIO ROGÉRIO.
O depoimento da psicóloga MARIANGELA MOURA está às fls. 281/281v e disse não ter participado da abordagem da família da vítima, inclusive negou que tivesse preenchido os documentos de f. 52. Mesmo na AIJ a questão sobre quem teria feito a abordagem ficou um pouco nebulosa. Estagiários? Filho feio não encontra pai.
O laudo pericial n. 1581/2007 está às fls. 337/350 e foi feita À PEDIDO DA DEFESA DE FELIX GAMARRA, que formulou 11 quesitos, tentando debater o que já havia sido estabelecido em regular perícia e laudo n. 622/2006, constante no apenso 3 (antigo apenso 2). As respostas aos quesitos 1, 2, 5 e 11 nada trouxeram de novo para o deslinde do feito. A resposta ao quesito 3 informou que uma pessoa mesmo estando com concentração sanguínea acima de 400 mg/dl de álcool no sangue podem se apresentar conscientes. Ao quesito 4 foi respondido que “A ingestão de bebida alcoólica é um fator de risco associado à ocorrência de acidente vascular encefálico hemorrágico”. Ao quesito 6 os peritos afirmaram que a ingestão de álcool, por produzir vasoconstrição, pode interferir no resultado do exame de angiografia. A resposta ao quesito 7 indica que duas causas conjuntamente podem ter gerado o coma: o AVC hemorrágico e a intoxicação por álcool etílico. In verbis:
Ao realizar o protocolo de diagnóstico de morte encefálica, a presença de droga depressora do sistema nervoso central (como o álcool etílico) deve ser excluída, para se evitar a possibilidade de erro no diagnóstico de morte encefálica baseado em quadro clínico que pode ter sido provocado ou intensificado por uma intoxicação reversível. (f.344).
Ao responder ao quesito 8 da Defesa, os peritos disseram que:
As condições citadas no enunciado deste quesito (hemorragia cerebelar com inundação ventricular, abolia em reflexos de tronco cerebral, tetraplegia flácida, aliados ao estado de coma aperceptivo do paciente e ao exame de tomografia) são sugestivas de morte encefálica, MAS NÃO SUFICIENTES PARA QUE SE DÊ ANDAMENTO AO PROTOCOLO DE DIAGNÓSTICO DE MORTE ENCEFÁLICA (…) mesmo que seja iniciado o protocolo de diagnóstico de morte encefálica, O MESMO DEVERÁ SER INTERROMPIDO CASO EXISTA A POSSIBILIDADE DO COMA TER COMO CAUSA HIPOTERMIA OU USO DE DROGAS DEPRESSORAS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL, conforme exigência que consta no item A do “TERMO DE DECLARAÇÃO DE MORTE ENCEFÁLICA” anexo à Resolução CFM n. 1480: (…). No caso do paciente Paulo Lourenço Alves, a possibilidade de que o álcool etílico (UM DEPRESSOR DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL) estivesse contribuindo para o coma já foi discutida nas respostas dos quesitos 4 e 9 (itens a e d), no Laudo n. 622/2006-INC, e na resposta ao quesito anterior, nesta Laudo. (f. 345).
Na Santa Casa da Morte, o paciente/vítima “deixou de piscar” e já se iniciava o protocolo de morte, pois a gana nos órgãos e aos lucros que gerariam era tamanha.
Ao responder ao quesito 9, foi dito que o “prontuário médico da vítima não continha todas as informações necessárias para assegurar a correta classificação do quadro clínico apresentado pelo paciente PLA”. Para avaliar o risco era necessária a informação do volume da hemorragia, o que não constou na descrição do resultado do exame de tomografia.
Respondendo ao quesito 10 foi dito que “Não há qualquer indicação na cópia do prontuário submetido a exame, ou no Laudo n. 622/2006, de que o médico Felix Hernan Gamarra Alcantara TENHA SOLICITADO MONITORIZAÇÃO DE PRESSÃO INTRACRANIANA PARA O PACIENTE P.L.A”. Nem ele ou qualquer outro médico da Santa Casa.
Portanto, o novo laudo pericial n. 1581/2007, feito a pedido da Defesa, tal qual o primeiro laudo oficial, n. 622/2006, compromete irremediavelmente os réus. Da mesma forma, o laudo n. 1935/2010 às fls. 397/401 que afirma que o réu JEFERSON SKULSKI “utilizou técnica diversa da preconizada para detecção de morte encefálica” no suposto exame de angiografia que teria realizado, pois puncionou apenas as artérias carótidas, pois poderia haver perfusão sanguínea pelas artérias vertebrais. Afirmam ainda os peritos, como base no art. 6o da Res. CFM n. 1480/97, que exige dos exames complementares, como é o caso da angiografia, demonstração de forma INEQUÍVOCA de ausência de perfusão sanguínea cerebral, pois assim, “O DIAGNÓSTICO DE MORTE ENCEFÁLICA NÃO PODE SER FIRMADO” (f.400). O laudo também traz outras informações:
O procedimento anestésico começou por volta das 21h30; a cirurgia foi iniciada por volta das 22h e terminou 30 minutos depois. Consta que os cirurgiões foram os médicos CLÁUDIO ROGÉRIO FERNANDES e SAULO ZENUN, e que o anestesista foi o médico JULIO BALDUCCI. Fls. 63/64 ilegíveis (…) A f. 68 informa apenas “Óbito 17/01/2001 às 0.30 (ilegível). (Destaquei).
O laudo 1935/2010 ainda manteve intactas as respostas aos quesitos 1,2,3,6,7,8 e 9 do laudo n. 622/2006. Diz mais e muito importante:
A resposta ao quesito 04 já apontava a existência de divergências entre o documento denominado “Critério Recomendado para o Diagnóstico de Morte Encefálica” e os critérios contidos na Resolução CFM n. 1480/97. Ao lado de algumas modificações apenas terminológicas, que não maculam a certeza do diagnóstico de morte encefálica, FORAM APONTADAS OUTRAS POTENCIALMENTE PREJUDICIAIS À CERTEZA DO DIAGNÓSTICO DE MORTE ENCEFÁLICA. (f. 400).
Esclarecem, ainda, os peritos (o que ainda foi confirmado em audiência, ouvindo médico arrolada pela própria Defesa, como se verá adiante):
O procedimento descrito no documento intitulado “Critério Recomendado para o Diagnóstico de Morte Encefálica” requer apenas a observação da apneia por 3 a 5 minutos – o que diverge do “teste de apneia”, definido pelo CFM. O teste de apneia é uma sequência de procedimentos que finda com a observação do paciente em apneia por 10 minutos, e que não equivale à mera observação da apneia por 3 a 5 minutos. Outra inconsistência apontada no laudo n. 622/2006 foi a ingestão de etanol antes de iniciar o protocolo para diagnóstico de morte encefálica.(...) Quanto à resposta ao quesito 05, o laudo pericial n. 622/2006 já arrolava o médico JEFERSON SKULSKI como o responsável (...)(f. 401).
O laudo pericial n. 622/2006 (vide apenso 3) encontra-se, também, por cópia às fls. 402/454. Às fls. 428/429 os peritos apontam, precisamente, as diferenças dos documentos “Critério” e o Protocolo de Morte Encefálica do CFM. À f. 432, há importante informação, posteriormente também confirmada em audiência judicial da fraude no prontuário :
As fls. C3, C6, C8, C9, C11, C12, C13, C27 a C39, C40. C41 a C49 e a unidade de documento considerada no grupo de folhas C35 e C52, apresentam marcas com as inscrições “DENASUS/MS AUDITADO 24/3/2002”, indicando que possivelmente foram manipuladas quando da auditoria realizada no hospital da irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Poços de Caldas em março de 2002 (folhas A9 a A41). As folhas C2,C5, C10, C14 C15, C16 a C26, C50 e C51 NÃO APRESENTAM TAIS MARCAS, INDICANDO QUE POSSIVELMENTE NÃO FAZIAM PARTE DO PRONTUÁRIO MÉDICO QUANDO FOI REALIZADA A AUDITORIA. (f. 432, destaquei).
Às fls. 433/434 os peritos afirmam que “Há indícios de que as fotocópias recebidas para exames não correspondem à totalidade do prontuário médico de Paulo Lourenço Alves”, inclusive uma f.53 mencionada por testemunhas não consta do prontuário encaminhado pela Direção da Santa Casa. Se não fizeram nada errado por que fraudar e falsificar?
À f. 441, consta do laudo pericial que a primeira avaliação clínica da vítima só ocorreu às 18h25min do dia 15/01/01, sendo que ingressou na Santa Casa às 15h55 do dia 15/01/01 (f.440). Portanto, houve demora no atendimento correto. Essa 1a avaliação constou que “estimulando vias aéreas TOSSE!”. “(...) o reflexo de tosse ainda estava presente, indicando atividade do tronco encefálico, e portanto, AFASTANDO O DIAGNÓSTICO DE MORTE ENCEFÁLICA naquele momento”. Consta ainda que no dia 16/01 foi preenchido laudo médico para emissão de AIH indicando que a vítima estava em GLASGOW 6 (folha C3), tal qual mencionado na denúncia do MP.
Às fls. 442 a 446 os peritos indicam bibliografia e os procedimentos que deveriam ter sido tomados com um paciente nas condições da vítima, desnecessária a transcrição, mesmo porque muita longa. Quanto a questão da ingestão de etílicos, poderia ter sido feita uma dosagem do sangue. Mas isso não interessa, não é mesmo? Só os órgãos de uma pessoa supostamente sadia (os exames não apontaram nada), de 40 anos de idade.
À f. 449 consta a indicação que a vítima NÃO TEVE TODOS OS CUIDADOS necessários, pois dentre outros aspectos não teve monitorada a sua pressão intracraniana (PIC), não passou por cirurgia descompressiva, não havia a marcação no campo de monitor cardíaco (não providenciaram). Confira-se a certeira afirmativa do Procurador Luiz Alberto Magalhães:
Inicialmente, importante salientar que a existência de uma organização criminosa para o fim de comercializar órgãos humanos na região da cidade de Poços de Caldas RESTOU AMPLAMENTE EVIDENCIADA NESTES AUTOS, bem como no denominado “Caso 1”- vítima JDC (processo n. 0518.10.018719-5), no qual dois dos ora apelantes, Celso e Cláudio- também estão envolvidos e tiveram suas condenações decretadas em primeiro grau e mantidas pelo egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais. (pg. 34, autos n. 1.0518.13.001937-6/001, apenso 6, destaquei).
Como já constei, a decretação da morte encefálica não seguiu as recomendações do Protocolo de Morte Encefálica, preconizados pela Res. n. 1480/97 e a Lei de Transplantes, portanto, não teve nada de regular. Também as declarações dos demais réus não os socorrem, pois apenas tentam se livrar da persecução penal e das claras provas contra eles. Assim, nem a prova oral, muito menos a documental socorre a maioria dos réus.
Às fls. 449/450 os peritos dizem que (melhor transcrever, do que somente citar, tal a gravidade da constatação):
Isto indica ou que houve prescrição sem a realização de avaliação clínica por médico (CONTRARIANDO O ART. 62 DO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA, aprovado pela Resolução CFM n. 1246, de 8.1.88) ou que tal avaliação deixou de SER REGISTRADA NO PRONTUÁRIO (CONTRARIANDO O ART. 69 DO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA).
Ora, como agora vem o CFM e o CRM e diz que nenhum dos réus CONTRARIOU NORMAS ÉTICAS e os ABSOLVE! Que país é esse? Para que servem tais conselhos da época da ditadura Vargas? Ao que consta já existem sindicatos e associações médicas, cuja função é defender os médicos a todo custo. Os conselhos foram criados para FISCALIZAR e não vêm cumprindo com o seu dever, bem ao contrário. Mais uma vez, com a palavra o MP para as devidas providências.
Na sentença do Caso 1 e do Caso Zero, citei o laudo pericial:
Diz o laudo pericial n.2072/2010 citado nas pgs. 34 e 35 da sentença do CASO 1:
Alguns medicamentos rotineiramente usados no manejo de pacientes graves tais como opióides, barbitúricos, benzodiazepínicos, fenotiazínicos, antidepressivos tricíclicos, relaxantes musculares podem afetar o diagnóstico de morte cerebral por deprimir os reflexos de tronco encefálico e o sinal do eletroencefalograma até o padrão isoelétrico (zero). Segundo Kalcher e Meinitzer (2008), nestes casos, essas drogas devem ter seus níveis séricos constantemente monitorados. (fls. 3693/3694, vol.15).
Dizem os mesmos peritos:
Segundo Morato (2009), para pacientes com histórico de uso prévio de bloqueadores neuromusculares, drogas psicotrópicas, antidepressivos tricíclicos, agentes anestésicos e barbitúricos, deve-se AGUARDAR UM PERÍODO DE 24 à 48h ANTES DO COMEÇO DO PROTOCOLO DE MORTE ENCEFÁLICA. (f. 3694, p.35 da sentença CASO 1);
Como se viu das perícias citadas, o art. 1o da Res. N. 1480/97 não é contemplado no documento “Critério Recomendado” e a arteriografia nem mesmo foi realizada, pois não encontra respaldo na prova (não existe a chapa e o laudo foi feito posteriormente, como no Caso Pavesi). Do mesmo modo, os demais artigos até o 9o não foram mesmo observados pelos réus, como exaustivamente demonstrado e pela prova oral a seguir analisada. Houve sim a supressão de exigência contida na resolução (o tempo de apnéia era outro, somente para ficar em um aspecto, claramente exposto na AIJ).
