Desembargadores comprados

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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Nascimento e eu temos algo em comum

Depois de milhoes assistirem este filme, eu decidi que deveria ve-lo. No começo eu estava um pouco desconfiado porque as criticas diziam que tinha um certo apelo politico, e politica quando se mistura a arte ou ao judiciario, como dizia o Nascimento, da merda. Eu sou o retardatario.

Faço questao de deixar claro que nao tenho qualquer pretensao de me comparar com Nascimento. Ele é um personagem heroico e idolatrado. Eu sou um asilado esquecido.

Mas o que vi ali foi muito interessante, e me fez voltar no tempo. Foi inevitavel comparar o que eu vivi e o que viveu o capitao Nascimento neste segundo filme, com direito a CPI e gravaçoes telefonicas. 

Eu tentei combater o sistema. O filme mostra Nascimento tentando fazer o mesmo, mas de uma posiçao muito mais privilegiada obviamente. 

Nascimento percebeu que aquele que dizia combater o crime, era o verdadeiro criminoso. Era o cara que saia no jornal dizendo defender a populaçao e ao mesmo tempo, do outro lado, sentava o dedo. Tudo em busca de votos e consequentemente mais poder.

Eu percebi que aqueles que diziam que salvavam vidas fazendo transplantes, eram na verdade, os verdadeiros traficantes de orgaos e que na verdade estavam matando pacientes. Sao eles que faziam passeatas para sensibilizar os doadores sobre a importancia da doaçao de orgaos e ao mesmo tempo, do outro lado, comandavam um esquema de trafico de orgaos enviando-os para serem implantados em clinicas e hospitais particulares, tudo com a conivencia do governo. Tudo em busca de mais transplantes, e consequentemente mais dinheiro.

O arrego faz parte do negocio. Tanto das milicias quanto dos traficantes de orgaos. Todos pegam a sua fatia. Do delegado da policia federal a procurador da republica, passando por juizes, desembargadores, e toda a sorte de corruptos. Os que nao molham as maos, recebem promoçoes.

Nascimento deu nomes e relacionou os crimes de cada deputado envolvido. Eu tambem. Citei o chefe da quadrilha que foi chamado para depor, mas conseguiu - usando o sistema - cancelar sua convocaçao. 

A vitima do filme com uma bala no rim, é o filho do Nascimento, que aos 10 anos de idade queria respostas do seu pai. A vitima na minha historia foi meu filho de 10 anos, que ficou sem os rins, e que até hoje eu tambem nao pude dar uma resposta. Nos nao conseguimos responder, porque o sistema trabalha para beneficiar bandidos, que sao os donos do proprio sistema. E perto do sistema nao somos ninguem.

No filme ha queima de arquivos. Na minha historia tambem. Em comum os arquivos sao assassinados, sem nenhuma investigaçao, sem nenhum culpado, mas todos sabem quem foi o mandante.

O filme que para muitos é so um historinha com um heroi, pra mim teve um gosto diferente. Revivi cada momento da CPI. Quando Nascimento falava o nome de um deputado e o que ele fazia, eu podia sentir  a minha voz fazendo o mesmo, ha 7 anos atras. Em um destes momentos, foi quando esvaziaram a sala do meu 2o depoimento e somente um membro da quadrilha ficou sentado ali me ouvindo. (Sim! Como no filme, os quadrilheiros tambem tinham representantes na CPI). Eu comecei o depoimento mostrando uma copia do prontuario do meu filho e rasgando pagina por pagina, ao mesmo tempo em que dizia: "Todas estas provas, diante deste poder insuperavel, nao valem nada!".



Foi quando o quadrilheiro tentou impedir que eu continuasse, mas nao teve sucesso. Eu liguei o aparelho DVD e a sua foto foi a primeira que apareceu. Ele sabia que eu ia "meter o dedo nessa porra". Levantou-se e foi embora. Eu continuei depondo em um sala vazia com meia duzia de ouvintes, por mais de uma hora. Ninguem estava ouvindo, mas o que me interessava nao eram os ouvintes e sim os registros que fazem na CPI - Audio e Texto. E estao la até hoje como parte da historia do pais. Querendo os traficantes ou nao. E se sumirem, eu tenho copias!

Veja a entrevista que dei, logo apos o primeiro depoimento onde acusei o chefe da quadrilha. No final da reportagem a jornalista fala sobre o assunto.


A Sra. Liliana que aparece nesta reportagem, na época, era capita do exercito brasileiro. Orgaos do seu filho desapareceram e até hoje, nenhuma resposta foi dada. Ela desistiu da luta. A pressao nao é pequena.

Nascimento perdeu o emprego quando resolveu denunciar, e foi desqualificado pelas autoridades. O Ministerio Publico Federal fez o mesmo comigo. Passou a enviar correspondencias para a empresa onde eu trabalhava pedindo a quebra do meu sigilo eletronico. A empresa nao entregou copias dos emails como eles desejavam, mas percebeu que era hora de me demitir. Ninguem quer enfrentar o sistema. Eu fui demitido no dia em que a CPI foi instalada. Uma intimidaçao tao baixa quanto o carater dos procuradores que a provocaram. Mas eu continuei a luta e fui, mesmo assim, para Brasilia. O Ministerio Publico Federal distribuiu nota a imprensa dizendo que eu tinha problemas mentais e entrou com uma açao para que eu fizesse exame de sanidade. 

Obviamente que eu jamais faria este exame naquele momento. Acusava medicos renomados de forjarem laudos e exames, o que poderia facilmente ser feito contra mim. Seria me entregar para o hospicio. Apos receber asilo, procurei fazer o exame aqui, mas nao deixaram. A justificativa? Este exame so é feito em pacientes que apresentam sintomas, que nao é o meu caso.

A vida imita a arte, ou a arte imita a vida. Nao sou um Nascimento e nem pretendo se-lo. Sou alguem que tentou ajudar o sistema, sem tambem ter noçao que o proprio sistema era o meu maior inimigo. Nascimento percebeu que seu depoimento causou o efeito contrario. Acreditava que a milicia daria uma tregua, e na verdade foi o momento em que a milicia mais matou para queimar os arquivos. Eu acreditava que a mafia do trafico de orgaos daria tregua, e na verdade foi quando a corrupçao deslavada correu solto entre as autoridades e medicos renomados. Foi quando definitivamente eles tomaram conta da situaçao.

Eu nao sei como termina a vida de Nascimento. Sei apenas que, pela historia como foi narrada, ele seria assassinado mais cedo ou mais tarde. Depois de tudo, o sistema nao mudou em nada. Apenas trocou de maos. Na duvida, para nao ter um fim como imagino que teria o Nascimento, eu preferi vir para a Italia.


Um comentário:

José María Souza Costa disse...

Depende que lição as pessoas tiram de filmes. Ou como elas o interpretam
Passei aqui lendo o que tem pra ler. E observando o que tem para observar. E Exaltando o que tem de ser Exaltado. Estou lhe desejando um Tempo de Harmonia e de muita Inspiração. Entendo ter um blogue Agradavel, muito bom e Interessante. Eu, também tenho um. Muito Simplório por sinal. E estou lhe Convidando a Visitá-lo e, mais. Se possivel Seguirmos juntos por eles. Estarei Muito Grato esperando por Você lá.
Abraços de verdade e, fique com DEUS