Desembargadores comprados

Desembargadores comprados

sábado, 17 de março de 2012

O catador de lixo e os orgaos dos condenados

Eu sou um catador de lixos da internet. Tudo o que sai sobre transplantes, doaçao de orgaos, trafico de orgaos e enfim, qualquer coisa relacionado ao tema, cai na minha caixa de email. E como nao é possivel selecionar o conteudo, acabei me tornando um catador de lixos. Alguns textos sao engraçados (devem ser piada) outros sao tristes, outros sao, como dizer..... tendenciosos.

Esta manha por exemplo, recebi o brilhante texto "Doação de rim em troca de redução da pena de prisão" publicado no site Mundo RI. Nao! Nao é que o mundo ri. O RI no caso significa Relaçoes Internacionais. Portanto nao é uma piada. Ele cai na minha classificaçao de "tendenciosos".

O autor é Francisco César Pinheiro Rodrigues, desembargador aposentado do TJESP e escritor. Autor dos romances "A rainha da boate", "Do amor e outras fraudes" e "Criônica". Publicou também um livro de contos, "Tragédia na ilha grega", disponível à leitura no site www.franciscopinheirorodrigues.com.br. É membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e da Academia de Ciências de Nova York (NYSA – sigla em inglês).

Nao vou publica-lo na integra aqui. Vou apenas comentar algumas partes do que foi escrito e o meu ponto de vista.
Por que pessoas necessitadas não vendem um rim? Porque esse comércio é ilegal e se legalizado configuraria o abuso de um dos direitos humanos: o de desfrutar de sua integridade física. Abuso porque o vendedor seria sempre um ser humano pobre. Homens ricos jamais venderão seus órgãos. Correta, portanto, a nossa legislação quando proíbe o comércio de órgãos.
Esta linha de pensamento é bastante infantil vindo de alguem com a qualificaçao que tem. O pobre livre nao pode vender um orgao para ter uma condiçao economica melhor, mas o pobre preso pode oferecer ao Estado uma parte do seu corpo que nao seria uma violaçao dos direitos humanos! Alem disso, parece que o autor se esquece de que nas prisoes nao existem ricos. O ricos criminosos estao em Brasilia ou nos melhores bairros da sua cidade. Novamente e sempre, o fornecedor do rim é pobre! 

Veja a foto: voce pode apontar quem é o rico?


Ricos nao sao doadores de orgaos! Doar é coisa de pobre. Os ricos nao se submetem a esperar o processo de doaçao para enterrar o morto. Rico nao oferece um orgao a alguem que nao conheça ou que nao tenha uma relaçao afetiva.
Violação de seu direito seria, pelo contrário, impedir que o condenado possa escolher o que melhor satisfaça seu particular interesse. Saindo mais cedo da prisão, isso fará bem a ele à sua família. Ressalte-se que pessoas que precisam de um transplante de rim também têm o direito humano de obterem um serviço de saúde que os salve da morte. Esse direito não está hoje acessível por falta de doadores em número suficiente. E contar com rins extraídos de pessoas mortas em acidentes de trânsito é sempre problemático, por razões relacionadas com a demora na extração, preservação cuidadosa do órgão em local frio, desespero da família do acidentado e a inevitável burocracia decorrente de todas essas situações.
O paragrafo acima expoe exatamente isto. O autor acredita violaçao de direito seria impedir o condenado de comprar a sua pena com um orgao. Entao ele parte o famoso argumento de que muitos esperam na fila e que faltam doadores e toda aquela ladainha. Mas reconhecer o direito do condenado, antes de chegar a este ponto, vender os orgaos, ahhhh... isso nao! E para salvar uma vida, nos sabemos, os argumentos que utilizam sao inesgotaveis:
Faria bem ao condenado, moralmente, essa doação, porque o preso sentir-se-ia valorizado por ter salvo uma vida humana, mesmo desconhecendo quem recebeu seu rim.
E nao para por ai:
O mal do crime, já praticado, dificilmente pode ser reparado. O passado é imutável. Nem Deus pode alterá-lo. No caso do homicídio, nada trará o assassinado de volta à vida. Se o recluso tiver sido condenado por homicídio, em um momento de ódio, poderá pensar, doando o órgão: — "Se tirei uma vida, posso conceder outra, com a doação de parte de meu corpo. E com o privilégio de continuar vivendo. Privilégio, porque o homem que matei continuará morto".
O Estado ja deixou claro que nao ha interesse em criar uma politica de segurança publica para diminuir a criminalidade. Logo, mais uma vez, os pobres - que nao podem pagar por bons advogados - se tornarao a principal fonte dos transplantes. 

Seguindo a linha de raciocinio do nobre autor, quantas pessoas morrem quando um politico desvia dinheiro da saude? Este politico jamais sera condenado por qualquer coisa. Nem por desviar dinheiro da saude, e muito menos por homicidio. Vamos pegar os rins deles tambem?

E quando uma operaçao policial acaba mal, causando a morte de uma vitima de sequestro? Vamos tirar os rins de cada policial tambem?

E quando um medico comete um erro levando o paciente a obito? Vamos extrair seus orgaos tambem?

A reposta é simples: Nao! Isso nunca! A medida é para aqueles pobres que cometem crimes graves.

Aquela questao moral nao serve para qualquer um. Mas estas ideias sempre vem recheadas de surpresas e nao poderia ser diferente agora. Veja o que afirma o autor, que diz estar preocupado com a violaçao dos direitos humanos daqueles que querem vender os seus orgaos:
Um detalhe que a eventual lei precisaria examinar e decidir é se a diminuição da pena também seria concedida quando o preso doa o rim a um parente dele. Penso que, nesse caso, não haveria diminuição de pena. Ele que dê seu rim ao parente, mas sem com isso diminuir seu tempo de reclusão, porque seu gesto não seria humanitário, visaria apenas o benefício de sua própria família. Somente o sentido humanitário da inovação legislativa é que a justificaria.
Automaticamente, os familiares de um condenado tambem estao condenados e serao excluidos da possibilidade de serem os beneficiados de um orgao que proporcione a reduçao da pena. Se receberem um rim de um parente detento, a reduçao nao sera aplicada. Mais uma vez o pobre perde o direito de ter uma vida melhor. Isto é valido so para os ricos. Nota-se ai que o rim do condenado deve beneficiar alguem longe de seu circular familiar, alguem puro, alguem honesto. A familia do condenado nao vale. Um condenado salvar a vida da propria filha nao seria um "gesto humanitario". Mas salvar a vida dos filhos dos outros sim!

E a cada dia que passa, fica mais evidente que o Estado nao quer permitir a venda de orgaos porque o proprio Estado se sente o proprietario dos orgaos. Antes, os orgaos pertenciam ao Estado depois da morte. Hoje, o Estado ja deseja utilizar os orgaos mesmo com o cidadao vivo.

Nao se trata de defender criminosos. Trata-se de defender direitos.  

A conclusao que chego é que com o tempo, sera possivel pagar uma divida com a Receita Federal, oferecendo um rim. Sera possivel quitar um apartamento perante os bancos, oferecendo parte de um figado. Nao vai demorar muito e o Estado estara negociando com os devedores uma soluçao de interesse coletivo: Salvar vidas utilizando os seus orgaos, que na visao do Estado, ja nao sao tao seus assim.

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