Após a análise da farta prova documental, especialmente a composta pelos laudos periciais OFICIAIS (não o laudo encomendado e produzido unilateralmente pela Defesa), vamos à prova testemunhal (por natureza mais frágil, mas, mesmo assim, contundente), combinado às teses defensivas, analisadas e afastadas, uma a uma.
A testemunha BENEDITA CÉLIA DA SILVA foi ouvida judicialmente às fls. 1357/1359, disse que: confirma seu depoimento prestado na fase policial; NUNCA PEGOU UM DOCUMENTO DE UM MÉDICO QUE TIVESSE CONSTADO A REFERIDA EXPRESSÃO 'FAÇO PROVA'; que em casos de AVC o paciente deve ser encaminhado a UTI, “ah, sim”. Conforme mencionado pelo MP à f. 1708: “que não sabe dizer se no próprio dia 15 foi diagnosticada morte cerebral da vítima; que pode afirmar QUE QUANDO SAIU DO HOSPITAL, POR VOLTA DAS 7 HORAS, A VÍTIMA NÃO ESTAVA MORTA”.
A testemunha WEBERSON AMOEDO foi ouvido às fls. 1360/1361 e reafirmou que a expressão “bom para a UTI” não é comum. Disse, ainda: “que além da necessidade dos exames ficarem anexados ao prontuário médico, o médico tem a obrigação também de relatar a realização do exame, os resultados obtidos e suas conclusões”.
MARIANGELA MOURA SANTOS foi ouvida novamente às fls. 1362/1363. Disse, dentre outras coisas que: confirma seu depoimento de fls. 281/281v; conhece as entidades MG-Sul Transplantes , Nephros e PRO Rim; que há documentos nos autos com o carimbro “DENASUS AUDITADO” e outros sem o carimbo; que o de f. 55, sem carimbo está assinado por JEFERSON SKULSKI.
SAULO ZENUN, indiciado, preferiu ficar em silêncio (f. 1364).
Às fls. 1365/1366 foi ouvida FÁTIMA DO ROSÁRIO ALVES, viúva da vítima, que confirmou suas declarações às fls. 68/69. Confirmou que seu marido ingeriu conhaque no dia que passou mal.
Testemunha da Defesa, SIMONE, fls. 1397/13/98, nada acrescentou ao deslinde do feito.
Testemunha da Defesa, JÚLIO CARDOSO, fls. 1399/1402, médico anestesiologista, foi transcrito pelo MP às fls. 1720/1727, trouxe importantes esclarecimentos, ainda que a contragosto. Não vou transcrevê-lo, pois o MP já o fez, como dito. Disse já ter participado de procedimentos de transplante e retirada de órgãos. Ainda: “é função do anestesista examinar o prontuário médico, ver a parte burocrática, autorização para doação, protocolo de morte encefálica”; mesmo paciente grave “é possível que retorne a 15 de glasgow”; que não dá para morrer duas vezes; que os exames sorológicos são inclusive para fins de compatibilidade; “não é comum pedir exames sorológicos de pacientes com AVC”; “que a certidão de óbito de f. 70, do vol.1, declara que o paciente faleceu no dia 17/01/01. às 00:30, mas que da análise dos documentos de fls. 38/39 do apenso, conclui-se de forma diversa”; “para o depoente o descumprimento de uma resolução do CFM infringe o código de ética médico”.
Ainda respondendo ao juiz narrou as diferenças do documento dos réus “critério recomendado” para o documento do CFM protocolo de morte encefálica, disse mais:
Que os exames preconizados no critério do MG-Sul Transplantes de apneia não idêntico ao preconizado pelo CFM; que no entender do depoente deveria ser usado o documento o documento preconizado pelo meu conselho; que os médicos que trabalhavam em transplantes em Poços de Caldas deveriam ter se atualizado (…) que a ingestão de álcool pode prejudicar o diagnóstico de morte encefálica, pelo que está no Protocolo, pois se trata de uma droga;(...) perguntado se no formulário critério recomendado às fls. 37/39, apenso 1, existe algum exame ou disposição idêntica ou similar constante ao item 03 às fls. 154/155, respondeu que “não tem”( f. 1402).
A testemunha JÚLIO CÉSAR CARDOSO se confundiu quando falou sobre os conceitos de morte. Veja o que fiz constar sobre o tema, por ocasião da Sentença do Caso Pavesi :
A vítima, como nenhuma outra pessoa, não morreu várias vezes, como querem as Defesas, pois, como se sabe, só se morre uma vez . Mesmo que se queira dizer, que pode ocorrer “morte clínica”, morte cerebral, morte encefálica, parada cardíaca e respiratória, tais ocorrências nada mais são (ou poderiam ser) etapas para a morte, seja em qual conceito for, médico, filosófico ou religioso e tais conceitos mudam. Até mesmo entre os médicos não há unanimidade sobre o tema “morte encefálica”, muito ao contrário. Fugiria muito ao caso digressões mais aprofundadas sobre tais temas, razão pela qual serão anexados ao final alguns estudos da lavra de Cícero Galli, doutor e expert no assunto.
Às fls. 1409 a 1425 constaram os interrogatórios judiciais dos réus, os quais vou mencionar rapidamente, pois transcritas também pelo MP, somados as suas teses de defesa. Foram contraditórios e em diversas passagens há confissões, como se pode ver da simples leitura, ainda que alguns só respondessem as perguntas de seus advogados e do MP, temendo responder ao magistrado, talvez pelo fato do maior conhecimento acumulado por este, de sua experiência com os casos da Máfia dos Transplantes. A exceção foi JOSÉ JÚLIO, que respondeu a todas as perguntas deste magistrado.
Nesse momento já é possível um balanço do que até aqui se constou a partir da f.50 (item IV-2- Da Autoria):
A- A importância de analisar o presente caso com os outros que o precederam;
B- A Auditoria n.03/2002;
C- Os três Laudos Periciais oficiais (622/2006, 1581/2007 e 1935/2010) e
D- As testemunhas ouvidas, inclusive na fase judicial.
A- Também aqui já ficou claro e estabelecido, inclusive pela existência e comprovação dos outros oito casos suspeitos envolvendo transplantes de órgãos e das mortes por “queima de arquivo”, da existência de uma Organização Criminosa que agia (age) dentro e nas imediações da Santa Casa de Poços de Caldas, ligada à ONG MG-Sul Transplantes, à ProRim e clínica Neprhos, de Mosconi, Ianhez, Scafi, Felix Gamarra, Zenun, JOÃO, CLÁUDIO, JEFERSON SKULSKI, PAULO CÉSAR e possivelmente outras pessoas.
As sentenças condenatórias até aqui proferidas comprovam tal fato, além da existência de uma lista própria de receptores (dirigida pela Pro Rim, de Lourival e Ianhez, cujo estatuto foi feito por Sérgio Roberto Lopes), o descumprimento da legislação de transplantes e das resoluções do CFM, incluindo o Protocolo de Morte Encefálica (Res. n. 1480/97) e do Código de Ética: a 1a de 2010 (proferida pelo juízo anterior, condenou oftalmologista no Caso Pavesi); a 2a, de 2012, pronúncia do Caso Pavesi, confirmada pelo E. TJMG; a 3a, de 2013 (Caso 1), confirmada pelo E. TJMG; a 4a, de fevereiro de 2014 (Caso Zero/Pavesi); a 5a, de agosto de 2014 (pronúncia, Caso 2) e a 6a e atual sentença (Caso 5).
B- Sobre a Auditoria n. 03/2002 e suas constatações, até a presente data não refutadas (aliás, confirmadas pelas provas produzidas e laudos periciais oficiais): 1- os 8 casos suspeitos de transplantes; 2- os problemas nos prontuários médicos; 3- infringência à Lei de Transplantes e ao seu regulamento (Decreto n. 2268/97); 4- falta do laudo da angiografia da vítima (bem como das chapas do exame); 4- a Santa Casa cobrava angiografia do SUS e não fazia, como prática corriqueira; 5- descumprimento das orientações do CFM e do Ministério da Saúde.
C- Os laudos periciais oficiais, Laudo n. 622/2006, Laudo n. 1581/2007 e Laudo n. 1935/2010 (algumas conclusões): 1- os réus deveriam ter interrompido o protocolo de morte encefálica; 2- diferenças entre o documento do MG-SUL, “critério recomendado” e o Protocolo de ME do CFM (conclusão confirmada e novamente comprovada na prova testemunhal produzida em juízo); 2- colocação de documentos forjados dentro dos autos de IP (sem o carimbo “DENASUS/AUDITADO”, conclusão também confirmada em audiência judicial); 3- vítima “TOSSIU”, prova de que não estava em morte encefálica (ME) naquele momento; 4- os réus contrariaram o contido no Código de Ética Médica (fato confirmado pela prova testemunhal em juízo); 5- a vítima não teve todos os cuidados necessários (conclusão também confirmada pela prova produzida em juízo).
D- Sobre as testemunhas ouvidas judicialmente, desnecessárias outras considerações neste momento. Oportunamente, sendo necessário para a análise das teses das doutas Defesas a elas pode se voltar. Os depoimentos são secundários, perto das demais provas documentais e periciais do INC.
Às fls. 1456/1465 estão cópias de denúncia do MPF contra vários réus, todos do Hospital da Irmandade da Santa Casa de Poços de Caldas, que entre janeiro de 2001 e janeiro de 2002 “obtiveram vantagem ilícita, para si ou para outrem, em prejuízo do Ministério da Saúde, que foi induzido em erro MEDIANTE FATURAMENTO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE DE MEDICAMENTOS E PROCEDIMENTOS MÉDICOS NÃO MINISTRADOS”. A fraude lesou os cofres públicos em mais de 180 mil reais, dinheiro da época. A denúncia se refere a mesma AUDITORIA N. 3/2002, já citada nesses autos exaustivamente e tem pertinência, portanto, com o presente processo. Pertinência que se deduz, ainda, no item c à f. 1459, de cobrança de angiografia cerebral, “QUE EM VERDADE, JAMAIS FORAM EFETUADOS”. Acredito, com base em todas as provas dos autos até agora vistos, bem como nos processos já estudados ou julgados, que A ARTERIOGRAFIA da vítima Paulo Lourenço JAMAIS FOI FEITA, pois não consta nos autos ou em lugar algum as chapas do suposto exame, tal qual se viu no Caso Pavesi. O laudo foi feito a posteriori, tanto que não constou na Auditoria do DENASUS. Todos os réus que disseram ter visto as chapas MENTIRAM, como também mentiu e vem mentindo o réu JEFERSON, que mentiu inclusive na CPI DO TRÁFICO DE ÓRGÃOS, vide apensos 4 e 5) e ali foi desmascarado (como visto na Sentença do Caso Pavesi).
Às fls. 1472/1495 encontra-se cópia da Auditoria n. 33/00, que comprova diversas irregularidades e ilegalidades no âmbito do Hospital Pedro Sanches e Hospital da Santa Casa, como se viu na sentença do Caso Pavesi. Tal relatório resultou no descredenciamento, à época, do Hospital Pedro Sanches para atendimento pelo SUS e no fim dos transplantes da Santa Casa. Fique claro que a Auditoria constatou diversas ilegalidades em outros casos de transplantes além do da criança Pavesi, ficando também evidenciada a ilegalidade da pseudo central MG-Sul Transplantes e sua lista própria de receptores.
Às fls. 1576/1614 foram juntados dois “PARECERES” médico-legal encomendados pela Defesa de JOÃO e CLÁUDIO. Sobre tais pareceres, o MP se manifestou satisfatoriamente às fls. 1752/1753, e em sendo ENCOMENDADOS “É um parecer realizado sob encomenda do réu não possui nenhum valor probante”. Ainda mais depois de três LAUDOS PERICIAIS oficiais que analisaram e voltaram a analisar (até sob contraditório) todas as questões pertinentes produzidos por um órgão da reputação do Instituto Nacional de Criminalística (INC), com sede em Brasília/DF. Não escapou a este julgador que foi feito mesmo “sob encomenda”, ainda que por profissionais aparentemente sem máculas, pois produzidos unilateralmente e APÓS as audiências (ocorridas em JULHO), onde os réus puderam ver todas as questões debatidas e os argumentos da Acusação. Um parecer, de modo geral, obedece aos interesses de quem o encomendou e pagou por ele. Despiciendas maiores considerações. Como o juiz não fica adstrito a nenhum laudo ou perícia, muito menos em relação a um mero parecer, que não passa de uma opinião, ainda que de profissional com reputação. O que ali consta não está de acordo com a suma probatória dos autos, com o conjunto da prova. Ademais, os quesitos apresentados aos pareceristas foram parciais e englobando aspectos que poderiam favorecê-los e não abordando a totalidade das questões. Por exemplo: a ingestão de droga depressora do SNC (no caso, álcool) impediria a continuação do protocolo de morte encefálica, nos termos da Res. n. 1480/97. Ademais, não se encontra prova inconteste nos autos que o exame de arteriografia tenha sido mesmo realizado, pois a Auditoria não encontrou o laudo ou as chapas, menos de um ano após os fatos.
O termo de interrogatório da ré ALESSANDRA, por precatória está às fls. 1643/1645 e a ele voltaremos, oportunamente, caso necessário.
Testemunhas de defesa às fls. 1683/1686,1808,2007, ouvidas por precatória, nada acrescentaram ao deslinde do feito.
Testemunha arrolada pela Acusação ouvida à f. 1792, por precatória, com participação de advogados dos réus. Nada acrescentou ao já contido nos autos.
Juntada de declaração unilateral pela Defesa de JEFERSON, datada de 5/9/2014, vaga “há vários anos”, para tentar justificar a ausência das chapas da suposta arteriografia, que deveria estar no prontuário médico juntado aos autos, mas nunca foi juntada, pois o exame de arteriografia NUNCA FOI FEITO.
Ouvida de testemunha de Defesa à f. 1835 esclarecendo as condições do exame que desprezou os rins da vítima P.L.A.
Ouvida de testemunhas arroladas pela Defesa à f. 1889, havendo a desistência da ouvida de uma delas.
Juntada da ouvida da testemunha ROSANE ELIZABETE às fls. 1979/1982, inclusive em juízo, referente a caso conexo.
Diz a ilustre Defesa do réu JEFERSON SKULSKI em seus memoriais às fls.1958/1969 que as provas são contrárias à Acusação. Não lhe assiste razão, até mesmo pelo que se viu da análise probatória até o presente momento. O suposto exame de angiografia cerebral que teria sido feito pelo réu, utilizou técnica diversa da preconizada, conforme os peritos do juízo. Primeiro, porque o exame nem mesmo foi feito, da mesma forma que ocorreu no Caso Pavesi e já foi analisado linhas atrás. Não há chapas e o laudo foi feito posteriormente aos fatos (a Auditoria não localizou nenhum dos dois, laudo ou chapas) Segundo, que o Parecer citado, não prova nada, além de tudo feito sob encomenda. Que um exame de arteriografia é complementar, etc, etc. ninguém está discutindo. Ainda que o exame tivesse sido feito, o que não acredito, não se poderia prosseguir com o fraudado diagnóstico de morte encefálica porque a vítima havia ingerido droga depressora do SNC e tal é proibido pela Res. n. 1480/97.
O interrogatório do réu JEFERSON SKULSKI foi transcrito pelo MP às fls. 1730/1734, desnecessária nova transcrição para não alongar mais esta sentença. Sobre a ingestão de álcool pela vítima, a questão ficou bem esclarecida pelos peritos oficiais, desnecessária novas considerações. Como bem disse o MP à f. 1736, JEFERSON SKULSKI incorreu em várias contradições e não apresentou nenhuma justificativa para não ter, supostamente, utilizado a arteriografia de 4 vasos. Mesmo afirmando que o álcool não interferiria na arteriografia, NADA DISSE sobre o fato do álcool ser depressor do SNC e portanto, o protocolo de ME não poderia ter sido instaurado ou deveria ser imediatamente INTERROMPIDO, nos termos do item A.2,B da Res. n. 1480/97. De todo modo, o Laudo pericial às fls. 337/350 afirma que a ingestão de álcool poderia interferir no exame de arteriografia, ao contrário do que afirmam os réus. Mas a afirmativa de um réu não beneficia nada a outro, pois agiam em Organização Criminosa, com divisão de tarefas e lideranças claras. Mas o próprio réu JOÃO confessa que a ingestão de álcool “é prejudicial ao diagnóstico de morte encefálica” (fls. 1409/1411, citado pelo MP à f. 1737). A testemunha da defesa JULIO CÉSAR, fls. 1399/1402 admitiu: “que a ingestão de álcool pode prejudicar o diagnóstico de morte encefálica, pelo que está no protocolo, pois se trata de droga”. As semelhanças ou “coincidências” com o Caso Pavesi foram apontadas pelo MP à f. 1737: “Dentre os documentos auditados não constava o Laudo da Arteriografia de Paulo Lourenço (fl. 27, Apenso1), '‘coincidentemente’' como aconteceu no Caso Paulo Pavesi, de amplo conhecimento público”. Os réus JOÃO e o médico indiciado FELIX não viram o tal laudo. PAULO CÉSAR, mesmo mentindo, disse ter tido acesso VISUAL ao exame, nada falando do laudo. JEFERSON SKULSKI tenta a todo custo eximir de sua responsabilidade ou usar o velho truque de jogar para cima de terceiros, como bem afirmou o MP. Disse que “não tinha a informação” sobre a ingestão de álcool pela vítima, mas tal informação CONSTAVA no prontuário. Atribuiu a responsabilidade pela morte da vítima “a quem realizou o exame clínico” (MP, f.1738). Quanto a suposta não juntada do suposto laudo ao prontuário, tenta lançar a responsabilidade a funcionários subalternos. Como bem asseverou o parquet, após analisar todas as Defesas,”Por tudo que foi exposto, conclui-se que a vítima não estava morta quando da realização do exame clínico” (f. 1738). Reforça tal conclusão o fato da vítima ter sido classificada naquele mesmo dia (16/01) como Glasgow 6 (segundo o réu JOÃO, paciente nesse nível é passível de recuperação), do mesmo modo a testemunha BENEDITA, que afirmou que quando saiu de seu plantão a vítima estava viva. JEFERSON SKULSKI é um dos piores criminosos, pois um dos mais inteligentes. Infelizmente, somente foi denunciado nesses autos, mas participou e ajudou em várias mortes. Mas a sua inteligência e cara de bonzinho não enganou os Congressistas da CPI, como se vê no apenso 4, bem abordado pelo MP às fls. 1750/1751. Tampouco enganou a este magistrado, velho, alquebrado, mas com experiência em velhacaria.
As teses da Defesa de PAULO CÉSAR, estão às fls. 1902/1954. Primeiramente a Defesa pretende se valer de uma decisão do TRF, cível, que julgou um caso de improbidade administrativa. Para não perder tempo, vou usar os mesmos argumentos que utilizei no conexo Caso 2, aliás, o advogado é o mesmo. Em alentadas 8 laudas, quis a ilustre Defesa se louvar em decisão do TRF da 1a Região, que tratou de questão afeta a processo de improbidade administrativa (fls. 811/818), juntando ainda as cópias às fls. 828/837. Mesmo que de tais documentos não se tenha dado vista ao MP, tanto que as alegações finais ministeriais nem tratam de tal assunto, vejo que melhor sorte não socorre ao réu. Tais documentos foram juntados nos processos conexos e foram em primeiro lugar mencionados pela defesa do réu JOSÉ JÚLIO BALDUCCI, que também a transcreveu à f. 2191. Por óbvio que se trata de processo CÍVEL e não criminal, não havendo nenhuma repercussão ou relevância nos processos criminais. Não se sabe das provas existentes em tal processo da Justiça Federal e os motivos que levaram seus julgadores aquelas conclusões ali expostas. Por força de lei, não posso tecer crítica a nenhuma decisão judicial, mas tenho que dizer que o tráfico de órgãos ficou demonstrado em alguns dos processos já julgados, inclusive reconhecido pelo E. TJMG, como se vê nesses autos. Da mesma forma, as ilegalidades e irregularidades no Sistema de Transplantes em Poços de Caldas restaram cabalmente demonstradas, a infringência ao prescrito na Lei de Transplantes (Lei n. 9434/97) bem como ao Protocolo de Morte Encefálica (Resolução n. 1480/97). A equipe de transplantes da Santa Casa utilizava formulários defasados, ainda da legislação anterior, com exames e tempos não mais recomendados . Não se faziam as necrópsias, como mencionado e não se respeitava a lista única de receptores de órgãos. As famílias dos receptores tinham que pagar pelos órgãos, disfarçados de “doações”, inclusive há prova documental, além de depoimentos como o de Raimundo Coutinho, perante a CPI, documento em anexo. Ficou muito claro que o gestor estadual (MG Transplantes) tentou “inocentar” a equipe de Poços de Caldas, até mesmo para tentar esconder a sua incompetência ou livrar sua responsabilidade, uma vez que tinha a obrigação de fiscalizar todas as ações. A suposta “central”, CNCDO “MG-SUL TRANSPLANTES” era ilegal e clandestina, conforme afirmaram delegados, procuradores, deputados e juízes, tantos quanto se debruçaram nos documentos constantes dos autos. Portanto, não eram meros “equívocos” ou interpretação equivocada da novel legislação. Mesmo porque, a lei, como visto, é de 1997 e os fatos do processo são de 2001, passados 5 anos da promulgação, tempo mais que suficiente para as mudanças nas práticas ilegais.Somente o Ministério da Saúde, Sistema Nacional de Transplantes, tinha o poder de autorizar o funcionamento de uma CNCDO e não a Secretaria Estadual de Saúde. O TRF, ainda mais em uma ação cível, não tinha como dizer se havia ou não havia tráfico de órgãos, mesmo porque certamente na época da ação ainda não havia todos os fatos novos ou não houve a preocupação da juntada dos relevantes documentos naqueles autos, como o Relatório da CPI do Tráfico de Órgãos e outros. Em outros processos, inclusive nas sentenças juntadas a estes autos, afirmei que o fatiamento dos inquéritos propiciou julgamentos equivocados, especialmente por parte da Justiça Federal. A questão da autorização ou não do Hospital para a realização dos transplantes, nada reflete. Se não fossem todos os fatos descobertos, da ação da Máfia, o hospital teria sido novamente credenciado e tal fato não ocorreu até os dias de hoje. Em resumo, a central MG-SUL era sim clandestina e ilegal, havia listas próprias em Poços de Caldas, fraudando a lista única, não eram feitas necrópsias, não era seguido o protocolo de morte encefálica do CFM e havia o tráfico de órgãos, tanto é que médicos já foram condenados, com a sentença confirmada em 2o grau, por tais práticas criminosas pela existência de fartas provas. O resto é conversa para boi ou uma boiada inteira dormir.
Ainda sobre a citada decisão do TRF, bem como da “nota de esclarecimento” do CRM e CFM, veja o que disse o MPE no bojo da ação cautelar n. 0146425-69.2014, em anexo, vide apenso 6: “(…) pois as matérias pagas, além de não refletirem a verdade dos fatos sub judice, são parciais e maliciosas, estando totalmente fora do contexto”. Mais: “Ademais, é de conhecimento geral, que mesmo uma mentira, várias vezes repetida, acaba sendo tomada como verdade” (f.6, grifei).
A Defesa de PAULO CÉSAR depois esgrima as teses da atipicidade da conduta e da ausência de dolo (f. 1929). Tais teses foram apreciadas e afastadas pelo MP às fls. 1701/1702, com razão. A conduta de tal réu e seu animus se enquadram no tipo previsto no § 4o do art. 14 da Lei n. 9434/97. Seu dolo fica patente por ter desprezado a importante informação da ingestão de álcool pela vítima. Sabia que havia ingerido a droga, como o mesmo confessou no seu interrogatório. O protocolo de ME previsto na Res. n. 1480/97 determina a interrupção do diagnóstico quando há presença de droga depressora do SNC e o álcool é depressor. Assim, infringiu a resolução citada, bem como o art. 3o da Lei n. 9434/97, pois atestou em suposto exame clínico, junto com FELIX e com o auxílio de JOÃO, a morte encefálica da vítima. Com isso, permitiu que a vítima, ainda viva, fosse encaminhada para a cirurgia de retirada de órgãos que a levou à morte. A Defesa utiliza os mesmos argumentos que havia usado no Caso Pavesi, ou seja, o livro da Prof. Eliana Vendramini. Portanto, vou fazer as considerações que fiz ali: Sobre o tópico “atipicidade de conduta e da ausência de dolo” (f. 4419), cabe dizer que da conclusão da ilustre professora Eliana Carneiro, sobre as hipóteses que poderiam configurar crime na Lei n. 9434/97, o réu PAULO CÉSAR é enquadrado logo na primeira hipótese (letra “a”: remover tecidos, órgãos ou partes do corpo de pessoa, sem diagnóstico de morte encefálica, a ser constatada e registrada NOS MOLDES DE RESOLUÇÃO DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Destaquei). Como se viu à saciedade neste, no processo do caso 1 e no Caso Pavesi, o diagnóstico não seguiu o protocolo previsto na Res. n. 1480/97 e deveria ter sido interrompido. O réu PAULO CÉSAR atuou e contribuiu na forma do art. 29 do CP. Sua atuação foi decisiva para as condutas dos outros réus que, efetivamente, removeram os órgãos da criança. Sem PAULO CÉSAR, possivelmente ZENUN e CLÁUDIO não teriam operado a vítima, cirurgia que a levou à morte. Depois de morta, ainda lhe foram retirados os glóbulos oculares que foram também vendidos, como comprovado nos autos. PAULO CÉSAR agiu com dolo, pois como já visto, sabia que a vítima estava viva, participava do esquema criminoso e se beneficiava dele. Como asseverei na sentença do Caso Pavesi, a “testemunha” José Osvaldo Darcie atuava no Hospital Pedro Sanches, como se vê à f. 175 do vol.1. Não pode afirmar ou “assegurar que o paciente estava em morte clínica”, pois o mesmo estava massivamente sedado, anestesiado e “NÃO CONHECE TOTALMENTE O PROTOCOLO PREVISTO NA RESOLUÇÃO 1480/97 DO CFM” (como transcrito pela própria Defesa à f. 4423). A causa da morte não foi traumatismo crânio encefálico (TCE), mais à frente vou analisar o restante da prova testemunhal e o laudo de exumação citado à f. 4423. A criança foi morta, sem sombra de dúvidas pelos médicos conluiados do Pedro Sanches e SANTA CASA, que atuavam sob a orientação de MOSCONI e IANHEZ. Poços de Caldas, aparentemente tranquilo local de descanso de idosos (e antigamente local para lua de mel de recém-casados) não tinha tantos acidentes (TCE) e AVC’s para se tornar a recordista de transplantes do estado! Nem se estivesse localizada às margens da rodovia 381 (que liga SP a BH) Poços de Caldas teria tantos acidentes assim. O documento às fls. 198/199 (autorização para doação) está assinado APENAS PELO PAI, o que contraria frontalmente a Lei n. 9434/97, além de estar com a data rasurada (pois foi feita DEPOIS DA RETIRADA ILEGAL DOS ÓRGÃOS). O fato é que o diagnóstico de morte encefálica da vítima P.L.A foi TODO ELE FORJADO, UM VERDADEIRO ENGODO, como já demonstrado.
Como já dito, a Perícia diz que o álcool pode interferir nos exames. Mas em todo caso, com a ingestão de álcool o protocolo não poderia ter prosseguido, nos termos da Resolução n. 1480/97, fato não mencionado por nenhuma Defesa.
Também a Defesa de PAULO CÉSAR, como as demais, tenta se louva no Parecer particular já mencionado. Certamente devem ter feito um “consórcio” para remunerar os pareceristas . A Defesa ainda confunde “prova pericial” com o parecer particular juntado pela Defesa de JOÃO e CLÁUDIO . O fato do estado da vítima ser grave não exime os réus, dentre eles PAULO CÉSAR, de suas responsabilidades e atitudes dolosas, ao fraudarem o protocolo de morte encefálica, usarem um modelo defasado e que não continha todos os requisitos para um diagnóstico (seria mais prognóstico) seguro sobre a morte encefálica da vítima que não ocorreu. O paciente morreu de choque hipovolêmico, depois da retirada em bloco de seus rins e a não sutura das artérias, como mencionei na sentença Pavesi e consta do livro de Kalume. A prova dos autos é segura que NÃO FOI PRESTADA TODA A ASSISTÊNCIA DEVIDA À VÍTIMA. Não foi feita medição da pressão intracraniana, não foi feita cirurgia descompressiva, nem monitor cardíaco tinha, a vítima- apesar do estado grave- reconhecida pela própria Defesa, NÃO FOI ENCAMINHADA LOGO A UTI, só teve a 1a avaliação médica muitas horas depois de ter chegado a Santa Casa. A suposta falta de vaga de UTI na Santa Casa não pode justificar os fatos: poderia ter sido improvisada a UTI, poderia ser conseguida em outro hospital, como disse a Diretora Clínica da S. Casa à época, Regina Cioffi, em processo conexo. É mentira que a vítima foi mantida “em condições similares”. Como se viu pelos depoimentos prestados e pela Auditoria, não havia todos os equipamentos na Sala em que ficou a vítima. A testemunha citada pela Defesa à f. 1943, BENEDITA, disse que a sala tinha ALGUNS aparelhos de UTI. Portanto, “alguns” está longe de todos aparelhos ou mesmo os mais importantes para o suporte adequado de uma vida. A menos que essa vida já não importasse nada, apenas se estava de olho na MANUTENÇÃO DOS ÓRGÃOS que seriam retirados logo, logo. O que adianta verificar a PA e não monitorar o PIC (pressão intracraniana)? Não foi pedido nenhum exame além da tomografia feita inicialmente. O réu PAULO CÉSAR declarou de forma espantosa, não conhecer a Res. n. 1480/97, mesmo trabalhando por muitos anos com transplantes de órgãos, como também o disseram vários réus neste e em casos conexos. Disse, ainda, desconhecer ou não se lembrar de falhas em prontuários, mas a Auditoria elencou vários casos. Como bem disse o MP: “Afinal, é na desordem e na balbúrdia que impera a criminalidade” (f. 1735).Quer ainda a Defesa de PAULO CÉSAR, como as demais, dizer que o formulário do MG-SUL TRANSPLANTES (Critério recomendado) é equivalente ao Termo de Declaração de Morte Encefálica presente no anexo da Res. n. 1480/97 do CFM. Ledo engano e a prova pericial (laudo oficial, não um mero parecer particular) provou isso de maneira clara, bem como a prova testemunhal produzida em audiência. Não se trata de mera nomenclatura, há diferenças que desnaturam a certeza que deve ter um procedimento de tal gravidade. A própria Defesa admitiu à f. 1947, “apesar das diferenças entre os formulários”.
O vínculo subjetivo entre as condutas de PAULO CÉSAR e dos demais réus é claríssima. Além de PAULO CÉSAR vir defendendo os transplantadores com unhas e dentes, mesmo que na condição de presidente da Associação dos Médicos de Poços de Caldas, claro está que agia até em causa própria. Todos são conhecidos, trabalham juntos, a maioria já trabalhou ou trabalha no Pedro Sanches e na Santa Casa. Como visto, em ação concertada uma Organização Criminosa que visava o maior lucro possível no menor tempo possível,com prática de ações criminosas de forma duradoura na Santa Casa, sendo as vítimas pessoas de menor poder aquisitivo e pouca instrução. Assim, incabível as teses de negativa de autoria, bem como de desclassificação para outro delito manejados pela douta Defesa. De forma alguma, como garante a acusação, se admite que a vítima já estivesse morta no momento da cirurgia. Estava viva e tal fato está comprovado nos autos.
Os memoriais do réu CLÁUDIO estão às fls. 2020/2036 e quase não entra no mérito da acusação, preferindo ficar nas preliminares (já afastadas). A mesma coisa para o réu JOÃO, atolado até o pescoço nos casos de transplantes. Mas tal não passa de estratégia de advogado, não quer adiantar seus argumentos (se é que os têm), já sabendo que serão afastados, um a um, pelas sólidas provas dos autos e os sóbrios e firmes argumentos do douto Promotor de Justiça.
Assim, a defesa só começa na página 10:
Para o Ministério Público, os cirurgiões (Cláudio Rogério e Saulo Zenun) e o anestesista (José Júlio Balducci) que participaram da cirurgia de retirada dos rins doados por Paulo Lourenço Alves causaram a morte deste paciente.
Mas a verdade é essa mesma. Os “experts” citados à f. 2031, são os nobres pareceristas contratados e já mencionados alhures. Da mesma forma que a ilustre Defesa do réu PAULO CÉSAR, a Defesa de CLÁUDIO e JOÃO incide no “engano” de chamar os ilustres subscritores do parecer de “peritos”. Ora, as perícias oficiais, cujos laudos se encontram nos autos já foram bem analisados e suas conclusões estão de acordo com as demais provas dos autos. O que consta no parecer de fls. 1597/1614, não pode ser chamado pelo mesmo nome, pois nada prova. Só menciona o que entende favorecer os réus citados e seus colegas. Tenta desmerecer as conclusões dos peritos do Instituto Nacional de Criminalística, instituição muito respeitada no meio jurídico. Como a questão já foi aclarada, desnecessárias maiores considerações para economizar papel.
A Defesa fala em “inequívoca constatação de morte encefálica”. Entretanto, a questão também já foi enfrentada e se vê que mesmo a realização da arteriografia pelo réu JEFERSON SKULSKI não ficou provada e esse réu é reincidente em mentir, até como testemunha (vide Caso Pavesi, Relatório da CPI e notas taquigráficas constantes dos autos). Reconhece que o modelo “Critério Recomendado”, NÃO É IDÊNTICO ao preconizado pela Res. n. 1480/97, mas decididamente os “parâmetros neurológicos” não são os mesmos (vide Auditoria e Laudos periciais). O “critério” do MG-Sul usa bibliografia defasada (1978) e a própria testemunha de defesa, Júlio César, critica e diz que os médicos teriam que se preparar melhor. O diagnóstico clínico já foi forjado e o protocolo nem mesmo poderia ter sido iniciado ou deveria ter sido interrompido pela ingestão de droga depressora do SNC (álcool, fato inconteste, presente no prontuário médico da vítima e por depoimento do médico que prestou a 1a assistência na policlínica). A Defesa não menciona tal fato e se entende o motivo.
Todas as Defesas, mais uma vez, invocam o agora “inimputável” FELIX GAMARRA, que mais uma vez é a “Geni”: pode jogar tudo nele! O inolvidável “Bom para UTI” é o responsável por tudo, fez tudo sozinho, se “equivocou” ao preencher o horário do óbito, coitadinho. Mas o “pobre” Dr. Felix, o peruano naturalizado brasileiro, TRABALHA ATÉ HOJE NA SANTA CASA, mesmo depois de tudo que se descobriu, MESMO TENDO TANTA INCOMPETÊNCIA que até erra, melhor, se equivoca, em preencher um simples documento. Tal qual no Caso Pavesi, são apenas os detalhes. Ah, os detalhes! De certo que deve ter outras qualidades, como uma obediência e lealdade canina aos donos, digo, aos chefes. Veja a propósito, o que se constou por ocasião do julgamento do Caso Pavesi:
Assim é mais fácil. “Não temos nada com o que foi feito antes”, “nada sei sobre protocolo de morte encefálica”, “o paciente já chegou entubado”, “temos que confiar no colega que atendeu antes”, “o meu cliente era o neurologista”, “não era de meu conhecimento ou da literatura da época”, “os defendentes jamais participaram do atendimento da vítima”, tudo não passe de um mero erro formal, de uma coisa sem importância. Tanto é que a defesa fica quase que tão somente em preliminares, quando chega ao mérito, ao fundo da questão, é feita genericamente, tentando deliberadamente tirar a importância, a seriedade das coisas, de modo até desrespeitoso com tantos quantos trabalharam arduamente -excluindo os que tentaram desvirtuar os fatos- no caso, por todos esses anos. Então, tudo não passou de um mero engano? Tudo não passou de um lapso? Meros detalhes?
Da conduta do réu CLÁUDIO. Se examinasse os documentos, não operaria. Se examinou os documentos dos autos (prontuário) e ainda assim, operou, agiu dolosa e premeditadamente para levar a vítima à morte. O dolo, na melhor das hipóteses, é eventual, assumiu o risco. Sobre o pretenso “princípio da confiança”, mencionado pela Defesa, deve se rever o que já disse em decisão anterior:
Ainda é de bom alvitre observar o que disse o Des. WALTER LUIZ DE MELO, por ocasião do julgamento do HC n. 1.0000.13.008674-7/000, julgado em 4.4.13, que trata, verdadeiramente, do que se denominou Princípio da Confiança no juiz da causa:
Pela importância, deixo registrado: ninguém melhor que o juiz da causa, que tem contato direto com o indiciado/paciente e possíveis testemunhas, para perceber, nas entrelinhas do processo, a realidade dos fatos que estão sob seu exame. (p.3, destaquei).
Ao contrário do alegado pela Defesa, cabe o médico consciencioso checar sim o que fez o colega, examinar com cautela os documentos e se for o caso, não prosseguir nos procedimentos se houver dúvida.
Os memoriais defensivos relativos ao réu JOÃO estão às fls. 2038/2060 e, de início, critica a “pretensão didática” da peça inaugural, tão somente por ter colocado em tópicos separados a conduta criminosa de cada réu (f.2040). Depois, nas 9 laudas seguintes se esforça para tentar emplacar alguma preliminar. Mas todas já foram analisadas e afastadas. Em seguida, passa a discorrer sobre o grave estado da vítima e afirma, sem nenhuma razão, que o atendimento dado pelos réus (incluindo e principalmente o réu JOÃO) teria sido adequado. Tal questão foi convenientemente debatida e afastada por ocasião dos comentários relativos à Auditoria e aos laudos periciais, confirmados pela prova produzida em audiência.
Como já visto na análise da Defesa de CLÁUDIO, se confunde experts com a verdadeira perícia, com peritos oficiais. Não vou novamente me manifestar sobre esse ponto, pois seria por demais repetitivo. Uma coisa é parecer, outra é perícia. Uma, contratada, de interesse de alguém, outra, com a finalidade de auxiliar o juízo no esclarecimento de algum ponto específico ou que necessite de conhecimento especializado. O juiz, como é cediço, não fica adstrito a nenhum laudo, muito menos parecer sob encomenda de parte.
Nada reflete ou ilumina a questão se JOÃO foi ou não o primeiro médico a atender a vítima. O primeiro foi o médico da policlínica, ninguém questiona. JOÃO foi o primeiro a fazer uma avaliação clínica da vítima NA SANTA CASA e várias horas depois de sua admissão na Santa Casa. A ilustre Defesa quer confundir e não explicar, data vênia. O réu JOÃO participou do diagnóstico de morte encefálica, o que lhe era defeso. Sobre a conduta criminosa de FELIX, JOÃO ALBERTO, PAULO CÉSAR e JEFERSON SKULSKI, assim se manifestou o MP:
(…) motivados por obtenção de vantagem pessoal com a futura realização de transplantes, aproveitaram-se da situação de humildade do paciente e de sua família, bem como do quadro grave que ele se encontrava, para encaminhá-lo para cirurgia que lhe causou a morte. Para tanto, omitiram informações importantes, simularam a realização de exame, alteraram e rasuraram documentos, tudo com a finalidade de dificultar a descoberta da verdadeira intenção criminosa. (f. 1708).
A Defesa se omite, tal qual as anteriores, e nada diz sobre o fato da ingestão de álcool pela vítima (droga depressora do SNC) deveria obstar o prosseguimento do protocolo de morte encefálica, nos termos preconizados pela Res. CFM n. 1480/97. As demais questões sobre as diferenças entre o documento “critério” e o recomendado pelo CFM já foram abordadas. O réu JOÃO, como mencionado era um “faz tudo” ou “pau pra toda obra” da organização. Era uma espécie de “menino de recados” de IANHEZ, seu chefe. Veja o que disse a respeito desse réu, a médica ALESSANDRA:
Que os contatos que teve com JOÃO ALBERTO foram no consultório do Dr. Álvaro (…). Que o Dr. JOÃO era um médico jovem nefrologista e trabalhava junto com o Dr. Alvaro com se fosse um assessor, um auxiliar, e por isso é que ele estava no consultório do Dr. Alvaro naquelas ocasiões em que a interrogada lá esteve conforme acima já declarado. (f. 1644).
Decisão às fls. 2068/2072, autoexplicativa, relativas as Defesas, especialmente a do réu JÚLIO BALDUCCI, que nessa altura, um pouco desesperado, tentou criar uma nulidade, um caso, não apresentando seus memoriais, como os demais, tentando dizer que não lhe foi disponibilizada mídia. Mas aquele que dá causa a uma nulidade, não pode se aproveitar de sua própria desídia ou torpeza, como entende a maior parte da jurisprudência pátria. BALDUCCI constituiu outros advogados, mas estes mesmos afirmaram a este magistrado que os antigos continuariam na Defesa (fato comprovado pela certidão à f. 2160). Ante o impasse, e com a obrigação de dar andamento ao feito, nomeei defensor dativo às custa do réu para apresentar os memoriais. Passo a analisar a Defesa às fls. 2075/2103, apresentada por digno e zeloso advogado,
Cabe ainda a observação já feita por mim, conforme consta da Ata da AIJ, as gravações da audiência poderiam ser utilizadas, caso houvesse alguma dúvida ou questão suscitada, o que não ocorreu. Por isso, o juízo não dispõe de nenhuma mídia e a maior parte dos dias as gravações foram feitas por cinegrafistas de TV.
Depois dos despachos e decisão de impulso ao feito, após o ofício à OAB, depois de já apresentados os memoriais pelo ilustre defensor dativo, ainda assim, a suposta Defesa de BALDUCCI novamente atravessou a petição de fls. 2105/2109, procurando justificar sua condenável atitude. É mentira que tenha sido negada qualquer carga dos autos, muito menos para cópias. Os autos ficaram em cartório, pois vários os réus, mas sempre à disposição. Como já afirmei, os antigos procuradores (KUNTZ) ainda estão no processo, não havendo nenhuma declaração em contrário do réu ou deles próprios renunciando ao mandato, ficando convenientemente silentes para tentar se aproveitar da situação criada por eles mesmos. Portanto, a nomeação do dativo foi regular e não houve nenhuma contradição. Caso houvesse, poderiam ter esgrimido um recurso, mandado de segurança ou habeas corpus, o que não foi feito.
De todo modo, por prudência, baixei os autos em diligência, abrindo vista as partes para apresentação de memoriais, querendo, para ratificar ou retificar os memoriais já apresentados, exatamente para se evitar qualquer alegação futura de nulidade.
Diz a ilustre Defesa dativa de BALDUCCI que o réu é inocente.Há controvérsias. As preliminares até às fls. 2085 já foram apreciadas e afastadas pelo juízo. No mérito, afirma o estado grave da vítima e nega a autoria criminosa. Diz que o anestesista não é o responsável pela não transferência da vítima para uma UTI, que todo o cuidado foi dispensado (no que se equivoca, como se viu).Não se trata de crime impossível, pois como provado, a vítima estava viva quando foi para a mesa de cirurgia. O próprio horário da morte no atestado prova isso. Não houve nenhum exame de angiografia, sendo esse o MAIOR ENGODO, da mesma forma que provado no Caso Pavesi. Presentes os nexos causais e guardam nexo com o resultado (morte). Como bem disse o MP à f. 1718, tanto CLÁUDIO, quanto o réu BALDUCCI, afirmaram que o laudo da suposta e improvável arteriografia estavam no prontuário da vítima “outra discrepância com a realidade fática, o que será comprovado adiante”. Antes de iniciar a cirurgia ou os procedimentos anestésicos deveriam verificar se todos os procedimentos obrigatórios foram cumpridos, como estabelece a lei de transplantes (MP, f. 1719). O documento “critério recomendado” não serve para o fim que se propôs, está em desconformidade com a Res. n. 1480/97, como já exaustivamente demonstrado. Disse o MP: “Logo, não é simples questão de semântica, como aduziram os réus Cláudio e José Júlio”. As testemunhas Rosane Amaral e Júlio César, além da Auditoria e Laudos Periciais, provaram tais fatos. Ao ser ouvido em juízo, demonstrou afastamento com o ex-deputado de má reputação, disputou cargo com a mulher do ex-deputado, foi vetado por este para participar da cúpula do PSDB no diretório municipal e fez questão de afirmar: que “deseja acrescentar que não possui qualquer vínculo de amizade com o referido parlamentar” (f. 1418). Respondendo a perguntas de seu nobre advogado, disse: “foi relacionado o meu nome ao do Dr. Carlos Mosconi, e a minhas palavras hoje foram para demonstrar que eu não tenho motivo para ter ligações com o deputado” (f. 1419). Porém, como magistrado, devo reconhecer que o benefício da dúvida milita a favor de JOSÉ JÚLIO, que só entrou para o PSDB para assumir cargo público e não tem maiores ligações com a Máfia do Tráfico, não fazia parte da equipe de transplantadores, não ajudou a fundar o MG-SUL TRANSPLANTES, como os demais. Acredito até que não tenha maiores contatos com seu cunhado CELSO SCAFI, este sim envolvido até o talo com a Máfia, sendo sócio de MOSCONI. Cunhado não é mesmo parente. Como já disse, linha atrás, foi dos poucos que aceitou responder as minhas perguntas e o fez abertamente. Nem mesmo chegou a ser ouvido na fase inquisitorial. Balducci mentiu em juízo? Claro que mentiu, mas tal fato deve ser entendido como reação do ser humano, em um certo desespero com a grave acusação, como já mencionei. Como já amplamente comprovado não havia nenhum exame de arteriografia, no “critério recomendado”, como mencionou à f. 1418, respondendo a perguntas do MP. Na época dos fatos era Secretário de Saúde do Prefeito Geraldo Thadeu e esteve no PSDB de 1999 a 2002 (exatamente quando eclodiu o Caso Pavesi -2000- e houve a morte do ex-administrador da Santa Casa -2002). Afirmou BALDUCCI que teve contato com a vítima apenas no centro cirúrgico. É muito diferente a situação de BALDUCCI, com a do também anestesista SÉRGIO POLI GASPAR, no Caso Pavesi, POLI foi ouvido e mentiu durante a CPI, sendo também altamente presunçoso. POLI disse não existir a época a classificação ASA VI e aplicou anestesia geral na criança Pavesi. Poli Gaspar chegou a tentar coagir uma testemunha em juízo. Com BALDUCCI não houve nada disso. Assim, é possível que tenha efetivamente sido enganado pelos demais médicos, estes sim tiveram a intenção de remover os órgãos da vítima ainda em vida, participaram de todos os outros casos, e nem mesmo chegou a perceber o real estado da vítima, só tendo participado desse único caso. Por isso, sem maiores delongas vou absolvê-lo da grave imputação, aplicando o brocardo do in dubio pro reo.
A situação da ré ALESSANDRA é diametralmente oposta aos demais réus, bem como CLÁUDIO e JOÃO, o “menino de recados” de IANHEZ, e SCAFI, sócio de Mosconi. ALESSANDRA só ficou em Poços de Caldas de dezembro de 2000 a maio de 2001, não teve tempo ou não quis ou viu os crimes que aqui se cometiam e se afastou. Faço minhas as prudentes considerações do MP às fls. 1742/1746. ALESSANDRA não tinha autorização legal para retirar córneas. Sua alegação que foi “enganada” ou achou que estava legalizada não convencem. Entretanto, dúvidas existem quanto à existência do liame subjetivo da conduta dessa ré com os demais réus e outros já condenados da Máfia dos Transplantes.Só participou da retirada de tecidos dessa vítima. Sua conduta se subsume ao previsto no caput do art. 14 da Lei n. 9434/97, estando prescrita a pretensão punitiva estatal, quanto a ela. Ao exposto, também sem maiores delongas declaro extinta a punibilidade de ALESSANDRA ANGÉLICA QUEIROZ ARAÚJO, como requerido pelo MP.
Afastadas todas as teses das doutas Defesas, de forma fundamentada, devo prosseguir na análise das provas que indicam, indubitavelmente, as autorias por parte dos réus mencionados, CLÁUDIO, JOÃO, JEFERSON e PAULO CÉSAR. Para evitar me estender muito, peço licença para tornar como parte integrante da fundamentação desta sentença, expressamente, o constante dos memoriais do MP às fls. 1688/1754, estando de acordo com as conclusões ali contidas. Para qualquer pessoa de bem, basta uma leitura atenta do que ali contêm para ficar convencido da culpabilidade dos réus mencionados no § 4o do artigo 14 da Lei n. 9434/97, à exceção da ré ALESSANDRA e de JOSÉ JÚLIO, em que houve a desclassificação pretendida por sua douta Defesa, que também trabalhou de forma correta e louvável e a absolvição do outro pela dúvida razoável.
Cumpre agora analisar o descumprimento por parte dos réus dos preceitos legais aplicáveis à espécie, que foram abordados pelo ilustre RMP às fls. de seus memoriais. Reza o art. 3º da Lei n. 9434/97 que a retirada de órgãos ou partes do corpo humano para transplante precisa ser precedida do diagnóstico de constatação de morte encefálica, constatada por dois médicos que não integrem a equipe de transplantes, mediante critérios definidos por Resolução do Conselho Federal de Medicina. Os médicos responsáveis pela remoção dos órgãos e tecidos (os réus) devem verificar previamente se foram seguidos todos os procedimentos obrigatórios, conforme estabelecido pela legislação, incluindo o Decreto n. 2.268/97 (que se encontra às fls. ) e a Resolução CFM n. 1480/97 (cuja cópia está às fls.). Os réus não observaram tais preceitos e nem seus deveres profissionais e éticos. O documento “critério recomendado para o diagnóstico de morte encefálica”, utilizado pela equipe médica está em desconformidade com o prescrito no art. 2º da Res. n. 1480 que diz: “Os dados clínicos e complementares observados quando da caracterização da morte encefálica deverão ser registrados no “Termo de declaração de morte encefálica”, anexo a esta Resolução”. Conforme bem aduziu a douta Acusação: “O termo de declaração de morte encefálica não poderia ter sido substituído por outro condizente apenas com os interesses dos envolvidos”. O art. 16 do Decreto n. 2268 exige dois médicos, um deles neurologista, para o diagnóstico clínico e tecnológico da ME, o que não foi observado. O art. 8º da Res. n. 1480, preconiza: “O Termo de declaração de morte encefálica, devidamente preenchido e assinado, e os exames complementares utilizados para diagnóstico da morte encefálica deverão ser arquivados no próprio prontuário do paciente”. Como já visto, tal exigência de suma importância não foi também cumprida, por isto as auditorias levadas a efeito nos hospitais não encontraram os exames, bem como seus laudos. Então, não podem agora as ilustres Defesas querer alegar que foi realizada uma suposta e improvável arteriografia pois esta nunca foi vista. Mesmo cientes de tais ilegalidades, os réus aceitaram participar da empreitada criminosa, como bem observou o parquet . Tais fatos estão devidamente documentados pela Auditoria e no laudo pericial constantes dos autos. Os médicos não submetiam os doadores cadáveres ou os cadáveres dos doadores à necrópsia, como determina a lei (art. 8º da Lei n. 9434/97).
Portanto, a convenção citada entre a Delegacia Regional e a SANTA CASA, só serviu para tentar dar “aparência de legalidade” a “ações ilícitas/imorais”, nas palavras do Promotor de Justiça. Tudo que se constou nas sentenças do Caso 1 e Pavesi, cabe agora na análise do Caso 5. Senão vejamos, tal a similitude dos casos, especialmente do segundo.
Os réus tinham conhecimento e participavam das atividades da ONG MG-SUL TRANSPLANTES, idealizada e comandada por MOSCONI e IANHEZ, sendo que CELSO SCAFI dividia consultório médico com o primeiro, que tudo fez para livrá-lo dos processos. Tal organização, ilegal e clandestina, operava lista própria, cobrava pelos transplantes (e também do SUS), além de funcionar DENTRO da SANTA CASA (que pagava os salários dos réus e o aluguel de tal entidade). Os réus conheciam as atividades da entidade PRORIM, que pelos seus estatutos (escritos sob a supervisão do já advogado da Santa Casa SÉRGIO LOPES) prometia PRIORIDADE nas cirurgias de implantes e ajudava a gerenciar a lista, que desobedecia a LISTA ÚNICA, inclusive era interestadual, descumprindo o determinado no art. 10 da Lei n. 9434; art. 4º, incisos II, III e IV e parágrafo quarto do art. 24 todos do Decreto n. 2.268/97. A Auditoria n. 33/00 (presente neste processo do Caso 5)constatou o desrespeito a tais preceitos legais relativos à lista única de receptores, o que dava transparência e respeito ao Sistema Nacional de Transplantes. Sobre o desrespeito à lista e ao comércio de órgãos por parte dos réus e aditados, o MP apontou no Caso Pavesi, os depoimentos de JOÃO CARLOS ARAÚJO e SEBASTIÃO COUTINHO, ambos ouvidos na CPI DO TRÁFICO, havendo cópia do recibo naqueles autos. Os fatos foram confirmados ainda pela Secretária da MG-SUL, Adelaide, pelo depoimento de Sirlene Bonin, cujo filho pagou por uma das córneas extraídas da criança Pavesi, e por Carmelita Sampaio, mãe de outro menor, que recebeu a outra córnea, ambos operados no privado Instituto Penido Burnier, como se vê da sentença citada. Vale transcrever a conclusão do RMP, Dr. Marcelo Mattar, sobre o ponto:
Assim, denota-se que os réus tinham o pleno conhecimento das atividades da MG SUL Transplantes e, por conseguinte, das condutas ilícitas praticadas por esta Central e pelos médicos atuantes na Santa Casa.
Isso porque os réus prestavam serviços na Santa Casa de Poços de Caldas, entidade na qual eram realizados todos os transplantes de órgãos da cidade, inclusive, a instituição MG SUL funcionou por determinado período nas dependências do referido hospital (v. cabeçalho fls. 4182,vol.17). Fato é que Celso Scafi e Cláudio Rogério compunham a equipe especializada em transplantes, sendo responsáveis pela maioria dos transplantes de rins realizados naquele município, assim como o anestesista Sérgio Poli que, embora não fizesse parte desta equipe, declarou já ter participado de várias cirurgias de retirada de órgãos de doadores cadáveres (fls. 4363/4364, destaquei, sentença Caso Pavesi).
Tais fatos se comprovam por várias passagens dos autos, declarações dos próprios réus citados pelo MP, incluindo a testemunha e médico da SANTA CASA, José Tasca, que informou:
(...) que os médicos desta cidade tinham conhecimento da MGSUL; que o Dr. Alvaro foi representante da MGSUL na cidade de Poços de Caldas e região (...) (Depoimento judicial de fls. 2246, vol. 09, citado pelo MP à f. 4365). Destaquei, sentença Caso Pavesi.
Ponto finaliza o douto RMP :
Desta forma, não há dúvidas de que os réus tinham conhecimento das condutas ilícitas praticadas pela MG SUL TRANSPLANTES e da fraude à lista única de receptores e, mesmo assim, aceitaram participar do intento criminoso .
Até o presente momento, já ficou patente e esclarecido o fato da desorganização da SANTA CASA, com rasuras, assinaturas não identificadas, sem carimbo, exames faltantes ou não realizados, constatados pela Auditoria e testemunhos constantes dos autos, fatos oportunamente utilizados para facilitar e acobertar os crimes ali praticados. Sobre tratamento inadequado ao paciente e irregularidades no diagnóstico de morte encefálica, muito se disse até o momento. De idêntico modo, sobre participação de médico, que cuida do paciente e diagnostica morte encefálica, na equipe de transplantes está já bem examinado até agora e vale transcrever:
Sobre o desrespeito à lista única de receptores prevista no art. 10 da Lei n. 9434/97 e artigos quarto, sétimo e vinte e quatro do Decreto-Lei n. 2268/97, além da Portaria 3.407/1998 do Ministério da Saúde (artigos 33 a 35), muito bem enfocada no relatório do Delegado Federal às fls. 716/717, ao qual se remete, houve contradição entre os réus e “jogo de empurra”. Disse CELSO SCAFI (fls. 1288/1290) “tem conhecimento que o MG TRANSPLANTES com sede em BH pedia, quando havia doadores, que fosse utilizada a lista da SANTA CASA de Poços de Caldas; (...)”. Por seu turno, CLÁUDIO ROGÉRIO (fls. 1284/1287) afirmou: “perguntado quem controlava a lista de receptores à época dos fatos, respondeu que ‘quem controlava a lista era a central regional com sede em Pouso Alegre, cujo coordenador era o Dr. Lauro Santos, que possivelmente a encaminhava a comissão intra hospitalar ou ao centro de hemodiálise (...); acredita que a central estadual com sede em Belo Horizonte também ‘tutelava a obediência à lista’;” .
Sobre a ilegalidade da MG-SUL TRANSPLANTES e da prática do comércio de órgãos humanos também alguma coisa já se disse, sendo que basta por agora Ainda está valendo a transcrição:
(O Banco de olhos) foram englobados pelo MG-SUL TRANSPLANTES, criado sob a iniciativa do Dr. ALVARO IANHEZ, se recordando também da presença dos médicos CELSO SCAFI, CLÁUDIO ROGÉRIO FERNANDES, JOÃO ALBERTO e outros que não se recorda, no ano mais ou menos de 1997(...). (Sentença CASO 1, f. 3715).
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Dentre as diversas aberrações se vê às fls. 341/342 do vol. 2, do processo do Caso Pavesi, a nomeação por parte do então prefeito de Poços de Caldas, GERALDO THADEU, dos membros do SISTEMA MUNICIPAL DE AUDITORIA CONTROLE E AVALIAÇÃO, constando os nomes de MIRTES BERTOZZI e BERNADETE BALDUCCI SCAFI (mulher do aditado CELSO SCAFI e irmã de JOSÉ JULIO BALDUCCI. À f. 343 daqueles autos, se vê um relatório assinado pela enfermeira BERNADETE SCAFI exatamente sobre o CASO PAVESI, que envolvia, dentre outros o seu marido (quanta ética).
Da sentença do CASO 1 se vê quanto ao tema:
Tudo no HOSPITAL DA IRMANDADE DA SANTA CASA DE POÇOS DE CALDAS era feito numa irresponsabilidade total e ainda por cima com verba pública (seria necessária nova auditoria ali para saber se ainda não persistem todas aquelas mazelas). Mas a morte não era à toa, tinha uma finalidade. Serviria aos propósitos de manter Poços de Caldas como o maior centro transplantador do Estado, atrás apenas da Capital, fato confirmado pela testemunha JOSÉ TASCA, como se verá adiante. Não se olvide que dentro da tabela do SUS os procedimentos com maiores percentuais de ganhos são os relativos aos transplantes e o próprio deputado CARLOS MOSCONI confirmou isso em juízo, apesar de negar quase todas as outras questões, até mesmo se já ouvira falar em entidade PRORIM ou “MG SUL TRANSPLANTES” que ele próprio inspirou, segundo consta, ao participar dos primeiros transplantes na cidade. Consta ainda que todos eram vizinhos de sala : a clínica NEPHROS, de IANHEZ, a Central “MG-Sul Transplantes” dirigida por ele, a entidade PRO RIM –funcionariam na mesma sala ou andar- e o consultório de MOSCONI e CELSO SCAFI, todas localizadas no prédio em frente à SANTA CASA (esta localizada na Praça Francisco Escobar s/n, que custearia o aluguel da Central clandestina, conforme auditoria (...). (f. 3683, p. 24).
Ai está a explicação para a atuação da sofisticada ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA em ação no interior e nas proximidades da SANTA CASA que ceifou a vida da criança PVP e de outros pobres pacientes, tornados - contra a vontade- doadores cadáveres. Organização, a toda evidência, ainda em atividade, vide o espancamento recente da viúva do “Carlão” e outras ações de intimidação em curso, típicas de “Máfia”, até mesmo a forma de “extorsão” de verbas públicas por meio de ameaças de todo tipo . Em vários dos casos, as famílias jamais desconfiaram da trama macabra ou vieram a tomar conhecimento, como se viu após a divulgação da sentença do Caso 1.
É de se ver a declarações da médica nefrologista MIRTES BERTOZZI às fls. 565/566, daqueles autos, que de tão reveladores, dificilmente a mesma o repetiria ou teria a coragem de confirmá-lo nos dias de hoje ou em juízo. Necessária a transcrição, mais uma vez:
Que normalmente a equipe médica da UTI da SANTA CASA notificava a equipe de transplantes da existência de potencial doador e um dos integrantes da equipe se deslocava até a SANTA CASA para verificação e acompanhamento da morte encefálica do doador através de exames neurológicos (arteriografia); que o antigo banco de órgão e olhos de Poços de Caldas foi extinto, sendo que durante a sua existência DR. ALVARO SOLICITAVA DOAÇÕES ESPONTÂNEAS DOS TRANSPLANTADOS;
Comprovado, ainda uma vez mais, o tráfico de órgãos, através das famigeradas “doações” disfarçadas e novamente comprovado através das declarações de ADELAIDE (secretária de IANHEZ) às fls. 578/580, autos do Caso Pavesi:
Que no início os transplantados ou seus familiares doavam espontaneamente dinheiro para o Banco de Olhos, sendo que no caso JUSSÂNIA, transplantada de Pouso Alegre/MG, DR. ALVARO pediu doação (...) que o DR. ALVARO juntamente com o DR. JOÃO (...)
Provadas, portanto, as autorias por parte dos réus mencionados na fundamentação supra, da mesma forma que a materialidade, sendo responsáveis pela retirada de órgãos da vítima, ainda viva, causando-lhe a morte, por via de consequência. Agora é só aguardar as mesmas campanhas por parte dos tabloides e tevês locais, as notas publicadas pela SANTA CASA , pela associação dos médicos, as “cartas abertas à população”, na tentativa de “tapar o sol com peneira”, os ataques pessoais, à segurança e profissionais a este magistrado, que, contudo, tem carapaça e couro bem curtido.
V- DO DISPOSITIVO
Diante do exposto e por tudo o mais que dos autos consta, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO para CONDENAR os réus CLÁUDIO ROGÉRIO CARNEIRO FERNANDES, JEFERSON ANDRE SAHEKI SKULSKI, JOÃO ALBERTO GOES BRANDÃO e PAULO CÉSAR PEREIRA NEGRÃO nas penas previstas no § 4o do art. 14 da Lei n. 9.434/97, combinado com o art. 29 do Código Penal (CP), pois concorreram de algum modo para a prática do crime, na medida de suas culpabilidades. Declaro extinta a punibilidade da Ré ALESSSANDRA ANGÉLICA QUEIROZ ARAÚJO, pela desclassificação para o caput do art. 14, operada a prescrição da pretensão punitiva estatal. Absolvo o réu JOSÉ JÚLIO BALDUCCI de qualquer imputação nesses autos.
Passo a dosear as penas dos réus condenados, nos termos dos artigos 59 e 68, ambos do CP.
VI- DA DOSIMETRIA DAS PENAS
As penas serão aplicadas levando em consideração todos os aspectos já elencados, como está na sentença do Caso Pavesi, juntada a estes autos. Não será preciso descrever todos os critérios ali mencionados novamente. É como se esse julgamento fosse uma continuação daquele e também o do Caso 1, dadas as estreitas ligações entre os casos, todos descritos na Auditoria 03/2002 do DENASUS. A propósito (STJ, HC nº 253694, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 25.02.2014, DJe 12.03.2014) :
A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para tanto. Cabe às instâncias ordinárias, mais próximas dos fatos e das provas, fixar as penas. Às Cortes Superiores, no exame da dosimetria em grau recursal, compete o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, bem como a correção de eventuais discrepâncias - se gritantes e arbitrárias (STF, HC n. 104.302, Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 9/8/2013).
A) JEFERSON ANDRE SAHEKI SKULSKI
1. Quanto à culpabilidade, verifica-se que o grau de reprovabilidade do delito é muito elevado, entendia perfeitamente bem o caráter ilícito de suas condutas, extrapolando os limites da normalidade, haja vista que o réu, fazendo uso de sua profissão de médico radiologista, ajudou, ao fazer um diagnóstico fraudulento de morte encefálica, a remover os órgãos internos da vítima, em desacordo com disposição legal, levando-a à morte, sabendo que estava VIVA, sem mostrar nenhuma preocupação com a infeliz vítima ou sua família. Era membro atuante da Organização Criminosa, fingia fazer arteriografias, mas nem mesmo se preocupava em fazer os laudos, também forjados. Foi desmascarado por ocasião da CPI DO TRÁFICO DE ÓRGÃOS, caiu em várias contradições. Também no Caso Pavesi mentiu, na condição de testemunha compromissada, ao dizer que teria feita uma 2a arteriografia da criança Pavesi, a quem nem chegou a ver. Não mostrou qualquer arrependimento, ao contrário, sempre foi arrogante, acreditando na impunidade; Tal juízo reprovativo não é apenas inerente ao próprio tipo penal, eis que sem a sua atuação o crime não poderia ter sido praticado; o crime é vil, abjeto, repartindo uma pessoa para vender seus órgãos, como tinha conhecimento; não houve exame de ARTERIOGRAFIA na SANTA CASA; tentou fraudar as provas; inseriu dados falsos no prontuário médico; antecedentes, personalidade e conduta social indiferentes para a fixação da pena ou sem dados para avaliar; quanto aos motivos, faço um juízo negativo, mais gravoso, posto que foram os mais baixos possíveis, de auferir lucros fáceis (como visto, somente em um transplante teria auferido oito mil reais, como consta da CPI do TRÁFICO DE ÓRGÃOS e ganhava mais de vinte mil reais do SUS pelos transplantes); ajudou a montar a ONG MG-SUL TRANSPLANTES, ilegal, com lista própria de receptores; membro muito ativo na organização crimonosa; as consequências do delito foram graves, mais exacerbadas que o normal da espécie, extrapolando os limites da normalidade, tendo em vista o mal causado pelo réu à vítima, que morreu, nunca atingindo a idade adulta ou à sua família, que sofre até hoje a perda que não é natural e à própria sociedade, que perde a confiança em seus médicos, acreditava sair impune; a vítima, inocente, não contribuiu para a prática do delito.
Assim, entendo tais circunstâncias como preponderantemente desfavoráveis, fixando a pena-base em 18 (dezoito) anos de reclusão e 350 (trezentos e cinquenta) dias- multa.
2- Não há atenuantes, nem mesmo a da confissão.
3- Não há agravantes a serem consideradas e inexistem causas de diminuição e aumento de penas a serem consideradas.
Declaro assim definitivas e concretas as sanções em18 (dezoito) anos de reclusão e 350 (trezentos e cinquenta) dias-multa, fixado cada dia multa - dada a excelente condição financeira do réu, que mora em local privilegiado da cidade, com moradores do mais alto poder aquisitivo, que ainda depois dos fatos continuou a fingir que fazia o exame complementar de arteriografia nas vítimas - em 3 (três) salários mínimos, nos termos do artigo 49 do CP.
O regime inicial de cumprimento de sua pena será o FECHADO, consideradas as circunstâncias judiciais, bem como o quantum da pena.
B) CLÁUDIO ROGÉRIO CARNEIRO FERNANDES
1. Quanto à culpabilidade, verifica-se que o grau de reprovabilidade do delito é elevado, extrapolando os limites da normalidade, não sendo meramente inerentes ao tipo penal, sabia bem o que estava fazendo e o porquê, haja vista que o réu, fazendo uso de sua profissão de médico, cirurgião urologista, removeu órgãos humanos de uma vítima, sabedor que a mesma estava viva; não examinou o protocolo de morte encefálica, sendo que não foi feito o exame complementar obrigatório, sem mostrar nenhuma preocupação com a infeliz vítima ou sua família; operou irregularmente vários doadores; antecedentes ruins, condenado várias vezes, inclusive em 2a instância, personalidade e conduta social indiferentes para a fixação da pena ou sem dados para avaliar; quanto aos motivos, faço um juízo negativo, posto que foram os mais baixos possíveis, de auferir lucros com o sofrimento alheio; confessou em autos conexos auferir grande renda com os transplantes de órgãos e sabia das atividades ilícitas da ONG MG-SUL TRANSPLANTES e é membro ativo na organização criminosa, da mesma forma que Celso Scafi; as consequências do delito foram graves, mais exacerbadas que o normal da espécie, extrapolando os limites da normalidade, tendo em vista o mal causado pelo réu à vítima ou à sua família, dada a ignomínia praticada, e à própria sociedade, que perde a confiança em seus médicos e no sistema de transplantes, acreditava, como os demais, na impunidade, por estar acobertado por políticos influentes ;a vítima não contribuiu para a prática do delito, pois estava totalmente à mercê de seus algozes, covardia máxima.
Assim, vejo tais circunstâncias como preponderantemente desfavoráveis, ao meu sentir, fixando a pena-base em 17 (dezessete) anos de reclusão e 320 (trezentos e vinte) dias-multa.
2- Não há atenuantes, nem mesmo a da confissão.
3- Não há agravantes a serem consideradas e inexistem causas de diminuição e aumento de penas a serem consideradas.
Declaro assim definitivas e concretas as sanções em 17 (dezessete) anos de reclusão e 320 (trezentos e vinte) dias multa, fixado cada dia-multa - dada a excelente condição financeira do réu, declarada pelo próprio, que é casado também com uma médica - , mora em local priviilegiado, o Belvedere de Poços, em 3 (três) salários mínimos, nos termos do artigo 49 do CP.
O regime inicial de cumprimento de sua pena será o FECHADO, consideradas as circunstâncias judiciais, bem como o quantum da pena.
C) JOÃO ALBERTO GOES BRANDÃO
1. Quanto à culpabilidade, verifica-se que o grau de reprovabilidade do delito é elevado, extrapolando os limites da normalidade, não sendo meramente inerentes ao tipo penal, sabia bem o que estava fazendo e o porquê, haja vista que o réu, fazendo uso de sua profissão de médico, intensivista e nefrologista, ajudou a remover órgãos humanos de uma vítima, sabedor que a mesma estava viva; violento, psicopata ou sociopata; participou do diagnóstico de morte encefálica, o que lhe era vedado, sendo que não foi feito o exame complementar obrigatório, sem mostrar nenhuma preocupação com a infeliz vítima ou sua família; era quem, na Organização Criminosa, distribuía os órgãos das vítimas mortas; ajudou na prática de irregularidades em relação a vários doadores, era o menino de recados do IANHEZ; antecedentes, personalidade e conduta social indiferentes para a fixação da pena ou sem dados para avaliar; quanto aos motivos, faço um juízo negativo, posto que foram os mais baixos possíveis, de auferir lucros com o sofrimento alheio; confessou saber das atividades ilícitas da ONG MG-SUL TRANSPLANTES; as consequências do delito foram graves, mais exacerbadas que o normal da espécie, extrapolando os limites da normalidade, tendo em vista o mal causado pelo réu à vítima ou à sua família, dada a ignomínia praticada, e à própria sociedade, que perde a confiança em seus médicos e no sistema de transplantes, acreditava, como os demais, na impunidade, por estar acobertado por políticos influentes ;a vítima não contribuiu para a prática do delito, pois estava desfalecida e dopada.
Assim, vejo tais circunstâncias como preponderantemente desfavoráveis, ao meu sentir, fixando a pena-base em 19 (dezenove) anos de reclusão e 400 (quatrocentos) dias- multa.
2- Não há atenuantes, nem mesmo a da confissão.
3- Não há agravantes a serem consideradas e inexistem causas de diminuição e aumento de penas a serem consideradas.
Declaro assim definitivas e concretas as sanções em 19 (dezenove) anos de reclusão e 400 (quatrocentos) dias-multa, fixado cada dia multa - dada a excelente condição financeira do réu em 3 (três) salários mínimos, nos termos do artigo 49 do CP.
O regime inicial de cumprimento de sua pena será o FECHADO, consideradas as circunstância judiciais, bem como o quantum da pena.
D) PAULO CÉSAR PEREIRA NEGRÃO
1. Quanto à culpabilidade, verifica-se que o grau de reprovabilidade do delito é elevado, extrapolando os limites da normalidade, não sendo meramente inerentes ao tipo penal, sabia bem o que estava fazendo e o porquê, haja vista que o réu, fazendo uso de sua profissão de médico intensivista, ajudou a remover órgãos humanos de uma vítima, sabedor que a mesma estava viva; participou do protocolo de morte encefálica, fez um suposto exame clínico, sabedor que a vítima estava viva, havia usado etílico, sendo que não foi feito o exame complementar obrigatório, sem mostrar nenhuma preocupação com a infeliz vítima ou sua família;antecedentes, personalidade e conduta social indiferentes para a fixação da pena ou sem dados para avaliar; quanto aos motivos, faço um juízo negativo, posto que foram os mais baixos possíveis, de auferir lucros com o sofrimento alheio; presidente de associação classista, sempre defendeu os transplantadores mesmo sabendo das práticas criminosas, pois sabia das atividades ilícitas da ONG MG-SUL TRANSPLANTES; as consequências do delito foram graves, mais exacerbadas que o normal da espécie, extrapolando os limites da normalidade, tendo em vista o mal causado pelo réu à vítima ou à sua família, dada a ignomínia praticada, e à própria sociedade, que perde a confiança em seus médicos e no sistema de transplantes, acreditava, como os demais, na impunidade, por estar acobertado por políticos influentes ;a vítima não contribuiu para a prática do delito, pois era de família pobre e sem instrução.
Assim, vejo tais circunstâncias como preponderantemente desfavoráveis, ao meu sentir, fixando a pena-base em 16 (dezesseis) anos de reclusão e 300 (trezentos) dias- multa.
2- Não há atenuantes, nem mesmo a da confissão.
3- Não há agravantes a serem consideradas e inexistem causas de diminuição e aumento de penas a serem consideradas.
Declaro assim definitivas e concretas as sanções em 16 (dezesseis) anos de reclusão e 300 (trezentos) dias- multa, fixado cada dia multa - dada a excelente condição financeira do réu, declarada pelo próprio - em 3 (três) salários mínimos, nos termos do artigo 49 do CP.
O regime inicial de cumprimento de sua pena será o FECHADO, consideradas as circunstâncias judiciais, bem como o quantum da pena.
VII- DA APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES E DA PRISÃO PREVENTIVA
Tratam os autos de sentença condenatória (ainda que não definitiva) e dois dos réus já foram também condenados por fatos análogos, respondem a outro processo por caso conexo, o que já justificaria a imposição da medida cautelar, sem prejuízo da decretação de suas prisões preventivas. Necessária além da prisão preventiva, também a aplicação de quatro medidas cautelares, na forma infra. As medidas também se justificam para os réus que são condenados pela 1a vez, devido a intensa culpabilidade e pelo fato dos outros também já terem respondido a outros processos. Um deles, JEFERSON, é um mentiroso contumaz, deveria ter sido processado várias vezes e é peça-chave do esquema criminoso. É um perigo constante. Da mesma forma, PAULO CÉSAR, que sempre atuou na tentativa de desvirtuar a verdade e tumultuar os processos e inquéritos ainda em andamento. JOÃO é o “menino de recados”, o “faz tudo”, chefiado por um acusado ainda não julgado (A. IANHEZ). É o mais perigoso, oficial reservista do exército, praticante de esportes radicais, já morou em país onde o tráfico de órgãos é intenso, violento, possui sinais de sociopatia e suspeito de ter participado da morte de duas outras pessoas, (Carlão, a quem atendeu pessoalmente, foi até o local onde estava baleado, possivelmente estava no local quando o tiro foi disparado contra tal vítima; suspeito na morte da suposta testemunha José Alexandrino Apolinário, seu paciente de hemodiálise). CLÁUDIO já foi várias vezes condenado, esteve preso e continua com uma atitude desafiante em juízo. Os réus, ora condenados, são também servidores públicos e houve lesão à administração pública, pois verbas do SUS foram recebidas indevidamente. Até o trânsito em julgado das sentenças condenatórias, muito tempo passará, pois recursos e mais recursos serão impetrados, dado o poderio financeiro dos réus e a infinidade dos recursos `a disposição (por uma legislação retrógrada, pouco afinada com os dias atuais). Não é justo e direito que os réus continuem atendendo a população inocente, gerando sensação de insegurança, especialmente aos pacientes mais pobres e carentes (a clientela do SUS). Tal medida de cessar de imediato suas atividades de prestação de serviços médicos pelo SUS, seja em consultórios, hospitais públicos ou particulares conveniados com o SUS, não podendo realizar quaisquer consultas ou procedimentos pelo SUS, tem expressa previsão legal. Também foi aplicada, de ofício, no RESE n. 1.0518.08.148802-6/001, pelo ilustre Desembargador Relator, Flávio Leite, em decisão que admitiu o julgamento dos médicos perante o Tribunal do Júri. Tal medida não prejudica a prática profissional dos réus, médicos, em seus consultórios particulares, mantendo incólume suas fontes de renda. Um deles, ao que parece, até leciona. A fundamentação esposada por ocasião da sentença do caso 1, que ora se transcreve, se amolda ao presente caso, que fica fazendo parte da presente:
Por tais razões e mais aquelas já constantes dos autos, mantenho a CAUTELAR até o trânsito em julgado desta ou posterior decisão judicial, proibindo os réus de se ausentarem do país ou mesmo da Comarca, sem prévia autorização do juízo. Oficie-se à Polícia Federal para tomar conhecimento e medidas pertinentes, inclusive informar ao juízo se foi expedido outro passaporte para o réu JOÃO ALBERTO, com cópia do passaporte ora apreendido. Além desta, aplico a todos os réus, de ofício, outra medida cautelar diversa da prisão preventiva, de AFASTÁ-LOS DO AMBIENTE HOSPITALAR, ou seja, o imediato cessar de suas atividades de prestação de serviços médicos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), seja em consultórios, hospitais públicos ou particulares conveniados com o SUS, não podendo realizar quaisquer consultas ou procedimentos pelo SUS. Tal medida tem previsão expressa no artigo 282, parágrafo segundo e artigo 319, incisos IV e VI, ambos do CPP, e que “segundo a melhor doutrina, é mais do que possível, é dever do Magistrado, posto que o bom andamento do processo é mister a seu cargo” . A gravidade concreta dos brutais delitos cometidos, por si só, recomendaria a adoção de mais esta medida cautelar. Além disso, coexiste a circunstância de ter sido praticados por médicos, no exercício de suas funções públicas, pois agiam prestando serviços ao SUS (ainda que alguns cobrassem por fora), valendo-se de suas condições profissionais para tanto, possibilitando ainda a sua dissimulação e dificuldade no desacortinamento dos mesmos. Mantidos tais (maus) profissionais no ambiente hospitalar, notadamente agora com sentença condenatória, é capaz de gerar insegurança para a sociedade por eles “assistida”, notadamente naqueles mais carentes que só têm o SUS para se valer. Muitos poderiam até deixar de procurar socorro médico em razão de fundada desconfiança, baseada não em especulações mas em provas dos autos, afirmadas pela Polícia Federal, Ministério Público Federal, Estadual, bem como nesta Sentença. A insegurança pública gerada pela manutenção desses médicos no ambiente hospitalar, até que sobrevenha o trânsito em julgado, é evidente e reclama forte medida por parte do Poder Judiciário, que pode e deve garantir a ORDEM PÚBLICA. Fique claro que a presente medida não afasta os réus totalmente de sua função de médico, não interferindo na sua atuação estritamente privada, não vinculada direta ou indiretamente com o SUS. (Fls. 3723/3724 da sentença caso 1).
Oficie-se ao Ministério da Saúde, Prefeitura, Secretaria Municipal e Estadual de Saúde, bem como aos hospitais da região, comunicando desta decisão, com cópias, para que seja imediatamente suspensos os credenciamentos dos condenados no SUS.
Além da proibição de trabalhar pelo SUS, necessário o recolhimento dos passaportes dos réus, ora condenados. Há fortes boatos na cidade, até de fontes da P2, que os réus planejam fuga, para evitar a ação da Justiça. O advogado de um dos condenados em processo conexo, inclusive, logrou êxito em fuga, o que estimula tal atitude. Dois dos ora condenados, inclusive, já tiveram seus passaportes recolhidos, JOÃO e CLÁUDIO.
Ficam, também, proibidos de ingressar no Hospital da Santa Casa de Poços de Caldas, medida já aplicada em processo conexo a este. Tal medida se justifica, por ser o local da prática da maioria dos crimes investigados. Sua presença ali, incentivaria a reiteração criminosa.
Finalmente, ficam proibidos de se ausentar da Comarca de Poços de Caldas por mais de 7 (sete) dias, sem autorização do juízo. Tal medida se justifica pelo risco de fuga, já ocorrido em outros processos. Tal proibição já foi feita em casos conexos e mantida no E. TJMG.
Conforme o escólio de RENATO BRASILEIRO DE LIMA, citado no acórdão mencionado (Habeas Corpus n. 1.0000.13.015724-1/000), “se trata de medida cautelar específica cuja utilização está voltada, precipuamente, a crimes praticados por funcionário público contra a administração pública (...)” . Os réus, ora condenados, são também servidores públicos e houve lesão à administração pública, pois verbas do SUS foram recebidas indevidamente. Até o trânsito em julgado das sentenças condenatórias, muito tempo passará, pois recursos e mais recursos serão impetrados, dado o poderio financeiro dos réus e a infinidade dos recursos `a disposição (por uma legislação retrógrada, pouco afinada com os dias atuais). Não é justo e direito que os réus continuem atendendo a população inocente, gerando sensação de insegurança, especialmente aos pacientes mais pobres e carentes (a clientela do SUS).
Dado o modus operandi perpetrado, da quadrilha que vem sendo investigada, de suas ramificações e periculosidade, com os demais casos investigados, denunciados, inclusive com condenação em primeira e segunda instância de dois dos ora condenados; dado o poder já demonstrado da Organização Criminosa, inclusive de influenciar pessoas e instituições, morte e ameaça de pessoas, alterar provas, inclusive uma testemunha no caso da investigação da morte do ex-administrador da SANTA CASA; visto que outros processos e inquéritos estão em andamento, a conveniência da instrução, a garantia da ordem pública e para se garantir a aplicação da lei penal, podem e recomendam o decreto da prisão preventiva em face de CLÁUDIO ROGÉRIO, que inclusive foi condenado em outros processos, contra JOÃO ALBERTO, o mais ativo membro da organização criminosa e réu em outros processos, já tendo sido inclusive condenado, e JEFERSON SKULSKI, também figura de proa na organização criminosa, sem ele o golpe não seria aplicado, pois sua função era fingir realizar os exames de arteriografia das vítimas, como visto neste processo e no Caso Pavesi. Somente as medidas cautelares quanto a estes três réus não se mostram adequadas para deter a ação dos criminosos, que não se detêm por nada, ameaçando inclusive o magistrado e seus familiares. Em liberdade, tais réus ficarão sentindo-se livres e à vontade para maquinar novas maneiras de atrapalhar a colheita das provas, como fizeram no decurso de todas as investigações do presente processo até a data de hoje, sendo certo que ainda existem investigações e processos em curso. As suas prisões já deveriam ter ocorrido há muito tempo, mas tal omissão não pode impedir que sejam decretadas, pois a ousadia demonstrada por tal inoperância do ente estatal só a fez crescer.A Organização Criminosa ousou atacar até a filha deste magistrado, a covardia não tem mesmo limites.Outra forma de repercussão social alcançada pelos delitos praticados neste e em outros processos (alguns delitos da Organização já se encontram praticamente prescritos) se apura pelos antecedentes e pela maneira de execução dos crimes, inclusive contra crianças e pessoas desprovidas de escolaridade ou posição social. Assim, é cabível a decretação da prisão daqueles com antecedentes ruins (condenação anterior), associando a isso a crueldade particular com que executaram o crime. O fato de serem primários, em tese, não ostentando condenações transitadas em julgado, não os leva a pleitear um “alvará permanente de impunidade, visto que a prisão preventiva tem outros fundamentos”, na lição sempre lembrada de GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Código de Processo Penal Comentado, Ed. RT: São Paulo, 2005, p. 565). De outro lado, admitindo que a gravidade do delito possa ser aferida para a decretação da prisão preventiva, especialmente no momento da sentença, cabe a lição de ANTÔNIO MAGALHÃES GOMES FILHO, que afirma que a gravidade pode ser constatada pela natureza da pena abstratamente cominada e permite, inclusive, a motivação implícita do juiz . Os graves crimes perpetrados e outros eventualmente a se apurar, me levam a crer que em liberdade os réus prejudicarão a tramitação processual deste e de outros processos ou inquéritos em andamento. Outro requisito a se analisar diz respeito à ordem pública. Não há dúvidas que esta já se encontra bastante abalada por este caso e dos outros citados, conforme inclusive as cotas ministeriais citadas nesta sentença. A garantia da ordem pública se consubstancia na necessidade de manter a ordem na sociedade, que sempre sofre abalo, quando se comete um delito como o dos autos, ainda que há 14 anos passados. A imensa repercussão alcançada até hoje comprova isso. Segundo NUCCI deve-se considerar o binômio GRAVIDADE DA INFRAÇÃO + REPERCUSSÃO SOCIAL (op. Cit. p.565). Apura-se o abalo à ordem pública pela divulgação que o delito alcança nos meios de comunicação. Convêm registrar que a JUSTIÇA não pode mais ser conivente, nos dias de hoje, com situações como esta, como se nada estivesse acontecido, sendo que o abalo alcança, inclusive, repercussão internacional, por afetar direitos humanos inalienáveis. Ante todo o exposto, entendo mais do que cabível a decretação imediata da prisão preventiva de CLÁUDIO ROGÉRIO CARNEIRO FERNANDES, JOÃO ALBERTO GOES BRANDÃO e JEFERSON ANDRE SAHEKI SKULSKI, alguns já condenados pelo crime de retirar órgão ilegalmente para fins de transplante, outro pelo crime do Caso Pavesi “sabedores que a vítima PVP, então com 10 anos de idade, ainda encontrava-se com vida (...) causando-lhe a morte”, agora por retirar órgãos da vítima Paulo Lourenço Alves, sabendo que a vítima ainda estava com vida e causando-lhe assim a morte, em circunstâncias horríveis, à noite, em um hospital sem qualquer misericórdia, como o da Irmandade da Santa Casa de Poços de Caldas. As prisões se justificam para a garantia da ordem pública, nitidamente abalada pelas ações dos condenados, pela conveniência da instrução processual dos outros feitos conexos e para garantir a futura aplicação da lei penal (visto que outros réus, inclusive, fugiram do país em tempos recentes ). Há fortes boatos na cidade, até de fontes da P2, que os réus planejam fuga, para evitar a ação da Justiça. O advogado de um dos condenados em processo conexo, inclusive, logrou êxito em fuga, o que estimula tal atitude. Que não se alegue o tempo decorrido dos crimes, pois tal se deu pela força da ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA e não pode agora beneficiar aos criminosos. Veja:
STF: “Tem-se como justificado o decreto de prisão preventiva fundamentado na necessidade de preservar a regularidade da instrução processual e de assegurar a aplicação da lei penal, diante da comprovada periculosidade dos agentes e a gravidade do fato” (HC 78.901, DJ 28.5.1999).
Na mesma senda, cabe ainda a transcrição dos julgados:
TJSP: “Ainda que o indiciado não tenha sido ouvido pela autoridade judicial, por ter desaparecido do distrito da culpa, havendo nos autos elementos que demonstram a gravidade do fato imputado e presentes os requisitos do art. 312 do CPP é de ser decretada sua prisão preventiva” (TJSP-HC93.321-3, Rel.Carlos Bueno, 29.5.2001-RT 661/278).
TJMS: “No conceito de ordem pública, insere-se a necessidade de preservar a credibilidade do Estado e da Justiça, em face da intranquilidade que os crimes de determinada natureza provocam na comunidade local” (RT, 594/408).
Por todo o exposto, decreto, de ofício, as prisões preventivas dos condenados, JOÃO, JEFERSON e CLÁUDIO nos termos do art. 312 e seguintes do CPP. Expeçam-se, com urgência, os mandados de prisão, remetendo-os às autoridades para imediato cumprimento e recolhimento ao Presídio da Comarca . Registrem-se os mandados no banco de dados mantido pelo CNJ, os termos do art. 289-A do CPP. Conste dos mandados a tipificação criminal e o prazo prescricional de 20 anos.
Concedo o benefício de responder em liberdade, aguardando o resultado do recurso que certamente irá opor ao réu PAULO CÉSAR NEGRÃO, ainda que ocupante de cargo na Associação dos Médicos de Poços de Caldas, que produz defesa intransigente dos demais réus neste e em outros processos conexos, que tanto mal trouxe à Sociedade poços caldense no escamoteamento da verdade real, pois a este magistrado não agasalha qualquer sentimento de vindita, vaidade ou assemelhado. Só age no estrito cumprimento do interesse legal.
VIII- DAS DISPOSIÇÕES COMUNS A TODOS OS CONDENADOS
Deixo de aplicar qualquer substituição de pena, dada a gravidade dos crimes, por suas circunstâncias, suas consequências, pelas penas em concreto cominadas e por ser tal medida não recomendável para a repressão e prevenção dos delitos.
Condeno os réus ao pagamento das custas processuais, em partes iguais, pro rata.
Decreto a perda dos cargos públicos dos quatro sentenciados (exceto Alessandra e José Júlio), nos termos do art. 92, I, alíneas “a” e “b”, do CP. Oficiem-se aos órgãos de saúde municipal, estadual e federal.
Não permito que os réus CLÁUDIO, JEFERSON e JOÃO permaneçam soltos, inclusive durante a tramitação de eventuais recursos, pelas razões já expostas em seção antecedente, por entender presentes as condições que levaram a decretação da prisão preventiva, o crime é doloso e punível com pena de reclusão, há prova da existência do crime e provas da autoria criminosa, exceto em relação a PAULO CÉSAR.
VIII- DAS DISPOSIÇÕES COMUNS A TODOS OS CONDENADOS
Deixo de aplicar qualquer substituição de pena, dada a gravidade dos crimes, por suas circunstâncias, suas consequências, pelas penas em concreto cominadas e por ser tal medida não recomendável para a repressão e prevenção dos delitos.
Condeno os réus ao pagamento das custas processuais, em partes iguais, pro rata.
Decreto a perda dos cargos públicos dos quatro sentenciados, nos termos do art. 92, I, alíneas “a” e “b”, do CP. Oficiem-se aos órgãos de saúde municipal, estadual e federal.
Permito que o réu PAULO CÉSAR permaneça solto, inclusive durante a tramitação de eventuais recursos, pelas razões já expostas em seção antecedente, por entender suficientes, no momento, as quatro medidas cautelares ora aplicadas quanto ao mesmo. O descumprimento de quaisquer delas, ou outro motivo superveniente, poderá acarretar o decreto de prisão preventiva, presentes os requisitos legais.
IX- DAS DEMAIS DISPOSIÇÕES DA SENTENÇA
Transitada em julgado a presente decisão ou v. acórdão da Superior Instância, determino, ainda:
1. procedam-se as anotações e comunicações apropriadas;
2. comunique-se o Instituto de Identificação do Estado;
3. comunique-se o TRE.
4. expeçam-se os mandados de prisão.
5. expeça-se guia de execução.
Ainda antes do trânsito em julgado determino as imediatas providências de caráter urgente:
1-Oficie-se a Receita Federal e Estadual para que providencie apuração sobre recolhimentos tributários no âmbito da IRMANDADE DA SANTA CASA DE POÇOS DE CALDAS, especialmente no Hospital, bem como suspeitas de lavagem de dinheiro até mesmo para apurar situação de imunidade da entidade considerada “de fins filantrópicos e sem finalidade lucrativa”.
2-Oficie-se o Ministério da Saúde, DENASUS, ANVISA, VISA, Secretaria estadual e municipal de saúde para que providenciem novas auditorias no HOSPITAL DA SANTA CASA DE POÇOS DE CALDAS, nos moldes das realizadas no início dos anos 2000 para verificação das condições gerais, havendo notícias de mortes por infecção hospitalar, inclusive de parturientes e crianças, agora com a denúncia de novos casos, ainda em curso no estabelecimento hospitalar, sem que haja a notícia de qualquer providência por parte de qualquer autoridade, seja ela médica, Ministério da Saúde, ou conselhos de medicina.
3-Oficie-se ao MPE, MPF, Ministério do Trabalho e Polícia Federal, para a realização de auditorias contábeis nos livros do HOSPITAL DA SANTA CASA, devido a suspeitas de fraudes com verbas públicas federais, estaduais, municipais e crime de lavagem de dinheiro, com abertura ou reabertura de inquéritos já arquivados.
4- Oficie-se o CFM e CRM, com cópias da sentença, para providências que entender sobre os médicos condenados e outros citados, para abertura ou reabertura de procedimentos disciplinares. Frise-se que a não condenação pela ocorrência de prescrição, como se deu no CASO 1 com dois dos médicos acusados, e agora nesse CASO 5, não elide das providências de cunho administrativo, pois não comprovam inocência.
5-Oficie-se o Secretário de Defesa Social e o Chefe de Polícia para que tomem providências quanto ao andamento do IP que apura a morte do ex-administrador da SANTA CASA, atualmente a cargo da Corregedoria de Polícia, bem como o IP que investiga a ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA em atuação em Poços de Caldas, no âmbito da SANTA CASA, para que não ocorram ingerências políticas indevidas.
6-Oficie-se, novamente, o Prefeito e a Presidenta da Câmara de Vereadores de Poços de Caldas para que analisem a situação de aplicação de verbas municipais, incluindo autarquias, ao Hospital da SANTA CASA, tendo em vista as inúmeras suspeitas de irregularidades em seu âmbito, pagamento de salários acima da média da região, nepotismo e falta de seleção dos profissionais, bem como suspeitas de práticas criminosas, alto índice de infecção hospitalar, o que ocasiona prejuízos aos munícipes, incluindo à Saúde destes. Assino o prazo de até 7 dias para a Câmara de Vereadores enviar cópias integrais da manifestação da Santa Casa de denúncia ao Convênio com o DME.
7- Remetam-se cópia da presente, bem como da sentença do Caso 1, acórdão do TJMG, sentença do Caso Pavesi, sentença do Caso 2 e denúncia do Caso 7 à Justiça Federal.
P. R. I. e cumpra-se.
Poços de Caldas/MG, 17 de março de 2015.
NARCISO ALVARENGA MONTEIRO DE CASTRO
Juiz de Direito Titular da 1ª Vara Criminal e VEC
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